Testemunhas e peritos depõem sobre morte de Eduardo Fösch
Foto: Igor Sperotto
O juiz Felipe Keunecke de Oliveira, titular da 2ª Vara do Júri de Porto Alegre, presidiu na tarde desta quinta-feira uma das últimas audiências de testemunhas no processo sobre a morte do estudante Eduardo Vinícius Fösch dos Santos, 17 anos. Os depoimentos de testemunhas devem se estender até setembro. No final de julho, uma testemunha-chave do caso será ouvida por precatória em Búzios, no Rio de Janeiro e, no dia 5 de setembro, serão confrontados em uma acareação os peritos do Instituto Médico Legal, Marcos Rovinski, contratado pela defesa e que atestou morte acidental, e Celso Danckwardt, autor da perícia particular que aponta a existência de ferimentos compatíveis com agressões praticadas por mais de uma pessoa contra a vítima.
Até agora, dois seguranças que trabalhavam no condomínio onde ocorreu o crime foram denunciados pela Promotoria e indiciados no processo: o supervisor de segurança do condomínio, policial civil Luís Fernando Souza de Souza, por obstrução à justiça; e o vigia Isaías de Miranda, por homicídio triplamente qualificado. Após a acareação e interrogatório dos dois médicos no início do próximo mês, o titular da 2ª Vara decidirá se o caso irá ou não a júri popular.
O adolescente morreu em maio de 2013, após permanecer por nove dias em coma em decorrência de ferimentos na cabeça, sofridos durante uma festa em um condomínio de casas na zona sul da capital gaúcha. Os interrogatórios buscam esclarecer se o jovem sofreu uma queda acidental ou foi espancado por seguranças do residencial.
A audiência teve a presença dos advogados Lesliey Gonsáles, assistente de acusação, e Marcelo Bertolucci e Rafael Politano, advogados de defesa dos dois seguranças do condomínio indiciados pela Justiça. Foram interrogados Matheus Negro Dornelles, um dos jovens que organizou a festa ao final da qual Eduardo foi encontrado agonizando e o perito criminal Marcelo Oliveira Ferreira, que assinou o laudo da necrópsia.
Matheus, que à época tinha 16 anos, é filho do ex-procurador Geral de Justiça Marcelo Dornelles. O jovem confirmou em seu depoimento que foi um dos organizadores da confraternização e encarregado de contratar seguranças particulares. Disse que ligou para o motorista do pai, oferecendo o “bico de segurança” e que este indicou Jeverson Medeiros, que aceitou e levou mais dois (Everson Chagas e Luciano Souza). Conforme os autos, os três seguranças que atuaram na festa trabalhavam como motoristas terceirizados no Ministério Público estadual.
Já o médico legista, autor do laudo da defesa que atesta a morte de Eduardo por hemorragia encefálica em decorrência de traumatismo craniano, defendeu-se das acusações de omissão feitas pelo perito Celso Danckwardt, contratado pela família. Ferreira qualificou como “inverdades” as alegações de que não teria feito a necrópsia e teria baseado o laudo da autópsia em informações da equipe médica. Eduardo permaneceu em coma no Hospital de Pronto Socorro e morreu em 6 de maio de 2013. A perícia foi feita no Hospital São Lucas, onde foram feitos os procedimentos para doação de órgãos para transplantes. O legista admitiu, no entanto, que “a necropsia se vale de dados do prontuário médico” e afirmou que não tinha condições de apontar se os ferimentos encontrados no cadáver são compatíveis com agressões.
INTIMIDAÇÃO – A acareação entre os peritos estava agendada para esta quinta-feira, 6 de julho, mas acabou adiada pelo juiz para a audiência de 5 de setembro porque um dos peritos não compareceu. Danckwardt, autor do laudo que atestou indícios de agressões e determinou a reabertura do caso, simplesmente deixou de ser intimado pela secretaria do Fórum Central, segundo a assistente de acusação, Lesliey Gonsáles. Durante a audiência, a advogada foi interpelada por uma integrante do Ministério Público em virtude da referência ao ex-procurador do MP, que é pai de uma testemunha, em postagem numa rede social na véspera da audiência. No comunicado, o escritório refere-se à “oitiva de testemunhas, entre elas o filho do ex-Procurador Geral de Justiça, Marcelo Dornelles”. Os dois episódios causaram mal-estar entre os presentes. Para a assistente de acusação, houve uma tentativa de intimidação e censura. O juiz Felipe Oliveira, que presidiu a audiência na 2ª Vara, reafirmou aos familiares de Eduardo a transparência do processo. “Ninguém mais do que eu quer esses fatos esclarecidos”, afirmou.
Foto: Reprodução
A FESTA – Eduardo, que completaria 22 anos de idade nesta sexta-feira, 7 de julho, participava de uma confraternização de estudantes de escolas privadas da zona Sul de Porto Alegre, na noite de sábado, 26 de abril de 2013, em uma das casas do luxuoso condomínio residencial Jardim do Sol. A festa foi organizada na casa de Leonardo Jacovas, filho do arquiteto e dono de haras José Antônio Jacovas, por Leonardo e por Matheus Dornelles, filho do então subprocurador do Ministério Público do Rio Grande do Sul, Marcelo Lemos Dornelles. Procurador-geral de Justiça no biênio 2015-2017, Dornelles assumiu em junho a subprocuradoria de Assuntos Institucionais do MP. De acordo com o processo, cerca de 150 adolescentes estavam presentes no evento e ao menos 20 deles foram ouvidos nos autos. Único convidado negro, Eduardo foi encontrado caído no pátio de uma das casas do condomínio por volta de 11h de domingo, 27 de abril daquele ano, dia seguinte à festa, gravemente ferido. Naquela manhã, funcionários do condomínio comunicaram à polícia a ocorrência de um “acidente”. Pela versão dos seguranças, o adolescente teria sofrido uma queda do alto de um muro. Eduardo permaneceu em coma por nove dias e morreu em 6 de maio de 2013. O caso foi investigado pelo Departamento Estadual da Criança e do Adolescente (Deca). Depois de duas tentativas de arquivamento pela polícia civil, que tratou o caso como acidente, o judiciário e o ministério público determinaram a reabertura das investigações a pedido da família da vítima.