OPINIÃO

À espera de um milagre

Argumentações maldosas de realidades educacionais distintas, e pelos profissionais da Veja desconhecidas, foram produzidas e tecidas
Dinah Quesada Beck* / Publicado em 23 de setembro de 2008

Reportagem Veja educação

Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil

Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil

Ao deparar-me com a reportagem da revista Veja, publicada em 20 de agosto, a qual abordava as condições nas quais se encontra a educação em todo o Brasil, inúmeros foram os questionamentos que fiz diante de tamanhas aberrações ali institucionalizadas.

Li, reli e retornei a determinadas partes do texto que causaram maior impacto devido ao seu conteúdo falseado, duvidoso e pouco produtivo. De um modo geral, posso afirmar que através de frases equivocadas e vergonhosas generalizações sobre a educação brasileira, sem o menor respeito à sua história e constituição, foram apresentados dados de pesquisa estrategicamente posicionados, analisados e confrontados.

Argumentações maldosas de realidades educacionais distintas, e pelos profissionais da Veja desconhecidas, foram produzidas e tecidas, entre discursos e mais discursos que se compõem nessa trama de fios. Infelizmente essas severas palavras justapostas, por algum tempo, ficarão presentes na mente das pessoas que leram a matéria. Muitos são os pensamentos.

Após algumas anotações, fiz questão de torná-las conhecidas a todos. E, em meio a meus argumentos, mal podia acreditar que aquele material seria lido por milhares de pessoas.

Leitores que, por desconhecimento ou crença que neste veículo de comunicação se encontrariam muitas verdades, estariam a pensar nas condições nas quais se dá a formação docente no Brasil, no modo como os professores preparam e ministram suas aulas e “o ponto que chegou” a educação brasileira.

Talvez, o que tenha causado maior incômodo e deixado um profundo desgosto e repúdio durante a leitura foi o fato de perceber que estes profissionais sentem-se preparados para fazer pesquisa educacional e articular os dados obtidos nessas pesquisas.

Como professora e estudiosa no campo da Educação, sei que essa tarefa não é fácil. Esse trabalho, definitivamente, não se dá pautado na espera por milagres.

Dar força e veracidade teórica às pesquisas desenvolvidas exige preparo e constante aproximação com os aportes teóricos e a realidade estudada, além do anterior delineamento dos modos através do quais os dados são coletados, para adiante poder selecioná-los e analisá-los, com profundo respeito aos sujeitos participantes da pesquisa, buscando apresentar, por fim, respostas múltiplas, provisórias e com argumentações sólidas e convincentes.

Incomoda-me o fato da Veja fazer esse trabalho, e fazê-lo de modo apurado e equivocado, usando um espaço que não é seu. Desejo, por fim, que as mesmas inquietações em mim produzidas possam também mover outras tantas pessoas que leram a matéria e que essas sejam porta-vozes e transmitam que dados sobre a educação no país não se buscam em lugares-comuns como a Veja.

Não esperem por milagres. Busquem concretizar suas propostas.

 

*Professora do Ensino Fundamental, Mestre em Educação – UFPel e Doutoranda em Educação/PPGE/Faced/Ufrgs

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