A analogia é oportuna e pertinente – por causa dos impertinentes que trafegam descontrolados nos ouvidos alheios.
Começa que não são poucos os embriagados de si mesmos a nos dirigir a palavra: os egocêntricos, os cabotinos, os vaidosos, os narcisistas, os que se adoram ouvir, os autoritários, os intrometidos, chatos etc. Todos devidamente habilitados a provocar acidentes nas conversas, pelo alto teor de eulemia em seu sangue.
Essa gente sem freio na língua pode causar danos variados nos ouvintes, seja aos gritos ou sussurros. Dada a natureza do falante – conversador fiado, narrador de proezas, teorizador contumaz, discursador ideológico, colecionador de balelas, impigidor de conceitos etc – os riscos para os tímpanos podem ser agrupados, conforme as alterações na percepção do palrador, em diversas categorias de infrações coloquiais. Assim:
Excesso de velocidade: o interlocutor, ao volante da sua personalidade movida a auto-elogio, dispara monólogo afora, desrespeitando as regras do diálogo civilizado. Em geral atropela a paciência dos atentos.
Ultrapassagem perigosa: como um papagaio à vontade num bólido, avança por assuntos inconvenientes, como a intimidade de quem o ouve.
Derrapagem: aqui os ferimentos auditivos acontecem em decorrência de manobras incompetentes com a língua portuguesa, com desastres recorrentes em concordância, pronúncia e regência.
Passar no sinal vermelho: apesar do ambiente inadequado (num velório, num asilo, numa creche), o loquaz usa vocabulário escandaloso e se manifesta em altos brados.
Circular na contramão: colisão frontal entre a idéia exposta por alguém e seus senões teimosos e sem sentido, provocando uma terrível destruição dos mais delicados e sensatos argumentos.
Estacionar em área proibida: obsessão por tema único, com verbalização monótona e monocromática.
Não sinalizar entrada à esquerda ou direita: no meio de um debate político, intervém sem pedir licença e questiona sem embasamento, além de emitir opinião disparatada, prejudicando a continuidade do evento.
Buzinar a toda hora, em qualquer lugar: sempre que o nível do papo se eleva no conteúdo, ele ergue o que pode – a voz. Esganiçado como é, cala a audiência por decibéis.
Um palavrômetro faria um bem danado no trânsito das idéias. Apanhado em flagrante, o mau condutor de assuntos poderia ser multado do jeito que mais sofre. Permanecer em silêncio enquanto durar o papo.