Foto: Igor Sperotto
No coração de uma das regiões que mais produz tabaco no Brasil, Santa Cruz do Sul (quarto produtor nacional), uma experiência educacional de ensino médio vai na contramão da lógica do uso de agrotóxicos e insumos sintéticos ao formar jovens técnicos agrícolas voltados para a produção de alimentos agroecológicos. Instituição privada, laica e de caráter comunitário, a Escola Família Agrícola (Efasc), diante da grande evasão de jovens do meio rural, alia valorização da profissão de agricultor a conceitos de cidadania, conhecimentos científicos e tecnológicos para a produção de alimentos saudáveis. O conflito de gerações e de métodos de produção entre os estudantes, suas famílias e a comunidade é tanto inevitável quanto esperado. Desse atrito, mas também da troca de experiências e necessidades, surgem os projetos dos alunos, voltados para diversificação. Como resultado, eles produzem alimentos saudáveis e geram renda para as famílias como alternativa ao plantio do fumo.
“Mudou muita coisa no jeito que a gente vive. Antes da nossa filha ir estudar na escola agrícola, nem horta a gente tinha. Achávamos que não valia a pena porque nosso consumo era pouco. Então, acabávamos comprando dos mercados, mesmo sabendo que eram cheios de veneno. Hoje não. Nós temos nossos próprios alimentos, que vêm da nossa horta. Não estamos plantando tanto fumo e a tendência é diminuir ainda mais”, sintetiza o agricultor Nairo Franken, 42 anos. A redução foi de 5% ao ano, o que dá 20 mil pés a menos do que no ano de implantação da horta, sem perder dinheiro, porque a venda de hortaliças preencheu a receita. “E com uma grande diferença: os produtos são saudáveis”, destaca Nairo.
“A proporção de terra que ocupa e a renda que gera fazem a hortaliça ser uma alternativa muito satisfatória. Hoje em dia, a horta dá dinheiro sempre. Não é que nem o fumo que dá só uma vez por ano”, explica a agricultora Leoni Preissig Franken, 34 anos, esposa de Nairo. Segundo ela, foi nítida a diferença entre a escola fundamental pública que a filha cursou anteriormente e a da Efasc. “Ela passou a questionar tudo ou perguntar como funcionava na propriedade, passando a se interessar mais pelas coisas que aconteciam aqui”, explica.
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A filha única do casal, Cheila Luiza Preissig Bruennig, de 17 anos, está se formando no terceiro ano do ensino médio. Ela organizou seu Projeto Profissional Jovem (PPJ), similar a um trabalho conclusão de curso, a partir de uma demanda que identificou na propriedade da família, em Linha Monte Alverne, distrito de Santa Cruz do Sul. A localidade tem aproximadamente 1.800 habitantes. “Por meio do estudo que eu fiz, descobri que havia uma demanda para mudas de hortaliças (beterraba, alface, repolho, pimentão etc.) dentro da própria comunidade, que era obrigada a comprá-las fora ou em lojas de agropecuária. A partir daí, passei a produzir mudas para nossa propriedade e para a vizinhança. Toda a minha produção é orgânica, sem uso de adubo sintético nem agrotóxicos, desde a muda até as hortaliças”, garante.
Influência na vizinhança
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A estudante consegue tirar uma renda que possibilita reinvestir no cultivo, além de guardar para a construção de um galinheiro para diversificar ainda mais a produção na propriedade. Conforme Cheila, a família aceitou bem, mas no começo houve resistência. “Era difícil para eles entenderem que eu teria uma produção sem uso de agrotóxico ou adubo sintético, pois já diversificávamos, mas ainda com veneno e adubo sintético. Quando eu cheguei com essa nova alternativa da escola foi uma coisa diferente, porque eles não acreditavam que daria certo”, conta. Os pais eram apegados à ideia de que sempre haveria ataques de insetos às plantas. “Eu dizia que poderia passar qualquer outra coisa menos o veneno e que havia alternativas dentro da própria propriedade e sem custos”. Ela se refere ao uso de estercos e urina de vaca, além de pesticidas alternativos, como as caldas sufocálcica e bordalesa. “E tudo sem gastos, que é o que a gente pensa quando faz um projeto”, justifica.
