MOVIMENTO

Bispo determina reexibição de pintura em homenagem à irmã Dorothy Stang

Padre havia encoberto a pintura feita no altar da igreja Santa Luzia, de Anapu, em homenagem à missionária assassinada a tiros em 2005 por defender os direitos dos agricultores e dos sem-terra
Por Marcelo Menna Barreto / Publicado em 12 de fevereiro de 2025

Foto: Reprodução Redes Sociais

Pintura foi feita em 2009 no altar da igreja Santa Luzia, em Anapu

Foto: Reprodução Redes Sociais

Esta quarta-feira, 12, marca os 20 anos do assassinato da missionária católica Irmã Dorothy Stang, aos 73 anos, em Anapu, no Pará, em uma emboscada.

Uma polêmica, no entanto, estava envolvendo a religiosa. A pintura feita no altar da igreja Santa Luzia e que retrata Jesus crucificado em uma árvore, vestindo roupas simples, ao lado da missionária e de Josimo Tavares, padre assassinado em maio de 1986, estava encoberta.

Movimentos sociais consideraram o ato como uma tentativa de apagar a memória da irmã e do padre que foram assassinados por lutarem por justiça no campo e pela reforma agrária.

Responsável pela igreja onde a obra está exposta, o padre Josemar Lourenço, ex-investigador de polícia do Pará, declarou que cobriu a pintura para atender pedido de parte dos fiéis que se sentia incomodada.

Ao tomar conhecimento do fato, o bispo da Diocese do Xingu, Dom Frei João Muniz Alves, ordenou a retirada do pano que cobria a pintura e determinou a reexibição permanente da homenagem.

No último domingo, 9, durante a missa de abertura do ano jubilar da Diocese de Altamira, Dom João destacou a importância da missionária.

“Ela se tornou um símbolo desta região. Sua morte não é apenas um fato isolado, mas parte de uma realidade maior”, afirmou.

A missionária Dorothy Stang nasceu nos Estados Unidos e chegou no Brasil em 1966. Na década de 1970 passou a atuar na região amazônica.

Se estabelecendo em Anapu, se tornou uma referência na luta pelo direito à terra e pela preservação do meio ambiente, o que passou a incomodar fazendeiros e grileiros da região. Seu trabalho incluiu a criação de escolas, organização de comunidades e denúncias de crimes ambientais.

Foto: Reprodução Redes Sociais

Religiosas da mesma congregação de Dorothy ao lado de Dom João e do padre Josemar (à dir.) quando o altar com a homenagem foi descoberto

Foto: Reprodução Redes Sociais

Legado de Dorothy Stang e desafios atuais

Anapu é uma das cidades mais violentas da Amazônia Legal, ocupando a 13ª posição em número de mortes violentas intencionais, segundo o Fórum Brasileiro de Segurança Pública.

Desde a morte da irmã Dorothy, ao menos 21 pessoas foram assassinadas por disputas de terra, conforme levantamento da Comissão Pastoral da Terra (CPT). Seus nomes estão gravados em uma cruz vermelha na sepultura da religiosa.

Em 2023, o Pará liderava o ranking de ocorrências de conflitos no campo e foi considerado o estado mais violento da Amazônia, com 226 casos, segundo dados da Comissão Pastoral da Terra (CPT).

Apesar de seu legado, os projetos de desenvolvimento sustentável que a irmã Dorothy defendia enfrentam ameaças crescentes. Dados apontam que a ocupação agropecuária nessas áreas subiu de 4,38% para 22,27% entre 2005 e 2023.

Duas décadas depois do crime, apenas Rayfran das Neves Sales, um dos cinco condenados pelo assassinato da religiosa, segue preso em regime fechado, de acordo com a Secretaria de Administração Penitenciária do Pará (Seap). Sales efetuou os seis disparos à queima-roupa. Segundo o Ministério Público, a morte da missionária foi encomendada pelos fazendeiros Vitalmiro Bastos e Regivaldo Galvão.

Homenagens

A memória da missionária é celebrada anualmente com vigílias e romarias. Nos Estados Unidos, recebeu homenagens oficiais, e o estado do Colorado instituiu o dia de sua morte como uma data de lembrança.

No Vaticano, uma vigília destacou seu compromisso com os mais vulneráveis e a teóloga Laurie Johnston reforçou: “nela, a missão cristã ia além da espiritualidade pessoal, incluindo o compromisso com os esquecidos, com as vítimas da degradação ambiental e das desigualdades sociais”.

Nesta quarta-feira, 12, as 9 horas foi realizada uma cerimônia junto ao seu túmulo. Quem conduziu o ato foi o bispo emérito de Altamira, Dom Erwin Krautler. Na época do assassinato, ele afirmou: “Ninguém tem maior amor do que aquele que dá a vida por seus amigos”.

Em Belém, ato inter-religioso organizado pelo Comitê Dorothy em memória à missionária relembra as principais causas defendidas pela irmã. O ato está ocorrendo na Praça do Can, no bairro de Nazaré, desde às 9h e reúne movimentos sociais, entidades de direitos humanos, universidades públicas e religiosos.

Comentários