MEC busca adesões ao novo vestibular
No Rio Grande do Sul, das cinco instituições federais de Ensino Superior existentes, a Universidade Federal de Pelotas (UFPel) foi a única que manifestou sua adesão ao novo processo seletivo (no dia 15 de abril). De acordo com o reitor Antônio César Gonçalves Borges, o Conselho Coordenador de Ensino, Pesquisa e Extensão da UFPel aprovou na íntegra a proposta do MEC. Embora não haja um prazo para que as universidades definam suas escolhas, reitores, docentes, estudantes e comunidade em geral têm se ocupado com o tema.
Em entrevista coletiva, no dia 14 de abril, o reitor da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (Ufrgs), Carlos Alexandre Netto, disse que não há como a Universidade utilizar o novo Enem como a única forma de seleção, e sim como parte do processo seletivo. Qualquer mudança, entretanto, segundo o reitor, não ocorrerá no vestibular de 2010, até porque essa é uma proposta que deve ser submetida aos conselhos superiores da Ufrgs(de Ensino, Pesquisa e Extensão e o Universitário), “que são as instâncias que legislam sobre os grandes temas da Universidade”, argumenta.
Entretanto, as respostas da Ifes (Instituições Federais de Ensino Superior), certamente vão ganhar novos elementos para tomarem suas decisões nos próximos meses, prova disso é que, em menos de duas semanas depois de anunciar o novo formato, o MEC já alterou a primeira proposta encaminhada à Andifes. Das duas modalidades iniciais de adesão, e a partir das quais UFPel e Ufrgs se manifestaram, no último dia 17 de abril a Andifes e o MEC em reunião definiram quatro formas de adesão das instituições ao novo Enem.
Conforme o portal do Ministério de Educação, as quatro possibilidades são as seguintes: o Enem como fase única; como fase primeira; como fase única para as vagas ociosas, após o vestibular; ou combinado ao atual vestibular da instituição. Neste último caso, a Universidade definirá o percentual da nota da prova do vestibular. Na avaliação do ministro da Educação, Fernando Haddad, qualquer forma de adesão impactará positivamente na reformulação do Ensino Médio, despertando assim a capacidade de raciocínio crítico e analítico dos jovens.
De dentro da escola
Na avaliação do diretor do Colégio Estadual Infante Dom Henrique, João Figueiró, uma das maiores escolas de Ensino Médio da capital gaúcha, são 2,2 mil alunos, dos quais 360 estão no terceiro ano, nos turnos da manhã, tarde e noite, a proposta será válida se realmente ampliar as chances e possibilidades de ingresso do estudante do Ensino Médio na Universidade. O diretor e professor de História também espera que o novo exame ajude a promover alterações no programa de Ensino Médio: “O sistema de Educação brasileiro precisa de mudanças”, observa.
Quanto à questão da unificação das provas, ele adverte que este é sempre um aspecto que representa riscos em função das diferenças regionais. Neste sentido, Figueiró também avalia que pode haver distorções uma vez que estudantes de localidades menores estarão competindo com alunos egressos de escolas de Ensino Médio de centros maiores, e que, em tese, são melhor preparados. Por outro lado, o diretor considera que as provas do Enem favorecem mais o raciocínio do estudante e estão mais relacionadas ao cotidiano dos jovens.
Ludimila Fagundes, presidente do Grêmio Estudantil do Infante do Henrique, conversou pela primeira vez com os colegas sobre o novo vestibular, na sexta-feira, véspera do feriado de Tiradentes. Na opinião dos estudantes, independente da questão da qualidade das provas do Enem, o que eles ressaltam é que o atual Ensino Médio brasileiro não prepara para exames deste tipo: “Somos preparados para o vestibular do tipo da Ufrgs”, justifica. Segundo a estudante, o Grêmio terá que promover encontros para buscar informações sobre o concurso: “Vamos ter que chamar alguém para explicar essa proposta de novo vestibular”, comenta.
Ampliar o acesso?
Um dos objetivos da proposta do governo é ampliar o acesso ao Ensino Superior, expectativa compartilhada com diferentes segmentos tanto dentro como fora da escola. Mas a proposta como um todo – que compreende um exame unificado e a mobilidade, uma vez que o estudante pode se inscrever em até cinco cursos de universidades diferentes – , provoca dúvida quanto a sua eficácia. Doutor em Educação, Antônio Lisboa Leitão de Souza é professor do curso de pós-graduação em Educação da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN), primeiro vice-presidente e um dos coordenadores do GT de Políticas de Educação do Sindicato Nacional dos Docentes das Instituições de Ensino Superior (Andes-SN). Segundo o professor, a proposta do MEC não cumprirá com seu objetivo de ampliar o acesso ao Ensino Superior através dos itens formulados. Na opinião do educador, isso só vai ocorrer com a criação de novas vagas e uma universalização do ensino no Brasil, nos diferentes níveis. Direto de Brasília, em meio a uma das reuniões do Andes, ele falou à reportagem do Extra Classe sobre o novo vestibular:
Extra Classe – Professor, qual a sua avaliação da proposta de vestibular unificado?
