Foto: Valter Campanato/Abr
O Ministério do Meio Ambiente (MMA) anunciou, dia 22 de julho, que o bioma Pampa, que ocupa a maior parte do território do Rio Grande do Sul, já perdeu 54% de sua vegetação nativa ao longo de sua ocupação histórica. Entre 2002 e 2008, 2.183 quilômetros quadrados de cobertura nativa foram derrubados. No total, o bioma Pampa já perdeu mais de 95 mil quilômetros quadrados da vegetação original. Uma das causas apontadas pelo MMA como responsáveis pela destruição da vegetação nativa são os reflorestamentos de espécies exóticas plantadas para a fabricação de papel. Para reverter esse quadro, o Ministério propôs, entre outras soluções, a criação de novas unidades de conservação no bioma, a adoção de boas práticas na agricultura e pecuária e a observação das orientações do zoneamento econômico-ecológico recentemente formulado pelo Conselho de Meio Ambiente do Rio Grande do Sul.
O levantamento, feito pelo Centro de Monitoramento Ambiental do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), apontou ainda os 19 municípios gaúchos que mais desmataram o bioma no período. Alegrete, no extremo oeste do estado, é o campeão de derrubada, com 176 km² de desmatamento entre 2002 e 2008. As cidades de Dom Pedrito e Encruzilhada do Sul aparecem em seguida, com 120 km² e 87 km² desmatados em seis anos.
O impacto dos desertos verdes
O anúncio do MMA confirma advertências feitas nos últimos anos sobre o impacto ambiental dos chamados desertos verdes na Metade Sul do estado. Há pelo menos dois anos o GT do Bioma Pampa do Ibama/RS já alertava para esta possibilidade tendo em vista a implementação de grandes áreas para a silvicultura no RS. Em 2008, técnicos do Instituto divulgaram um manifesto criticando a maneira como se processou o licenciamento das papeleiras na Fundação Estadual de Proteção Ambiental (Fepam).
Funcionários da Fundação foram ameaçados de demissão sumária caso não acelerassem esses processos. O final do manifesto dos técnicos do Ibama alertava:
Preocupa-nos ainda o fato de que, em que pesem todos os embates e medidas judiciais existentes, consolida-se no Estado do Rio Grande do Sul a política do “fato consumado” no que se refere à implantação de extensas áreas de silvicultura sem o devido planejamento e com riscos de danos ambientais aos Biomas gaúchos, particularmente ao Pampa. Está claro que, enquanto não houver decisão de mérito sobre as inúmeras ações ajuizadas, a possibilidade do dano ambiental discutido se consolida, a precaução inerente à proteção ao meio ambiente se esvai, e a conservação dos Biomas do Estado se torna uma incerteza no futuro.
Isto posto, conclui-se que o Zoneamento Ambiental para a Atividade da Silvicultura ora vigente no Rio Grande do Sul serve somente, ao que tudo indica, para legitimar, definitivamente, os procedimentos de licenciamento da atividade de silvicultura e produção de celulose no Estado sem o planejamento ambiental adequado à magnitude dos empreendimentos propostos e já em implantação.
Política ambiental suicida
Em abril de 2007, ocorreu uma intervenção pesada na área ambiental do estado, por parte do governo Yeda Crusius (PSDB), para favorecer as grandes empresas de celulose, atropelando as barreiras do zoneamento que tinha sido elaborado pelos técnicos da Fepam. O governo estadual decidiu retirar qualquer técnico ou administrador que pudesse ser um obstáculo à liberação total de empreendimentos nessa área. Essa tendência se aprofundou com a posse do secretário Carlos Otaviano Brenner de Morais, em 2007. Ele levou junto para a secretaria a ex-secretária adjunta de Segurança Pública, Ana Pellini, que denunciou, na época, a suposta existência de uma “ditadura ambiental” no estado. Aí começou a se agravar uma situação que já era grave no governo Rigotto, que deixou a Secretaria do Meio Ambiente para o PSDB.
As mudanças no Código Florestal brasileiro, recentemente aprovadas, caminham em direção semelhante à desta política ambiental que vem sendo aplicada no estado. A divulgação de estudos que apontam para a perigosa degradação ambiental no Rio Grande do Sul não vem sendo suficiente para convencer as autoridades de que essas escolhas políticas custarão um alto preço para as gerações futuras. A lógica do curto prazo e da defesa de interesses privados em detrimento do bem comum está destruindo ambientalmente o RS. Talvez sejam necessárias mais algumas dezenas de desastres e tragédias naturais para produzir esse convencimento.