Novas tecnologias obrigam professores a atualizar conhecimentos e a enxergar na máquina um aliado na busca por informações
Se os salários permanecem achatados, o ofício de educar, em época de globalização,
“A sociedade está em mudança, a vida é um conjunto de relações, mas a escola continua abrindo e fechando as portas entre um período de Geografia e outro de Matemática”, critica a professora do Instituto de Psicologia da Ufrgs, Léa Fagundes, que coordena um programa nacional de educação à distância financiado pelo CNPq. “Hipermídia pressupõe interdisciplinaridade”, adverte, lançando mão de um vocabulário que tem se tornado obrigatório para qualquer tipo de professor.
Foto: René Cabrales
Giz e quadro negro, porém, continuam no cardápio das escolas brasileiras, que na sua maioria, privilegiam o ensino seriado e os turnos divididos em períodos demarcados pelo grito de sirenes. A idéia, ao que parece, segue sendo a de preservar as verdades de uma geração, para que sejam retransmitidas à que vier em seguida. Mas as faculdades de Pedagogia seguem formando analfabetos digitais que, na melhor das hipóteses, chegam a autodidatas. Na maior universidade pública gaúcha, a disciplina O Computador na Educação, com carga horária de 45 horas, não é obrigatória para os formandos.
O currículo não esconde a defasagem entre alunos e professores. E a formação mantém base conservadora, mesmo que leve selo de libertária e pregue a cartilha de Paulo Freire. “A formação disciplinar que o professor recebe na universidade faz com que ele assuma um papel restritor e não ajude o aluno a sair da posição passiva em sala de aula”, admite a professora da Faculdade de Pedagogia da Ufrgs, Rosane Aragon.
É que o computador, salienta Léa Fagundes, difere de outras inovações ao expandir as capacidades cognitivas – e não os poderes físicos – dos que o utilizam. Ou seja, aprender a partir do computador tornou-se mais fácil e muito mais rápido. E, ao conquistar a comunidade escolar, a informática forçará o professor – segundo Léa – a vencer a defasagem acumulada e a exercitar a humildade ao assumir, diante da classe inteira, que não sabe mover o mouse tão bem quanto o próprio aluno.
Foto: René Cabrales
“Muitos têm até medo de serem substituídos pela máquina”, garante a professora da Pós-Graduação em Informática na Educação da Ufrgs, Patrícia Behar. Ela explica que, ao questionar a hierarquia entre professor e aluno, o uso do computador traz de volta a motivação, o interesse e o respeito em sala de aula. Conforme Patrícia, experiências em projetos-piloto comprovam que o emprego da informática em atividades coletivas enterra a noção de que ela só serve para isolar ou alienar.
Os projetos favorecem a ambos os lados: quando se descobre parceiro do aluno no uso criterioso da informática, o professor fortalece a auto-estima e o domínio de classe, mesmo sem dominar o teclado. E o aluno, que desde cedo convive com a máquina, serve de guia ao mestre e aprende a entender o que lhe será cobrado. “Qualquer autoridade, para que seja positiva, tem de ser atribuída; os alunos só respeitam quem lhes quer bem”, adverte Léa. Ana Paula de Couto e Athena Guimarães, 12 anos, colegas na 7ª série do Colégio Sévigné, concordam: “O desinteresse é maior em aula de professor que sabe tudo e não admite opinião contrária”, afirmam.
A mudança de paradigmas exige, porém, que o educador se dedique à experiência e utilize os recursos disponíveis de maneira crítica e inteligente. De nada vale pedir ao aluno que use o computador para passar redações a limpo, enfeitar folhas de rosto ou trabalhar com ferramentas prontas, que geralmente reproduzem a lógica de ensino cartesiana, de respostas únicas e comportamentos definidos. “O laboratório de informática existe para motivar novas abordagens de conteúdo; não é uma sala de televisão de luxo, nem deve servir, na escola, para que os alunos aprendam as técnicas para lidar com aplicativos ou ferramentas”, adianta o psicólogo Daniel Lopes, que assessora o Laboratório de Informática Educacional do Colégio Sévigné, em Porto Alegre.
Escolas da rede particular tampouco levarão vantagem, frente à concorrência, se montarem laboratórios de alta tecnologia e não souberem preparar o corpo docente para que estimule a autocrítica da turma. É preciso, sobretudo, que o professor acompanhe a classe, permaneça com ela no laboratório e avalie o trabalho que foi desenvolvido. “Só as experiências perturbadoras conseguem levar um professor de formação disciplinar a deixar a ‘aulinha pronta’ de lado e a ensinar de uma outra maneira”, conclui a educadora Rosane Aragon.