CONTRADIÇÃO – Assim como os seus cem colegas de escola, Cheila ainda convive com o plantio de fumo dentro da propriedade. Isso implica uma divisão e organização dos trabalhos. “Uma parte da semana, quando eles precisam de mim na lavoura eu os ajudo e da mesma forma eles me ajudam com a horta”, descreve. Ela explica que a fumicultura está muito presente, porque vem de várias gerações” dos bisavós para os avós e destes para os pais”, mas que isso está mudando e influenciando os vizinhos. “Eles também passaram a ter sua produção de hortaliças agroecológicas e estão aprendendo a fazer o manejo. Quando surge alguma dúvida, me perguntam. É muito satisfatório falar com um vizinho sobre algo que se tem conhecimento e que representa uma alternativa ao uso de agrotóxicos e adubos químicos. Minha vontade é ficar no campo e incrementar a produção. Sou filha única e creio que nossa propriedade tem futuro”, diz orgulhosa, um pouco antes de sair com os pais para colher folhas de tabaco.
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Agricultor é alguém na vida
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O Projeto Profissional do Jovem (PPJ) é o fio condutor da formação em alternância, explica o secretário executivo da Agefa e professor-monitor Adair Pozzebon. “Na verdade, ele é resultado de todo o processo formativo desses três anos. Prevê, dentro das possibilidades, uma inserção forte e qualificada socioprofissional desse jovem, tanto na propriedade com uma perspectiva futura, como também na própria comunidade. Aí essas contradições se acentuam ainda mais, no sentido de que esse jovem começa a fazer algumas opções de trabalho e geração de renda na perspectiva da agroecologia. Até hoje, nenhum PPJ apresentado à escola está relacionado ao tabaco”.
O secretário identifica que esses jovens estão procurando outras possibilidades de produção, visando à continuidade na agricultura, porém numa realidade que é justamente a de que a fumicultura está em toda a região, onde mais de 80% das famílias produzem tabaco. “Os projetos buscam diversificar a produção dentro da propriedade e ter outras fontes de renda, numa perspectiva de mercados curtos e cadeias curtas de produção, com possibilidade de comercialização do produto em feiras e mercados institucionais, com utilização de políticas públicas. Tudo isso para além da subsistência, diminuindo a dependência das famílias”.
Para Adair, se construiu historicamente uma cultura nas famílias rurais de que “para pegar no cabo da enxada não é preciso ir para a escola”. Nesse sentido, explica o secretário, agricultura e educação sempre foram caminhos opostos. “Se quer ficar na roça e ser agricultor, para que ir à escola? Isso é o senso comum”, diz. Segundo ele, houve casos de famílias que colocaram seus filhos na Efasc para “ser alguém na vida”; e que esse “alguém na vida” parte de uma perspectiva “que esse alguém não é agricultor”, ironiza.
DESVALORIZAÇÃO – “Esse agricultor é alguém que historicamente é desvalorizado na concepção de ser uma profissão para pessoas que não deram certo na vida. Já tivemos casos de jovens em que a perspectiva dos pais era de que estudasse aqui para se tornarem técnicos e atuarem como instrutores das fumageiras. Com isso, alguns entraram em conflito direto com as famílias”. Adair conta que alguns jovens saíram da propriedade e foram embora por divergirem dessa perspectiva. “A escola entra como mediadora nos conflitos que existem dentro das famílias, pois desde o início as famílias são chamadas a participar do processo formativo, como co-formadoras.
Em dois casos de jovens que romperam com as famílias, um deles é monitor de EFA do Vale do Sol e o outro seguiu fazendo Agronomia na Ufrgs. “Muitas vezes a gente perde um pouco a esperança, mas casos como esses nos motivam. “A gurizada nos dá esperança de seguir nesse projeto”, justifica.
Todos preferem alimento sem veneno
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“Todo mundo precisa comer e todos preferem alimento saudável”, afirma Antônio Carlos Gomes, coordenador pedagógico da Associação Gaúcha Pró Escolas Famílias Agrícolas (Agefa), mantenedora criada em 2009 para gestionar a Efasc e futuras escolas com este modelo. “Estamos focando na produção e consumo de alimento saudável porque a saída econômica passa pela produção desses alimentos. Não se trata de um contraponto ao fumo. Não é isso. Mas todo mundo precisa se alimentar e todos preferem comer alimento limpo e livre de veneno”, argumenta.
Para o educador, como está começando a surgir uma preocupação maior nesse sentido, a escola está apostando muito nessa questão. Isso implica uma mudança de pensamento nas famílias dos alunos, que são pequenos produtores rurais habituados ao fumo e insumos químicos. “Mas impressiona que 99% ainda acredita que não é possível produzir um pé de alface sem veneno ou sem adubo sintético. Iniciar essa mudança aqui expõe uma contradição e gera conflitos internos”.
