EDUCAÇÃO

Sustentabilidade para além da fachada

Resolução do CNE que define diretrizes nacionais para educação ambiental será cobrada pelo MEC e estabelecimentos de ensino devem se adaptar às exigências
Por Sílvia Franz Marcuzzo / Publicado em 24 de maio de 2013
Foto: Rodrigo Cambará Printes/divulgação

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Atividade da Uergs em área na Serra Gaúcha que abrigará futuro condomínio ecológico

Foto: Rodrigo Cambará Printes/divulgação

Em junho próximo, fará um ano que entrou em vigor a Resolução Nº 2/2012 do Conselho Nacional de Educação (CNE/Conselho Pleno), que estabelece as Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Ambiental (EA). Apesar de existirem leis, políticas e programas sobre esse tema – a própria Lei nº 6.938/1981, que dispõe sobre a Política Nacional do Meio Ambiente, já estabelecia que a EA devesse ser ministrada em todos os níveis de ensino – é a primeira vez que o CNE/CP dispõe de uma normativa para tratar diretamente da educação ambiental formal. O texto aborda a necessidade de se reconhecer o papel transformador e emancipatório da EA diante do contexto das mudanças climáticas e dos riscos locais e globais que ela abarca.

Fruto da pressão de setores da sociedade civil e de redes, como a Rede Brasileira de Educação Ambiental (Rebea) e a Rede Universitária de Programas de Educação Ambiental para Sociedades Sustentáveis (Rupea), a deliberação foi aprovada em meio aos anúncios do governo federal durante a Rio+20. Utiliza conceitos embasados na “ambientalização” das esferas sociais, isto é, um processo de internalização nas práticas sociais e nas orientações individuais de valores éticos, estéticos e morais em torno do cuidado com o ambiente.

O documento prevê que a EA seja trabalhada da educação infantil até a pós-graduação de forma integrada e interdisciplinar, contínua e permanente em todas as fases, etapas, níveis e modalidades de ensino. Debates acerca da ética ambiental deverão ser fomentados em cursos de formação inicial e de especialização técnica e profissional. Aponta, ainda, que essas diretrizes sejam cobradas pelo MEC e demais órgãos correspondentes nas avaliações para fins de credenciamento e recredenciamento, de autorizações e de reconhecimento de instituições de ensino e de cursos.

CONTROLE – Para o educador ambiental e mestre em Educação Jorge Amaro, a melhor forma de acompanhar e fiscalizar o seu cumprimento é através do controle social, das redes de EA e de toda sua malha – entidades, conselhos, órgãos de governos, universidades. Mas, se para as instituições mantidas pelo governo a EA é um compromisso público, nas privadas, ela agrega um “valor moral” ao negócio e amplia a vantagem competitiva. “O adjetivo ambiental tem sido objeto de disputa, é um valor contemporâneo e moralmente aceito pela sociedade”, comenta Amaro. Porém, é preciso ter cuidado para que as atividades de EA não sejam apenas superficiais ou “de fachada”. O ensino de ecologia e a realização de projetos abordando apenas as ciências naturais não são ações de EA, alerta o diretor da Unidade de São Francisco de Paula da Universidade Estadual do Rio Grande do Sul (Uergs) Marcelo Maisonette Duarte. O professor de Ecologia e Recursos Naturais e coordenador da primeira pós-graduação da Uergs, a especialização Educação para a Sustentabilidade, lembra que os conteúdos precisam provocar o debate sobre distintos aspectos, como inclusão social, economia, ética, espiritualidade, enfim, o que interfere na qualidade de vida de todos. E provoca: “que sociedade é essa que tira alunos da sala de aula para recolher lixo que a própria sociedade joga no rio?” Para ele, muitas atitudes têm boa intenção, mas não trabalham no que preconiza a EA, “acabam presas ao mesmo modelo econômico que está acabando com o ambiente natural e as estruturas sociais”.

