O caminho econômico perseguido pelo Brasil nas duas últimas décadas divergiu consideravelmente do quarto de século imediatamente anterior. No período que separou o ano de 1955 do de 1980 registrou-se, por exemplo, a prevalência de uma forte transformação nas bases materiais da economia nacional.
A internalização do padrão universal de produção assentado nos bens duráveis de consumo, como, por exemplo, automóvel e eletrodomésticos, permitiu a modernização – ainda que incompleta – da sociedade, com a generalização de uma ampla classe trabalhadora urbana e avançado estrato social intermediário nas ocupações assalariadas no setor público e nas grandes empresas privadas estrangeiras e nacionais. A polarização da Guerra Fria e a estabilidade tecnológica associada ao regime de acumulação fordista permitiram ao país localizar-se entre os mais industrializados do mundo.
A pobreza absoluta e o analfabetismo que atingiam cerca de oito a cada dez brasileiros regrediram a mais da metade da população, índices ainda vergonhosos, mas, diante da estrutura perversa anterior, significou um avanço. Infelizmente a riqueza gerada no período não foi redistribuída e uma parte significativa do povo permaneceu excluída, uma vez que as chamadas reformas civilizatórias do capitalismo contemporâneo deixaram de ser aqui realizadas.
Não somente a estrutura fundiária permaneceu praticamente inalterada frente à baixa efetividade da reforma agrária, como o regime tributário e o padrão de políticas sociais mantiveram-se continuamente regressivos. Assim, os pobres continuaram – e continuam até hoje – a pagar mais impostos que os ricos, enquanto os obstáculos à universalização do acesso aos serviços sociais seguiram ativos para a parcela mais vulnerável da população.
A partir de 1980, superamos felizmente os anos de chumbo da ditadura militar. A força de transformação das bases materiais da economia nacional, contudo, terminou sendo constrangida pela formação de uma convergência política sem maiores compromissos com o desenvolvimento do conjunto da nação. Por um lado, as sucessivas crises no padrão fordista de produção, em meio às transformações mais profundas no sistema monetário-financeiro mundial, deram lugar ao acirramento na competição intercapitalista, cada vez mais dominada por grandes corporações internacionais que operam por meio das empresas em rede e por intensos investimentos tecnológicos. Tanto assim que se espera para – talvez não mais do que duas décadas – a existência de cerca de 500 grandes empreendimentos corporativos dominando o conjunto das atividades econômicas em todo o mundo.
Por outro, e em seqüência, o Brasil se viu enredado em complexos problemas econômicos internos, como o endividamento externo, os desarranjos nas finanças públicas, a presença de uma longa fase de superinflação, entre outros. As conseqüências não tardaram a se manifestar diante do abandono do ciclo de alto dinamismo econômico e do aprisionamento da agenda pública à lógica do curto prazo. Sem a ruptura do compromisso político com o desenvolvimento nacional, o Brasil seria, em 2006, a terceira economia do mundo, com o PIB estimado em 3,5 trilhões de dólares à taxa de câmbio do mercado (a China em quarto, com US$ 2,7 trilhões) e renda per capita próxima de US$ 20 mil. Em conseqüência, os pesos da tributação e da previdência social poderiam estar num patamar bem inferior ao que se encontram atualmente, uma vez que, com uma carga tributária de somente 22% do PIB (em vez dos atuais mais de 35%), permitiria que a totalidade da receita pública fosse 60% superior à atual.
O imperioso compromisso com o desenvolvimento nacional requer o planejamento de médio e longo prazos. Para isso, a nação precisa democraticamente se colocar de acordo com a convergência política capaz de permitir a construção das estratégias do amanhã, cujo caminho a ser perseguido deve incluir justamente todos os brasileiros e ser compatível com a sustentabilidade ambiental e o avanço tecnológico da nação.