SAÚDE

Pesquisadora brasileira será primeira latino-americana a presidir Sociedade Internacional de Aids

Beatriz Grinsztejn é médica infectologista e pesquisadora da Fiocruz, que dedicou sua carreira ao tratamento e pesquisa de HIV e AIDS
Por César Fraga / Publicado em 23 de julho de 2024
Pesquisadora brasileira será primeira latino-americana a presidir Sociedade Internacional de Aids

Foto: ACS/INI/Fiocruz

A infectologista Beatriz Grinsztejn (ao microfone), durante a pré-Conferência Internacional de Aids, em Munique, na Alemanha, no último domingo. Ao lado da ministra da Saúde da Alemanha, Ines Perea, e do professor Jérôme Salomon, da OMS, a pesquisadora enfatizou que as ISTs são uma parte significativa do seu trabalho diário

Foto: ACS/INI/Fiocruz

A infectologista e pesquisadora brasileira Beatriz Grinsztejn assumirá a presidência da Sociedade Internacional de Aids (International Aids Society – IAS ), orgão global de referência para o tema e que reúne profissionais que trabalham com a doença. Ela exercerá o cargo no biênio 2024-2026.

Beatriz está participando da 25ª Conferência Internacional sobre Aids (de 22 a 26 de julho), em Munique na Alemanha e é a primeira mulher latino-americana a exercer o cargo na entidade. Ela tomará posse na sexta-feira, 26, data de encerramento da Conferência.

Sua eleição ocorreu na edição anterior evento, em Montreal, no Canadá. A brasileira substituirá a infectologista australiana Sharon Lewin, diretora da Peter Doherty Institute for Infection and Immunity.

Ainda no domingo, 21, durante a pré-Conferência ela destacou a importância das infecções sexualmente transmissíveis (ISTs) tanto na 25ª Conferência, como em todos os eventos da IAS. Ao lado da ministra da Saúde da Alemanha, Ines Perea, e do professor Jérôme Salomon, da Organização Mundial da Saúde (OMS), a pesquisadora enfatizou que as ISTs são uma parte significativa do seu trabalho diário.

“Foi um dia repleto de apresentações e debates inspiradores. Vamos abordar o diagnóstico molecular da sífilis com testes de DNA, a revisão do tratamento da sífilis e as condições relacionadas ao HPV, incluindo a vacinação terapêutica”, relatou. A médica também antecipou os debates do evento, onde estão sendo tratados temas como epidemiologia e prevenção das ISTs .

“Teremos duas apresentações fundamentais sobre o DoxyPrEP, com foco em dados recentes da África. Estamos comprometidos em garantir a integração das ISTs na resposta ao HIV e na priorização dos serviços de saúde sexual e direitos reprodutivos. A IAS continuará colocando as pessoas em primeiro lugar, priorizando intervenções integradas para a prevenção e tratamento do HIV, infecções e comorbidades, e isso seguirá sendo uma parte central da nossa estratégia futura.”

Atualmente, mais de um milhão de infecções sexualmente transmissíveis são disseminadas diariamente em todo o mundo por meio de relações sexuais ou contato sexual, segundo a OMS. Essas infecções muitas vezes não apresentam sintomas e podem ser difíceis de detectar, mas, quando aparecem, manifestam sintomas específicos.

As ISTs são geralmente transmitidas durante a relação sexual, mas também podem ocorrer por outros tipos de contato sexual pele a pele. Algumas ISTs podem ser transmitidas de mãe para filho durante a gravidez, o parto ou a amamentação. Além disso, essas infecções podem ser transmitidas por transfusões de sangue ou pelo compartilhamento de agulhas.

Quem é Beatriz Grinsztejn

Pesquisadora brasileira será primeira latino-americana a presidir Sociedade Internacional de Aids

Foto: Acervo pessoal

Além do trabalho em pesquisa, Beatriz é diretora da primeira clínica de saúde trans estabelecida no Rio de Janeiro

Foto: Acervo pessoal

Beatriz Grinsztejn dedicou sua carreira ao tratamento e pesquisa de HIV e AIDS. Com colegas, ela fundou o Serviço de HIV/AIDS da Fiocruz, que é o maior provedor de cuidados no Rio de Janeiro, Brasil. Desde 1999, ela atua como Diretora da Unidade de Pesquisa Clínica em HIV/AIDS no Instituto Nacional de Infectologia Evandro Chagas – Fiocruz no Rio de Janeiro. Beatriz também é a pesquisadora principal (PI) de uma unidade de ensaios clínicos nos últimos 13 anos.

Ela é responsável direta por parcerias com as redes NIAID-NIH, HPTN, ACTG, HVTN, CoVPN e a rede do Caribe, América Central e do Sul para epidemiologia do HIV (CCASAnet), a ANRS, a Canadian HIV Clinical Trials Network, o Kirby Institute e o Cost-Effectiveness of Preventing AIDS Complications (CEPAC) Group, atuando em várias funções técnicas e de liderança.

Nas redes ACTG e HPTN NIAIDNIH, Beatriz foi membro do Comitê Executivo e de vários comitês científicos relacionados à pesquisa sobre ART, saúde da mulher e homens que fazem sexo com homens. Ela é a IP do Brasil para o CCASAnet, que criou um repositório compartilhado de dados sobre HIV de locais nessas regiões. Beatriz é membro dos Comitês Consultivos de ART e PrEP do Ministério da Saúde do Brasil, do Comitê Consultivo Técnico da OPAS e da Força-Tarefa de PrEP e do Painel de Especialistas do Unaids. Ela também atuou no Painel de Diretrizes de ART da OMS.

