“Nada a perder, todo um mundo a ganhar”. Este foi o tema do XVII Congresso Nacional da Andes/Sindicato Nacional (Associação Nacional dos Docentes do Ensino Superior), realizado em Porto Alegre, de 6 a 11 de fevereiro. Mais de 300 delegados de todo o Brasil discutiram a conjuntura nacional e propostas de ação da categoria para 1998, consolidadas na “Carta de Porto Alegre”, que reúne as deliberações do encontro.
Além da discussão política, o evento foi marcado também pela disputa eleitoral – em maio haverá eleição para a diretoria da entidade – e pelo debate da Medida Provisória do governo federal que institui o Programa de Incentivo à Docência, ainda a ser regulamentado.
O governo anunciou a medida como forma de estimular e qualificar os docentes mais habilitados para o ensino de graduação. O Programa destina bolsas mensais para doutores no valor de R$ 1.100,00, mestres R$ 750,00 e especialistas R$ 400,00, a serem distribuídas pelas próprias universidades, com a exigência de que o professor fique no mínimo 10 horas em classe, sendo seis horas na graduação.
Os congressistas aprovaram uma moção de repúdio contra o projeto do governo e consideram a MP mais uma provocação contra a universidade pública, que sistematicamente vem sofrendo com cortes de verbas, salários sem reajustes há três anos e sucateamento. Como não há reajuste salarial, está prevista uma verda-deira guerra em busca das bolsas, em número inferior à quantidade de professores aptos a recebe-las.
Até mesmo a reitora da UFRGS, Wrana Panizzi, sustenta que, “numa rápida olhada, dá para perceber quais os departamentos que sofrerão maiores problemas” sem, no entanto, revelar quais são. Para ela, os indicativos do programa são muito acanhados para a expectativa da universidade. A “Carta de Porto Alegre” afirma que este é mais um embuste: “uma clara tentativa de desmobilização da luta em torno das reivindicações; institucionaliza a quebra da isonomia no interior das IFES; exclui os professores aposentados, graduados e de 1º e 2º graus, avançando na quebra da paridade entre professores ativos e inativos”.
O documento aponta ainda que a MP segmenta ensino, pesquisa e extensão – o que na universidade é indissociável; desrespeita a sociedade brasileira através da falsa idéia de melhoria de qualidade de ensino, negando-se em enfrentar os reais problemas da universidade brasileira. Por fim a Carta expôe que se trata de um derradeiro ataque à autonomia universitária e à concepção do plano de carreira e de capacitação docente defendidas pela Andes.
ELEIÇÃO – Diante do quadro é provável que o ano letivo nas universidades comece com greve. É o que as bases docentes estão debatendo a partir do indicativo do Estado de greve em todo o Brasil. A presidente do Andes, Maria Cristina Morais, argumenta que essa é a forma dos professores repudiarem as políticas do governo, bem como impedirem a destruição da universidade.
O presidente da Associação dos Docentes da UFRGS (Adufrgs), Renato de Oliveira, prevê que os professores da UFRGS deverão aderir à paralisação. “É insuportável a realidade de salários con-gelados desde 1995” justifica, acrescentando que a greve pressionará o governo a oferecer um reajuste que equilibre os salários das instituições públicas com os das particulares.
Oliveira lidera a chapa de oposição para o Andes. Ele acusa a atual diretoria de burocrática, autoritária e intransigente, com um discurso radical e uma prática imobilista. “A decorrência disso é um desgaste muito grande do sindicato junto à universidade. Eles sempre radicalizaram e nós sempre defendemos que greve tem de ter um motivo. Agora que tem, eles recuam”. Luiz Carlos Soares, da Universidade Federal Fluminense, concorre a presidente pela situação. “Há uma divergência de estratégia entre as duas chapas, mas a linha geral é a mesma, de combate às políticas do governo”, explica Soares. Para ele, a luta em defesa da universidade está articulada com outros setores da sociedade e “essa não é a perspectiva da oposição”.
Previdência
Governo abre o cofre para aprovar reforma
Da Redação
No dia seguinte à aprovação da emenda da Previdência, em primeiro turno, na Câmara dos Deputados, o presidente Fernando Henrique Cardoso comemorou o resultado – 346 votos a favor, 151 contra – com goles de champagne, na companhia de assessores e do presidente do Congresso, senador Antonio Carlos Magalhães. Foi o brinde por uma vitória que, embora parcial – ainda faltam a votação em segundo turno na Câmara e em dois turnos no Senado -, praticamente garante a reforma desejada pelo Palácio do Planalto.
Para vencer a primeira batalha, o governo não hesitou em abrir os cofres na hora de garantir os votos de deputados da própria base de apoio, que ameaçavam desertar. Comandada pelo ministro das Comunicações, Sérgio Motta, a negociação envolveu a liberação de R$ 22 milhões, através de emendas extra-orçamentárias para áreas de infra-estrutura e saneamento básico. O dinheiro será distribuído antes do segundo turno, previsto para março, pela Secretaria Especial de Políticas Regionais.
