Nas trevas, dinheiro, poder e uma imprensa omissa
Há um dossiê público contra o senador Antonio Carlos Magalhães (PFL) à disposição de qualquer cidadão brasileiro nas livrarias do país. Memórias das Trevas, um livro de 765 páginas escritas pelo baiano João Carlos Teixeira Gomes, é um registro sobre o uso e o abuso do poder ao longo de mais de 40 anos. Uma mistura de truculência, corrupção, tráfico de influências, uso do estado a serviço de grupos privados, sob a batuta de um estilo arcaico, porém astuto, de um coronel nordestino que coleciona, entre seus orgulhos políticos, a fórmula de eleger um governador baiano, João Durval, em 1982. ACM dá a receita: “com o chicote numa mão e o dinheiro na outra”. Este é, na verdade, mais um livro revelador sobre os bastidores do poder. E que traz à baila outras questões, como a frouxidão da imprensa em apurar denúncias e o jogo de conveniência entre os veículos de comunicação e o poder, numa complacência que beira a cumplicidade.
O livro surge no momento em que Antonio Carlos Magalhães está exposto em mais um escândalo. Um caso obscuro de extorsão política, com lobby explícito na Procuradoria Geral da República, revelando informações que comprometem deputados, o ex-secretário geral da presidência da república, Eduardo Jorge – que estaria envolvido no esquema de corrupção na construção superfaturada do prédio do Tribunal Regional do Trabalho de São Paulo, o juiz Nicolau dos Santos Neto, o popular Lalau – e, consequentemente o presidente Fernando Henrique Cardoso. Magalhães montava o palco para usar as denúncias como chantagem. Deu azar. O procurador Luiz Francisco gravou a conversa e alguns trechos vieram a público. ACM, derrotado por Jader Barbalho na eleição do senado, perdeu a máscara em praça pública. Memórias das Trevas, nesse caso, surge apenas para lembrar quem é Antonio Carlos Magalhães. “É um oportunista político de longa data”, diz Gomes.
Foto: Divulgação
João Carlos Teixeira Gomes, o Joca, ex-diretor de redação do Jornal da Bahia, é um dos raros casos de enfrentamento a Antonio Carlos Magalhães. Um enfrentamento antigo, desde o primeiro mandato de ACM como prefeito de Salvador, em 1967. O acirramento se deu na década de 70. Nessa época, em 1972, o Jornal da Bahia denunciou favorecimento fiscal de Antônio Carlos Magalhães, que então moveu processo contra Gomes com base na Lei de Segurança Nacional. Gomes foi defendido pelo advogado Heleno Fragoso, que classificou o processo de “apenas um capricho de um tiranete”. O julgamento foi no dia 25 de setembro de 1972, em pleno governo Médici, o mais repressor do regime militar. Mas, mesmo perante um tribunal militar, Gomes foi absolvido. Este episódio, aliado a uma minuciosa construção do início da carreira política de ACM é uma valiosa contribuição p
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A publicação do livro, entretanto, teve muitos entraves.
Escrito entre julho e outubro de 1999, foi oferecido a várias editoras, entre elas a L&PM, de Porto Alegre, que alegou não poder editar a obra porque estava com a programação do ano fechada. A Casa Amarela, que edita a revista Caros Amigos, demonstrou interesse. Mas não conseguiu concretizar a edição. Gomes revela que foi ficando desanimado. “Havia um grande medo do Antonio Carlos Magalhães, que era presidente do senado”, constata. Até que a Geração Editorial, do jornalista Luis Fernando Emediato, decidiu editar Memórias das Trevas. É lógico que aproveitou o momento, quando Antonio Carlos Magalhães e o atual presidente do senado, Jader Barbalho (PMDB), trocavam acusações. Por isso mesmo, levantaram-se algumas insinuações da obra.
Uma delas é de que teria sido encomendada por Barbalho. Gomes ironiza esta hipótese: o livro estava pronto muito antes da briga entre os senadores estourar.