Beatriz contribuiu para o avanço da ciência na prevenção e tratamento do HIV e liderou ou participou de estudos de pesquisa globais seminais, como HPTN 052, iPrEX, START, Reflate TB, Opposites Attract Study, HPTN 077 e HPTN083. Ela é a copresidente do estudo HPTN 083 para avaliar o cabotegravir injetável para PrEP em homens HIV-negativos que fazem sexo com homens e mulheres trans. Ela é a PI do estudo de demonstração PrEP Brasil, que forneceu dados para apoiar a incorporação da PrEP no sistema de saúde pública brasileiro como uma política de saúde pública.

A médica é a Diretora da primeira clínica de saúde trans estabelecida no Rio de Janeiro, que fornece cuidados e serviços de prevenção de gênero afirmativo e a PI do estudo PrEParadas, o primeiro estudo de demonstração de PrEP baseado no Brasil dedicado a mulheres trans. Ela também é a co-PI do Brasil para imPrEP, um estudo de demonstração/implementação financiado pela Unitaid multinacional com o objetivo de expandir a PrEP no Brasil, Peru e México. Mais recentemente, ela integrou o esforço internacional para combater a pandemia da covid-19 e atualmente está liderando ou envolvida em vários estudos observacionais, de prevenção e tratamento da covid19.

A pesquisadora contribuiu para inúmeras publicações e tem mais de 300 publicações científicas revisadas por pares. Como professora do Programa de Pós-Graduação em Pesquisa Clínica em Doenças Infecciosas da Fiocruz e orientou mais de 25 alunos de mestrado e doutorado.

Brasil é referência internacional

Beatriz diz pretender levar à sociedade internacional as experiências positivas do Brasil no tratamento e prevenção do HIV. Segundo ela, o país é referência no tema e tem um programa “espetacular” que propicia acesso universal e gratuito aos cidadãos brasileiros, por meio do Sistema Único de Saúde (SUS).

Segundo ela, no Brasil existe acesso ao que há de melhor em termos não só de tratamento, mas também de prevenção, o que nos diferencia e muito, inclusive da maior parte dos países da América Latina, onde a profilaxia pré-exposição ainda não é acessível aos cidadãos através do sistema público de saúde.

A pesquisadora também defende aumento de recursos para pesquisa no país.“O Brasil continua brilhando no cenário internacional, mas precisamos que tenha mais visibilidade, que possa captar mais recursos para pesquisa e que possa demonstrar internacionalmente todo o poder do que é feito no nosso país. Por isso a importância da gente ter uma presidente da região assumindo a sociedade”.

Outro desafio citado pela cientista é a questão da credibilidade científica, abalada mundialmente nos últimos anos. “A nossa função como sociedade internacional é fomentar a pesquisa e fomentar que a ciência seja a base de todas as políticas públicas e que a comunidade, junto com os pesquisadores, possa levar essa discussão à frente sempre com base na evidência científica norteando as políticas públicas. Nesse sentido, o Brasil é um exemplo, ainda que tenhamos sofrido um impacto, nós continuamos a ser um exemplo na perspectiva de que o nosso Sistema Único de Saúde propicia o acesso a tecnologias que possam beneficiar a nossa população”.

A 25ª Conferência Internacional sobre Aids ocorre entre os dias 22 e 26 de julho e deve receber 15 mil participantes. Organizada pela Sociedade Internacional de Aids (IAS), o evento reune pessoas que vivem, são afetadas ou trabalham com HIV e aids para compartilhar conhecimentos e informações sobre a resposta à epidemia nos últimos 40 anos.

Representantes do Departamento de HIV, Aids, Tuberculose, Hepatites Virais e Infecções Sexualmente Transmissíveis do Ministério da Saúde estarão no evento para apresentar resultados das experiências brasileiras na resposta ao HIV.

Sobre a Conferência Internacional sobre AIDS 

A  International AIDS Conference  é a principal plataforma global para promover a resposta ao HIV. Como a maior conferência do mundo sobre HIV e AIDS, ela se situa exclusivamente na intersecção entre ciência, advocacia e direitos humanos, reunindo cientistas, formuladores de políticas, profissionais de saúde, pessoas vivendo com HIV, financiadores, mídia e comunidades. Desde seu início em 1985, a conferência tem servido como uma oportunidade para fortalecer políticas e programas que garantam uma resposta baseada em evidências ao HIV e epidemias relacionadas. A AIDS 2024,  a  25ª International AIDS Conference , ocorrerá em Munique, Alemanha, e virtualmente de 22 a 26 de julho de 2024. Mais de 10.000 participantes de todo o mundo comparecerão à AIDS 2024, e a grande maioria o fará pessoalmente.

Sobre a Sociedade Internacional de Aids

De acordo com seu site, a Sociedade Internacional de Aids reúne, educa e defende um mundo no qual o HIV não representa mais uma ameaça à saúde pública e ao bem-estar individual. Após o surgimento do HIV e da Aids, cientistas preocupados criaram a IAS para reunir especialistas de todo o mundo e disciplinas para promover uma resposta concertada ao HIV. Hoje, a IAS e seus membros unem cientistas, formuladores de políticas e ativistas para galvanizar a resposta científica, construir solidariedade global e aumentar a dignidade humana para todos aqueles que vivem com e são afetados pelo HIV. A IAS também sedia as conferências de HIV mais prestigiosas do mundo: a Conferência Internacional de Aids, a Conferência da IAS sobre Ciência do HIV e a Conferência de Pesquisa para Prevenção do HIV.

*Com informações da Sociedade Internacional de Aids, Fiocruz, EBC e Agência Aids

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