Os convênios retidos pela Caixa Econômica Federal (CEF) também foram para o balcão de negociações. Nos dias que antecederam à votação, o presidente da Caixa, Sérgio Cutolo, liberou cerca de R$ 4 milhões para atender programas de saneamento e habitação em vários municípios e Estados.
A pequena margem de votos favoráveis à emenda, calculada pelos líderes governistas, obrigou o Executivo a negociar até o último momento. O presidente FHC preferiu contrariar o companheiro tucano Mário Covas, governador de São Paulo, a desprezar os dez votos oferecidos pelo ex-prefeito Paulo Maluf (PPB). Maluf tomou o café da manhã no Planalto e, à tarde, foi visto no gabinete do ministro dos Transportes, Eliseu Padilha, em busca de verbas para estradas.
À saída do encontro com Maluf, FHC negou que tivesse feito qualquer barganha. Enquanto isso, o deputado Luís Eduardo Magalhães (PFL-BA), líder do governo na Câmara, recebia os pedidos por meio de bilhetes no plenário e dava encaminhamento com despachos à mão. Um parlamentar chegou a gritar, da sua cadeira: “da outra vez, prometeram e não deram, agora vão ter que dar.”
PROMESSAS – Alguns pontos da reforma ainda terão de ser votados, na volta do recesso do Carnaval. São nove Destaques para Votação em Separado (DVS) e cerca de 30 emendas apresentadas pelos deputados. Entre eles estão a idade mínima para requerer a aposentadoria (60 anos para homens e 55 para mulheres), o redutor de até 30% para os benefícios dos servidores públicos e o período adicional de contribuição previsto nas regras de transição (20% para a integral e 40% para a proporcional).
O governo quer evitar surpresas no segundo turno e trata de cumprir logo as promessas de liberação de verbas. Após a votação, alguns parlamentares já avisavam que o resultado da nova rodada “vai depender do governo”. Para satisfazer a base de apoio, além de dinheiro, o Planalto cedeu em alguns pontos da reforma, como o fim da contribuição para os servidores públicos inativos.
Fernando Henrique também não quer pôr em risco seu projeto de reeleição. Por isso, a regulamentação da reforma da Previdência só deverá ir para o Congresso após 4 de outubro. O ministro Reinhold Stephanes adiantou que a intenção é enviar três projetos de lei complementar.
Um deles trata do novo regime da Previdência Privada, outro da Lei Geral da Previdência Social e o último dos fundos de pensão a serem criados no setor público para custear as aposen-tadorias e pensões dos servidores.
A segunda etapa da reforma já está sendo preparada pelo economista André Lara Resende, para um eventual segundo mandato de Fernando Henrique. Uma das propostas abre caminho para os planos de previdência privados. As contribui-ções de empresas e segurados bancariam uma parte das aposentadorias. A outra parte seria custeada por contribuições compulsórias ou voluntárias dos trabalhadores a um fundo de investimentos. Esse é o mesmo modelo já adotado na Argentina e no Uruguai.
O governo também pensa em reduzir o teto dos benefícios dos segurados. Pelo texto aprovado, esse valor equivale a dez salários mínimos, mas passaria para algo em torno de três salários mínimos. As duas medidas, combinadas, forçariam os trabalhadores a aderirem a planos de previdência complementar.
AS MUDANÇAS
CONTRIBUIÇÃO – Terminam as aposentadorias por tempo de serviço e pro-porcional. Em seu lugar passam a valer os critérios de tempo de contribuição e idade. Para os homens, 35 anos de contribuição e 60 de idade. As mulheres poderão se aposentar com 30 anos de contribuição e 55 de idade.
DIREITOS – A reforma mantém os direitos adquiridos de quem, até a promulgação da emenda, tiver cumprido as exigências para a aposentadoria pelo regime atual.
ESPECIAL – A aposentadoria especial só poderá ser concedida a trabalhadores que exerçam atividades sob condições prejudiciais à saúde ou à integridade física.
TRANSIÇÃO – Para os atuais contribuintes da Previdência foram criadas regras de transição ao novo regime. Os homens poderão se aposentar aos 53 anos de idade, e as mulheres aos 48. O tempo que falta para a aposentadoria integral deverá ser acrescido de 20%. Para a aposentadoria proporcional, o acréscimo é de 40%.
SERVIDORES – Do servidor público será exigido no mínimo dez anos de efetivo exercício no serviço público, além de cinco anos no cargo efetivo em que se dará a aposentadoria. Os funcionários públicos não poderão acumular proventos de aposentadorias com remuneração de cargo, emprego ou função públicos (exceto os casos previstos na Constituição Federal). Também ficam impedidos de receber mais de uma aposentadoria como servidor público.
PROFESSORES – Apenas os professores de educação infantil, ensino fundamental e médio continuam tendo direito à aposentadoria especial, com 55 anos de idade e 30 de contribuição (homens), e 50 de idade e 25 de contribuição (mulheres). Ainda assim, deverão comprovar que exerceram o magistério durante todo o período. Os professores universitários perdem esse direito, exceto os que já têm 30 anos de trabalho (homens), ou 25 (mulheres). Os demais poderão acrescentar 17% (homens), ou 20% (mulher) ao tempo de serviço. Depois disso, valem as regras de transição.