Ilustração: Ricardo Machado
Ilustração: Ricardo Machado
Políticos como o lendário Ademar de Barros e Maluf, que declaradamente roubavam mas faziam, reclamavam para si um pouco dessa imunidade do artista. Suas obras justificavam seus pecados, quando não eram uma decorrência deles. O sistema de conveniências e corrupção aberta que domina o atual Congresso brasileiro, certamente o pior que já tivemos, pressupõe a mesma desconexão entre moral privada e moral aparente, ou uma justificativa sem disfarce para a traquinagem sem proveito. A cultura do clientelismo, em que o proveito substitui a ética, está baseada nesta perversão. A reação crescente a este despudor explícito vem com a conclusão de que aqui não se tem nem a ética nem o proveito, a não ser para quem concorda que valia tudo, por exemplo, para manter o Temer no governo, às favas a vergonha, como diria o Gilmar.
Em cleptocracias mais avançadas, como os Estados Unidos, a obra dos artistas do desenvolvimento, todos bandidos, redimiu-os. Empresários corruptores e políticos corruptos fizeram do país o que ele é hoje. O capitalismo americano domou-se a si mesmo, ou controlou-se razoavelmente. O Congresso deles tem picaretas e vendidos iguais aos nossos, mas não tão evidentes. O tempo de Auden adora a linguagem e perdoa seus craques, o tempo americano adora o sucesso e perdoa todos os seus meios. Aqui, avançamos, resolutamente, para o passado.