Antônio de Souza – Qualquer tentativa de melhoria do acesso à Universidade deve ser vista com bons olhos. No entanto, a proposta que foi apresentada não assegura necessariamente a melhoria ou a ampliação desse acesso. Temos no Brasil uma diversidade regional e institucional muito grande no processo de formação da Educação Básica, e também no que diz respeito às universidades. E neste novo Enem como está sendo proposto serão os mesmos que continuarão com as melhores chances de obter os melhores resultados. Ele não vai, absolutamente, facilitar o acesso ao aluno de escola pública que já tem dificuldade. Nós não temos um sistema nacional de Educação unificado que seja articulado entre os diferentes níveis de ensino.
EC – Mas a possibilidade dada ao aluno de escolher diferentes cursos e diferentes instituições não amplia suas possibilidades?
AS – Se o aluno do Rio Grande do Sul tem a opção de escolher cinco universidades e cinco cursos diferentes, ele pode também escolher, além da Universidade que está mais próxima de sua residência, outra em Santa Catarina, outra na região dos pampas, outra no estado do Paraná. Ele está concorrendo com os alunos desses outros estados no mesmo pé de igualdade, o que resulta em uma certa diluição na concorrência local para o âmbito nacional, o que faz elevar a concorrência quantitativa para as vagas das universidades. Ou seja, vai haver um aumento do número de concorrentes. Do ponto de vista qualitativo, é muito provável que um vestibular unificado privilegie os alunos que já vêm de escolas melhor destacadas na realidade educacional que temos hoje.
EC – E o que pode mudar a situação do acesso ao Ensino Superior?
AS – O que vai possibilitar uma ampliação do acesso à universidade pública no Brasil é a ampliação das vagas, e isso requer uma ampliação do nível de investimento na Educação Superior. Somente quando tivermos um sistema nacional que seja articulado entre Educação Básica e Superior, e dentro da Educação Básica haja articulação entre Ensino Fundamental e Médio. Um sistema onde os conteúdos sejam pensados na perspectiva de preparar o aluno para uma etapa subsequente, onde o ensino médio seja visto como uma continuidade para o Ensino Superior, e o processo de cooperação entre as diferentes esferas administrativas seja claramente definido. Assim é que vamos poder ter condições de acesso e permanência mais asseguradas para os diferentes níveis de Educação.
EC – O Programa de Apoio a Planos de Reestruturação e Expansão das Universidades Federais (Reuni) não veio para cumprir também esta tarefa?
AS – É verdade que o governo tem forçado um pouco a ampliação das vagas através do Reuni, mas elas não garantem, absolutamente, embora possibilitem um pouco mais o número de vagas ofertadas em cada universidade, a democratização ou a ampliação do acesso. A demanda é muito maior. O problema é que temos uma escola pública que forma mal que não garante o acesso de todos. Temos uma sociedade cuja população pobre, onde temos todas as raças, não tem acesso ao Ensino Médio, e muitos daqueles que têm acesso não conseguem concluí-lo. E quando o concluem, não o fazem em condições de disputar uma vaga nas universidades.
EC – E quanto às políticas afirmativas?
AS – As políticas de cotas ou políticas afirmativas para uma realidade que é desigual como a nossa, são medidas paliativas. Talvez a curto prazo tenhamos alguma pequena mudança no perfil do aluno que está tendo acesso à universidade, mas a longo prazo não trará mudanças se o centro do problema não for atacado: que é a ampliação do financiamento, a universalização da Educação Básica e a ampliação tanto de vagas quanto de financiamento para a universidade pública.
A Proposta
AS PROVAS: Serão quatro provas: Linguagens, Códigos e suas Tecnologias (incluindo redação); Ciências Humanas e suas Tecnologias; Ciências da Natureza e suas Tecnologias,e Matemática e suas Tecnologias.
INSCRIÇÃO DO CANDIDATO: O candidato optará por concorrer utilizando-se de política afirmativa eventualmente existente ou pela ampla concorrência, podendo escolher até cinco opções de cursos e instituições de sua preferência, independentemente do local de sua residência. Não é necessário haver vinculação entre as opções, de modo que o candidato poderá escolher cursos diferentes em instituições distintas.
ADESÃO: As instituições poderão mudar a forma de adesão ao novo Enem de um ano para o outro ou usar o modelo de maneira variada por curso. Por exemplo, a mesma universidade poderá usar o Enem como fase única para a oferta de vagas de ingresso à maioria dos cursos e como primeira fase para cursos que exijam provas de aptidão.