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Antônio explica que a Pedagogia da Alternância, linha seguida pela escola, trabalha a questão da produção de alimento no tempo e no espaço. Os estudantes passam uma semana na escola e outra nas propriedades. Além dos conteúdos formais de ensino médio, eles estudam os modelos produtivos até chegar onde se chegou, que é uma agricultura predominantemente voltada ao imediatismo e com uso de insumos químicos. “Mas isso é o de menos. O que importa é que a gente faz para ligar esses dois mundos. O projeto pedagógico e a metodologia”, define.
O jovem, em média com 14 anos, no primeiro ano que chega na escola é instigado a se perguntar: “quem sou eu?”; “quem é minha família?”; “quem é minha comunidade?”; “como é minha propriedade?”; qual o histórico?”. Então, ele vai pesquisar de onde veio. No segundo ano, ele estará mais voltado para a comunidade. E no terceiro, concluindo esse processo de diagnóstico ele vai desenvolver um projeto profissional.
A invisibilidade do campo na escola convencional
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A coordenadora pedagógica da escola, Cristina Luisa Bencke, afirma que 100% dos estudantes da Efasc são filhos e filhas de agricultores, provenientes de escolas públicas, estaduais e municipais. “Essas escolas se dizem pela lei “escolas do campo”, mas estão apenas, eventualmente, situadas em zonas rurais, porém não problematizam as questões que envolvem essas localidades”, critica. “Até o findar do nono ano, a escola convencional faz um desserviço, que é negar e invisibilizar o lugar em que eles vivem, que é o campo”, completa. “Então, na Esaf, durante todo o primeiro ano, eles se redescobrem quem são, quem é a família deles e quem é essa terra onde eles estão. No final do ano, eles fazem uma maquete, onde conseguem de forma concreta enxergar pela primeira vez: eles, a família e a propriedade deles, que, até então, não se enxergavam ali dentro. Eles estavam de passagem. Agora, eles se veem como um agente dentro daquele espaço”.
Conforme a pedagoga, a partir disso eles começam a perceber as contradições existentes. Essas contradições geram muito desconforto familiar. Há casos de estudantes, que por pressão familiar, e diante da resistência da família, decidam abandonar o curso.Mas segundo ela, a evasão é pequena. “Nos últimos sete anos não chegamos a 2%, praticamente nada”. Ocorreram um ou dois casos. “Vemos progredir o conflito de gerações quando o jovem chega ao terceiro ano e propõe um projeto profissional e de renda. Esse é o maior momento de conflito com a família”, explica.
“Ser mulher e agricultora é resistir”
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“Quando eu entrei aqui, assim como meus colegas, queria me formar técnica agrícola, com a meta de trabalhar na assistência técnica do município. Hoje, a gente quer passar longe disso. Principalmente por não concordar com a assistência técnica que eles fazem”, contextualiza Sofia Daiana Schroeder, 16 anos, nascida no município de Vera Cruz, que está iniciando o terceiro ano.
Para ela, ser mulher agricultora hoje é uma forma de resistir porque esse espaço não é historicamente das mulheres. As meninas representam menos de 20% dos alunos da escola. São nove meninas entre 91 meninos. “O trabalho da mulher não pode ser considerado meramente o de ajudar o marido, mas deveria ser visto como fundamental. A mulher culturalmente é quem produz o alimento dentro da propriedade e é quem prepara esse alimento, e isso é considerado apenas como ajuda. Todo mundo na propriedade come todos os dias e esse trabalho não é valorizado porque não gera renda. Ou seja, o valor está atrelado à renda”, defende.
“Na minha comunidade a gente está buscando, em conjunto com outras mulheres, resgatar os conhecimentos populares e plantas medicinais para poder utilizar na confecção de produtos fitoterápicos”, relata. Sofia explica que nesse grupo também é feito um trabalho de empoderamento e de valorização do trabalho das mulheres na comunidade e nas propriedades. “Os produtos fitoterápicos são comercializados, pois é muito importante que esse grupo tenha uma renda, já que esse grupo de mulheres está se organizando para uma agroindústria”.
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A colega de Sofia, Bruna Richter Eichler, 16 anos, de Venâncio Aires, pensa parecido. “A gente tá conseguindo se empoderar e se colocar melhor dentro da sala de aula e com a família também, mas com certeza tem conflito aí. Eu dialogo com minha mãe sobre o direito de fazer determinadas escolhas e que não dependem do meu pai, mas é difícil para ela entender. Essa questão da valorização do trabalho desempenhado pela mulher do campo só muda se o homem e a mulher fizerem tudo juntos, com outra mentalidade”. Bruna comercializa produtos orgânicos em feiras da sua cidade. “Entrei para um grupo de agricultores ecológicos e tanto eles como a escola têm me ajudado bastante. Imagino que devo ampliar a produção com o passar dos anos. Meu projeto provavelmente será nessa área de produção de hortaliças agroecológicas”.
