Poucos se deram conta, como sempre. Mas no final do ano passado, antes que o Congresso Nacional entrasse em recesso, a Câmara dos Deputados aprovou, a toque de caixa, em primeiro turno, uma alteração à legislação que permite a alienação do capital e do controle de empresas nacionais de comunicação a empresas estrangeiras. Apenas mais um item da longa lista de temas polêmicos e importantes que mudam a via de cada cidadão brasileiro, como aconteceu com a aprovação, também às pressas, no final do ano passado, do projeto de lei 5483/01 que fez alterações profundas à Consolidação das Leis do Trabalho (CLT). O líder do PT na Câmara dos Deputados, Walter Pinheiro, disse que o episódio faz parte de “um saco de maldades”, em que estão incluídos também um corte de recursos do Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT) e um reajuste do salário mínimo sempre inferior a 5%.
Desde a adoção do Plano Real, em 1994, o governo promoveu uma série de mudanças por meio de projetos de lei, leis complementares, medidas provisórias e portarias. Uma política nocauteadora, resultante da poderosa dobradinha entre o Palácio do Planalto e o parlamento, formado na sua maioria por representantes da base governista. Em uma de suas primeiras investidas, o governo federal foi derrotado na votação da idade mínima para aposentadoria, quando queria reintroduzir a exigência de limite de 60 e 55 anos para que trabalhadores e trabalhadores se aposentassem. O governo não se conformou e voltou à carga, por meio do projeto de lei 1527/99, para modificar as leis que regulamentam o custeio e benefícios da Previdência Social. “Quem não alcançar pelo menos 60 anos de idade e 40 de contribuição perderá o direito ao benefício da previdência integral”, alerta a Central Única dos Trabalhadores (CUT), em documento assinado por seu presidente nacional João Felício.
Outra “modernidade” veio a público recentemente em forma de proposta de ampliação de seguro-desemprego, esticando-o para 12 parcelas. À primeira vista, parece bom, se não for levado em conta o detalhe de que, nos últimos anos, o Brasil ampliou os índices de desemprego e de trabalho na informalidade. O desemprego aberto que, em 1993 já era considerado elevado pela Organização Internacional do Trabalho (OIT), saltou de 5,3% (IBGE) para mais de 6,2% em 2001, significando uma expansão de 34,3% do número de desempregados no período. Junto ao desemprego, houve um crescimento acelerado do trabalho informal.
“O traço mais visível de informalidade, a contratação de assalariados sem carteira, foi a que mais cresceu após a implantação de diversas modalidades da chamada flexibilização da alocação do trabalho (contrato de trabalho por prazo determinado, flexibilização ainda maior do trabalho a tempo parcial e do trabalho temporário)”, destaca Felício. Todas as medidas do governo, acrescenta, contaram com a justificativa de que o mercado de trabalho no Brasil é muito rígido, com custos elevados, sendo importante remover os obstáculos para obter crescimento, gerar empregos, deter a informalidade, aumentar as exportações. “Se essa tese fosse válida, o desemprego deveria estar em níveis mais baixos, o crescimento econômico alcançaria níveis robustos e as exportações estariam gerando expressivos superávits na balança comercial. Mas nada disso aconteceu, pelo contrário”.
A votação para alterar a CLT deve acontecer em março no Senado. Em vista disso, está marcado para o dia 21 uma série de manifestações em todo o Brasil, a fim de impedir “a maior derrota do movimento operário brasileiro”, conforme Felício.