EDUCAÇÃO

Paixão precoce

Márcia Camarano / Publicado em 24 de outubro de 1999

Modelos de comportamento professores viram alvo de fantasias dos alunos

Há cerca de três anos o mundo foi abalado com a notícia de que, nos Estados Unidos, uma professora de 35 anos havia seduzido um aluno de 14 e com ele tido um filho. Resultado da história: ela foi para a prisão, o marido pediu o divórcio e conseguiu a guarda dos três filhos do casal. O caso reflete a perda de controle de situações que surgem em sala de aula, em que alunos( as) se apaixonam por professoras( es) com mais freqüência do que se imagina.

A pergunta é: como agir quando tal situação aparece em sala de aula? No ano passado, o professor de inglês Helio Panzenhagen Júnior, 36 anos, foi surpreendido por uma aluna da sexta série, de 11 anos. “Ela começou insistentemente a querer conversar comigo, sempre no intervalo; chegou um momento em que ela não agüentou e falou ‘a fulana disse que o senhor tem uma bunda muito bonita e eu também acho’. Se virou e saiu correndo”, relata.

O fato constrangeu Helio, ele estava só com a aluna no corredor da escola. “Procurei continuar agindo de forma natural”, diz. O professor passou a se policiar, evitando fazer qualquer coisa que estimulasse a aluna. Mas a menina insistiu com o assédio ao professor, chegando a perturbar a sala de aula.

Foi tamanho o constrangimento que Helio se perguntava se a aula estaria sendo assimilada pelos alunos. O professor acha que esse tipo de situação se deve ao bombardeio da mídia em torno da idolatria. Ele procurou desmistificar a situação, usando como tática o diálogo. Não levou o caso à direção ou aos colegas, mas aprendeu uma lição. “Por mais preparo que se tenha, é difícil lidar com esse tipo de situação”, conclui.

As relações afetivas entre professores e alunos é o trabalho de mestrado da professora Zuleica Rangel. Para ela, o deslumbramento é uma característica natural na pré-puberdade, quando aflora a sexualidade. “Hoje em dia isso é muito precoce e já se encontram situações assim até na educação infantil”, explica.

Zuleica informa que o deslumbramento com o professor nesta fase pode chegar ao ponto de surgir uma paixão, pois é quando a criança está saindo para o mundo. “O professor é o modelo do saber, o referencial”, relaciona.

Bem, isso na infância. Mas na adolescência, sim, a malícia é total. Zuleica comenta o drama das estagiárias da PUC que dão aulas para adolescentes e têm de trabalhar com calça larga e moleton por cima. “Existe algo fundamental que é a postura do professor. Situações assim podem acontecer independentemente da idade. Tem de ter um olhar compreensivo, sem deixar de dar um tratamento especial”, diz.

Zuleica alerta que se a situação se prolongar a ponto de interferir no próprio relacionamento entre colegas, é preciso contatar a equipe multidisciplinar. “Mas o professor deve primeiro tentar resolver o problema sozinho. Não se deve esquecer que hoje, mais do que nunca, as pessoas são mais espontâneas. Portanto, é preciso encorajar o aluno a falar e se propor a ouvilo”, ensina.

A idealização excessiva faz parte do processo de aprendizagem, concorda a psicóloga Raquel Guglielmi, que trabalha com crianças e adolescentes. “A aprendizagem, necessariamente, precisa passar pelo encantamento”, justifica. Segundo Raquel, o professor é admirado. Portanto, é comum o aluno se apaixonar.

Raquel concorda que a erotização precoce é um grande problema hoje em dia. Ela diz que a indústria do sexo descobriu crianças e adolescentes como grandes consumidores. “É muito preocupante ver meninas de cabelo oxigenado rebolando a bundinha”.

E isso chegou em sala de aula. Para a psicóloga, o professor tem de ter tranqüilidade e bom senso, saber lidar com a situação e não evitar o assunto. É preciso estabelecer regras de convivência, que serão válidas para a vida toda. É uma questão de ética impor limites. No caso da professora norte-americana que abre esta reportagem, Raquel acredita que ela foi inconseqüente nos seus atos, complicando muito a cabeça do menino. ”Ela foi antiética”, decreta Raquel.

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