A primeira turma do pós, selecionada recentemente, terá disciplinas que fomentarão reflexões sobre temas complexos. Segundo Duarte, a intenção é formar “educadores que possam trabalhar em gestão ambiental e gestores que tenham uma formação em educação”. Entre os conteúdos da pós interdisciplinar, estão o estudo do desenvolvimento regional, a promoção de diálogos entre o local e o regional e o resgate cultural. Ele espera que a especialização prepare indivíduos capazes de propagar formas de mudar o modelo atual de crescimento econômico. Como exemplo, ele cita a discussão do conceito de unidade de bacia hidrográfica e os limites políticos dos municípios, um assunto que geralmente não é tratado em livros.

SUJEITO – Na publicação Educação ambiental: a formação do sujeito ecológico (Editora Cortez), a autora Isabel Carvalho defende o projeto político-pedagógico de uma EA crítica, que proporcione “a formação de um sujeito capaz de ‘ler’ seu ambiente e interpretar as relações, os conflitos e os problemas aí presentes”. A coordenadora do pós-graduação em Educação da PUCRS argumenta nessa obra que o educador ambiental precisa ser um provocador de novas compreensões das relações entre o repúdio e o enaltecimento da natureza, “ampliando percepções já estabelecidas no senso comum e questionando preconceitos,como visões ingênuas e pouco ponderadas com as quais muitas vezes nos deparamos”.

Isabel integrou o Grupo de Trabalho que discutiu o conceito de desenvolvimento sustentável em preparatórias para o Fórum Global na histórica Rio92.

Em entrevista ao Extra Classe, a pesquisadora disse que as instituições de ensino devem estar cientes de que “tudo educa o tempo todo”. Ela recomenda a transformação das instituições de ensino em “espaços educadores sustentáveis”.

Para compreender melhor a proposta, ela aconselha a leitura do artigo da Revista do Mestrado em Educação Ambiental (Remea) da Furg, de Rachel Trajberg e Michele Sato.

Esses espaços têm a intencionalidade pedagógica de serem referências concretas de sustentabilidade socioambiental. Isso signi ca que eles devem estar em sintonia com o currículo, com as premissas da sustentabilidade socioambiental e ainda gerar uma nova cultura com a participação da comunidade escolar.

MINISTÉRIO – O MEC reconhece suas de ciências em não oferecer aos sistemas de ensino e aos professores um repertório mais amplo para o exercício da transversalidade, principalmente nas universidades. O ministério diz que já considera a EA um dos eixos estruturantes da formação continuada e informa que está em elaboração a produção de materiais de orientação aos docentes. Está em articulação com os sistemas estaduais de ensino a de nição de estratégias para consolidação do ensino de conteúdos transversais de EA.

A tendência é a integração de saberes

Foto: divulgação

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Professora Isabel Carvalho

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Uma das inovações que mostra a vivência prática da interdisciplinaridade é o SobreNaturezas, um grupo formado por professores e alunos vinculados aos Programas de Pós-Graduação em Educação da PUCRS e em Antropologia Social da Ufrgs. Agrega pesquisadores de diferentes áreas, ultrapassando as barreiras de departamentos e segmentos universitários, com o apoio do Conselho Nacional de Desenvolvimento Cientí co e Tecnológico (CNPq), da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes) e do Projeto Cátedras de Desenvolvimento do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea)/Capes. Investiga processos de ambientalização social com ênfase na educação e na religião. Busca compreender como o ideário ambiental tem sido internalizado em práticas sociais e educativas e seu papel moral na sociedade. A professora Isabel Carvalho, uma das coordenadoras do grupo, acredita que deverão aumentar pesquisas envolvendo áreas distintas, pois “a interdisciplinariedade está em alta” para a Capes e o CNPq.

Outro projeto nesse sentido é a plataforma sobre sustentabilidade socioambiental em universidades (http://www.projetosustentabilidade.sc.usp.br/), uma cooperação entre a Universidade Autônoma de Madri e a USP, com apoio da PUCRS. O site também disponibiliza para download a obra Visões e Experiências Ibero-americanas de Sustentabilidade nas Universidades, que traz experiências sobre inovações no currículo, na pesquisa e na gestão do ensino superior.

Educação Ambiental na web – A seguir alguns websites sugeridos pela professora Isabel Carvalho, da PUCRS (uma ampla lista de endereços, literatura e sugestões de atividades está no livro Educação Ambiental: a formação do sujeito ecológico, cuja 6ª edição é de agosto de 2012):

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