Free Trade Area for the Americas, ou FTAA, é como se chama em inglês o que para nós é a ALCA, Área de Livre Comércio das Américas. Mas é curioso pensar que bem poderia se chamar AFTA, já que deriva diretamente do NAFTA, acordo de comércio restrito à América do Norte. Seria então apropriadamente “aftosa” a discussão sobre o assunto, ardente e febril, na qual não falta quem diga que tudo se resume em pimenta virar refresco no nosso, como sempre e mais uma vez.
Vivemos a última década sob o signo da abertura de mercados, das privatizações e de todo o receituário neoliberal ao mesmo tempo em que, estranha coincidência, assistia-se a uma expansão inédita da economia norte-americana e à estagnação brasileira, para não falar na falência argentina. Fica difícil acreditar que a radicalização desse processo venha a nos favorecer de alguma forma. E se entendi bem o que está sendo proposto até agora, então melhor mesmo é entregar a chave de casa pro Lalau e relaxar.
De cara, a primeira etapa prevista da implantação do acordo retira a autonomia dos países sobre as suas políticas comerciais, industriais e tecnológicas – ressalvado, é claro, o caso dos EUA, onde as leis comercias proíbem textualmente serem sobrepujadas por acordos externos. Em seguida, caem as barreiras tarifárias, recurso protecionista tipicamente brasileiro, mas permanecem valendo as não-tarifárias, as leis antidumping, todos os outros recursos dos quais o Norte costuma lançar mão – exemplo recente foi o bloqueio canadense à carne brasileira.
A maior das pérolas é a cláusula que possibilita às coorporações processarem os Estados. A Ford, por exemplo, se entender que alguma legislação trabalhista brasileira fere o seu direito sagrado ao lucro e ao livre-empreendimento, pode processar o estado brasileiro e exigir ressarcimento, imagino eu que uma metade do Tocantins ou o trecho do litoral entre Búzios e Porto Seguro. Em contrapartida, não há absolutamente nada previsto sobre direito dos trabalhadores e outros detalhes do gênero. É de se perguntar também onde ficaria o foro competente para dirimir tais controvérsias e a quais pressões estaria submetido.
Tio Sam pode ser acusado de muitas coisas, com uma honrosa exceção: nunca lhe faltou cara-de-pau. Responsável por um quarto da emissão global de gases na atmosfera, o país dos Bushes não faz muito negou-se – e é o único a fazê-lo – a ratificar o tratado de redução que tenta evitar o catastrófico aquecimento do planeta previsto para as próximas décadas. Mas não falta, no seu discurso sobre a ALCA, uma referência à questão ambiental que cheira – e como cheira – ao velho olhar ganancioso ianque sobre a Amazônia. Como alguém já disse, a vaca (a valca?), se não é, ao menos se faz de louca pra passar bem.