Refeições pedagógicas
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Numa escola em que a produção de alimento saudável é o centro das atenções, até mesmo o momento das refeições é pedagógico. Tudo é feito com alimentos orgânicos cultivados pelos estudantes e monitores na horta da escola. Alexandro do Fabres Nascimento, 25 anos, de Rio Pardo, e egresso da primeira turma a se formar, hoje atua como monitor de produção agropecuária na Efasc. “A escola trabalha basicamente a produção de alimentos e a gente busca produzir alimentos, no meu caso as hortaliças, paro o próprio consumo. A ideia é produzir e aproveitar a horta como espaço pedagógico, usando as culturas que estão ali para a auxiliar na formação deles, principalmente no mérito da formação técnica”. Ele se formou técnico agrícola em 2011, fez estágio e segue na escola como profissional. Alexandro também produz com a família em sua cidade natal, Rio Pardo, para onde retorna todos os finais de semana, para trabalhar na produção de leite, alimentos e “um pouco de tabaco”.
Formado também em 2011, Diego Linberger, 21 anos também atua como monitor na escola. “Eu, especificamente, trabalhei em outro local antes de vir para trabalhar como monitor. E, como todo jovem egresso tem um projeto de conclusão, o meu foi sobre avicultura colonial e eu mantenho esse projeto na propriedade da família, para ser uma outra alternativa de renda. Nos finais de semana quando vou para Vera Cruz trabalho nisso com meus familiares. A gente vende diretamente para os consumidores ou com encomendas”.
A ideia é parar com a fumicultura
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Juliano Lawisch, 17 anos, mora em Boa Vista, distrito de Santa Cruz do Sul, e é filho único. Iniciou o estágio em 2016, mesmo ano que prestou vestibular para a Unisc e foi aprovado para Engenharia Agrícola, que espera cursar em 2017. “Meu projeto é a produção de amendoim orgânico que foi escolhido através das pesquisas que fiz pela escola e a partir das entrevistas com a família. Era uma produção que já tínhamos na propriedade, mas que fizemos melhoramentos principalmente no que se refere a insumos para migrar para uma cultura agroecológica”. Isso foi viabilizado utilizando um biofertilizante, uma técnica que aprendemos na escola. Quando Juliano comercializou amendoim orgânico na feira pedagógica da escola, um dos monitores o ajudou a colocar o produto numa feira ecológica de Porto Alegre. Na capital, conseguiu um comprador que paga R$ 12 reais o quilo, que normalmente vendia a R$ 7, em sua cidade.
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Ano passado, a família Lawisch reduziu 10% a produção de fumo, de 20 mil para 18 mil pés. “Estamos sempre buscando alternativas para outras rendas, para não ter apenas a renda do tabaco. Antes da minha entrada na escola já tinha diversificação, mas a partir das técnicas aprendidas na escola introduzimos novas culturas e outra forma de manejo”, relata o jovem.
A mãe, Neli Clarisse Lawich, e o pai, Renato José Lawisch, contam que a família mudou de mentalidade graças à escola. “Foi sem briga desde o começo”, diz Neli. “A gente gosta de coisas novas. Tudo a gente quer saber. O que for com menos veneno queremos aprender como faz, até por que capinamos muito ainda e a ideia é diminuir até parar com o fumo, uma vez que não dependemos mais dele”, afirma a mãe do jovem. “Hoje, conseguimos tirar o sustento da família da produção de amendoim, milho, banha, pães, carne, melado de cana, batata doce, ovos. Tiramos nosso consumo e vendemos muito aqui na vila mesmo e dá uma boa renda. E o que fez mudança no pensamento do Juliano sobre querer ficar no campo foi a escola”, explica a agricultora, empolgada. Os Lawisch possuem 20,7 hectares, sendo 1,5 hectare para fumo, 6 hectares de milho crioulo e em 3,5 hectares são usados para arroz e mandioca. Além disso, eles também têm criação animal.
Juliano descobriu com os colegas em pesquisas da escola, que muitos alimentos provêm de outras cidades e estados. Avaliaram também que haverá uma demanda de alimento futura com o crescimento da população e que vale a pena investir.
