GERAL

Governo vai investir 9 milhões na produção de remédios

Publicado em 4 de maio de 2001

A questão das farmácias de manipulação passou a ser gerenciada, a partir de julho de 1999, por uma Comissão Interinstitucional que incluía representantes da Secretaria da Saúde, Famurs, AGM, Assedisa, Conselho Regional de Farmácia (CRF), prefeitos, secretários municipais de saúde e Agência Nacional de Vigilância Sanitária. A idéia era monitorar e procurar solução para um problema considerado grave. Uma dessas soluções foi a concessão de um prazo para que os estabelecimentos se adequassem à legislação federal, fossem como farmácias de manipulação ou como indústrias.

Não é o que pensa o deputado estadual César Busatto (PMDB). Candidato ao governo do Estado nas últimas eleições, Busatto argumenta que o governo do PT, através da sua Secretaria da Saúde, não procurou soluções para o caso das farmácias de manipulação. “Na verdade, em nome de um rigor técnico, estão destruindo uma experiência maravilhosa que beneficia especialmente as camadas mais pobres da população”, diz Busatto. Falando na audiência pública realizada no último dia 11 de abril, o deputado salientou que “o governo do PT é responsável por um crime contra os interesses públicos”. “Em vez de tentar viabilizar o funcionamento dessas farmácias, o governo estadual acabou com uma experiência exemplar, abrindo mercado para os laboratórios multinacionais”, dispara Busatto.

Ex-secretário da Saúde, o também deputado Germano Bonow diz que nenhum governo vai resolver o problema da falta de medicamentos. “A questão do medicamento não vai ser resolvida pelo governo estadual, nem por este, nem pelo passado nem pelo próximo, muito menos pelo governo federal.” Para Bonow, a criação das farmácias de manipulação geridas pelos municípios, feita quando ele era Secretário da Saúde, foi uma tentativa de solução para um problema antigo. “Não é o melhor remédio do mundo? Não, não é, não tinha como ser,” admite. “Mas o governo estadual poderia ajudar na busca de uma solução em vez de simplesmente fechar as farmácias.” Ao mesmo tempo, Bonow lembra que não há o mesmo rigorismo da fiscalização do setor da saúde no Estado com relação aos hospitais. “Há lugares como Santa Vitória do Palmar, em que os hospitais não têm mínimas condições de funcionamento. E esses hospitais não são fechados,” coloca, concluindo que se é ruim um hospital mal-equipado, pior é a inexistência de hospitais.

A figura do “remédio para pobre” fica evidente e melhor defendida nas manifestações de alguns prefeitos como o de Torres, José Batista da Silva Milanez, e o de Santa Cruz do Sul, Sérgio Ivan Moraes. Milanez, que é médico, diz que tem a firme intenção de abrir uma farmácia de manipulação em sua cidade como forma de atender necessidades emergenciais da população quanto aos medicamentos. “Vamos abrir uma farmácia no município, sim. Se ela vai funcionar como farmácia ou indústria, não importa. Vai funcionar conforme a lei.” O prefeito de Torres diz que vivencia no dia-a-dia, o problema da falta de medicamentos tanto como médico quanto como prefeito. Garante que convive com seu povo “de peito aberto”. Para Milanez, a farmácia que pretende implantar na cidade litorânea vai estar adequada ao rigorismo técnico exigido por Gilberto Barichello. “Se tiver de funcionar como farmácia, aviando receitas individuais, que seja assim. O que não se pode é deixar ao abandono a população carente.”

Mais melodramático, Sérgio Ivan Moraes, ex-deputado estadual e atual prefeito de Santa Cruz do Sul, lamenta o fechamento da farmácia de manipulação de seu município. “Daí meu povo, meus desempregados, vão lá e dão de cara com a farmácia fechada, um lacre do governo do Estado na porta, mas ninguém dá uma solução para isso.”

Célia Chaves, presidente do Conselho Regional de Farmácia (CRF), faz coro à cruzada de Barichello quanto à integridade total no processo de produção de medicamentos. Para ela, “se não surgiu, até o momento, um caso específico de morte por uso desses medicamentos fabricados sem qualquer controle de qualidade, é questão de tempo”. A presidente do CRF vai mais além e levanta a possibilidade de que “talvez existam casos e não sejam notificados”. Ela também lembra a inexistência, no Brasil, de “um sistema confiável de farmaco-vigilância”. Célia Chaves lembra, especificamente sobre a questão das farmácias de manipulação, que as vistorias realizadas durante o período de investigações desses estabelecimentos levaram a alguns resultados “assustadores”. É o caso, recorda ela, do laboratório da ULBRA, em Canoas. “De 11 medicamentos produzidos pela ULBRA, oito foram considerados abaixo dos padrões mínimos de qualidade.” Segundo Célia, havia medicamentos totalmente irregulares em dosagem e quantidade de princípio ativo.

O prazo dado pela Secretaria da Saúde para que as farmácias se adequassem à legislação acabou no começo deste ano, quando começaram as interdições. A essa altura, 24 delas já haviam se auto-fechado por inciativa das prefeituras municipais. Segundo Barichello, “a realização de seminários com os prefeitos levaram à conscientização de que estavam errados”. Oito farmácias persistiram na fabricação de medicamentos e foram interditadas. Cinco delas entraram com ações judiciais, mas nenhuma obteve o apoio da Justiça.

Barichello nega conotações políticas em todo o processo de fiscalização e interdição das farmácias e afirma que “não houve vontade de adequação” de parte da maioria dos estabelecimentos. Ao mesmo tempo, ele diz que não é intenção do governo estadual deixar a população desprovida de medicamentos. “É preciso mudar a ótica da produção de medicamentos no Estado”, diz Barichello que anuncia planos de criar duas grandes unidades produtoras no interior, as quais, juntamente com o Lafergs, poderiam suprir boa parte da necessidade de medicamentos. O projeto prevê um investimento superior a R$ 9 milhões de reais. “A idéia é que essas duas unidades fiquem situadas, por uma questão de sustentabilidade técnica, onde haja universidades com faculdades de farmácia”, completa. O Brasil é o quinto país em consumo de medicamentos no mundo. Dados da Fundação Oswaldo Cruz, do Rio de Janeiro, indicam que, das 80 mil mortes anuais por intoxicação no Brasil, 30% têm como causa o uso indevido de medicamentos.

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