Confronto com a vida real
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“O mais interessante para nós, em relação aos parceiros, é quando o jovem sai da escola e se confronta com a vida real. Durante os três anos da Efasc, de certa forma, a gente cria um mundo paralelo. Esse jovem está em formação, no convívio da família, protegido”, provoca Antônio Carlos Gomes, da Efasc. De acordo com o pedagogo, esse jovem tem colegas com quem se identificar e principalmente, interlocução, porém na sociedade ele vai encontrar outra forma de pensar que é hegemônica e espaços de trabalho que não esperam, muitas vezes, aquele profissional que ele é e que se formou para ser. Um dos parceiros para fazer essa transição é o Centro de Apoio ao Pequeno Agricultor (Capa), que além de opção de estágio também assessora a produção familiar na região.
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“Para nós essa é uma parceria muito importante, aliás uma das melhores, devido ao seu caráter estratégico na região. Isso se deve à formação que a escola passa para os estudantes, tanto no enfoque da agroecologia, enquanto proposta tecnológica, quando na formação de cidadania. Não se trata apenas da formação técnica, mas também trata da questão de valores a partir de referências de que sociedade está carente”, explica Sighardt Hermany, coordenador do núcleo do Capa de Santa Cruz.
O Centro orienta, só no Vale do Rio Pardo, aproximadamente 300 famílias de agricultores, além da cooperativa de produtos orgânicos que reúne os produtores da região, a Ecovale. Conforme Sighardt, há mais mercado do que produto disponível. No Vale do Taquari, há um outro trabalho direcionado à questão da saúde, voltado para o resgate e aperfeiçoamento dos usos das plantas medicinais e de uma alimentação orientada. São em torno de 700 mulheres, totalizando cerca de mil famílias assistidas.
Ex-aluno incrementa renda da família com a produção deite
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No município de Vera Cruz, com quase 25 mil habitantes, próximo a Santa Cruz, Fabrício Lentz, de 20 anos, formado há um ano em técnico agrícola encara a vida real nos 34 hectares que ajuda a tocar em conjunto com o pai a mãe e outro irmão. Oito hectares são dedicados ao fumo. “Além do fumo, a gente começou com o leite que é um projeto que criei quando estava na escola. Nos primeiros dias de aula já me chamavam muito a atenção as práticas de produção animal, que numa pequena propriedade dava para produzir uma boa quantidade de litros de leite”, recorda.
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Fabrício começou pensando pequeno. “Eu trabalhava com meus pais e meu irmão no fumo e vinha da escola para casa e conversava com meu pai sobre investir em gado de leite. Ele dizia que não, que o investimento era muito alto. Insisti. Disse que, caso não conseguisse, trabalharia de técnico agrícola fora da propriedade. O pai pensou melhor e compramos cinco novilhas, depois mais algumas e, atualmente, já estamos com 13 vacas”, conta. Dessas, seis já estão produzindo, o que dá 60 litros por dia (vendendo a R$ 0,86 o que dá uma média de R$ 1,5 mil/mês). “Ainda queremos aumentar o volume de leite, mas estamos no começo e precisamos colocar o pé no acelerador devagar. Ainda estamos aprendendo a lidar com as vacas e investir em animais de grande porte ainda não é o caso, porque exige um manejo mais especializado. Mais adiante, sim”.
Dos dois anos que estão produzindo leite, hoje a família Lentz consegue guardar, fora as despesas da casa, R$ 300 reais/mês, livrando as despesas e dinheiro para comprar produtos que não produzem. “E é uma renda que entra diariamente. Tudo isso alternando com o fumo. Temos quatro fornos e plantamos 120 mil pés de tabaco. Isso mudou a rotina da casa. Porque o leite exige acordar mais cedo o que gerou mais trabalho e correria. Mas vale a pena. No futuro a ideia é ficar menos dependente do fumo e plantar menos pés”, explica.
RESISTÊNCIA – “Ele trouxe muitas coisas do colégio de que a gente não tinha muito conhecimento e juntou com o conhecimento que a gente já tinha. Uma delas é a questão do veneno. Muito veneno a gente nunca usava, mas totalmente sem veneno ainda acho complicado. Já a questão da produção de leite tá andando bem. As hortaliças ajudam na renda também, mesmo que, às vezes, não consiga vender tudo!”, diz o pai, Claudio Lentz, de 54 anos.
A família também investe em hortaliças, visando colocar produtos nos mercados locais. “Não posso dizer que é orgânico porque é plantado com proximidade ao fumo, mas é rumo ao agroecológico. Ainda estou na fase de convencimento da minha mãe a não usar adubo sintético, por ora estamos numa mescla com adubo natural, mas não tem veneno. Mas a horta chegou a render quase 1.000 reais que reinvestimos na propriedade”, diz Fabrício.
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