Crime e castigo
Foto: Igor Sperotto
Quase um ano após terem sido libertados do regime de escravidão em que trabalhavam em uma fazenda de Vacaria, no Rio Grande do Sul −, quatro jovens receberam a indenização de seus contratos de trabalho. O pagamento foi feito pelo proprietário da fazenda, Marcos Kuhn Adames, após audiência realizada no dia 4 de julho, na Vara do Trabalho de Vacaria pelo Ministério Público do Trabalho (MPT).
Os adolescentes na faixa dos 15 a 17 anos foram flagrados trabalhando na fazenda de pinus em condições análogas a de escravidão, pela qual deveriam ser indenizados. Em agosto de 2011, ao realizar uma reportagem sobre o tema, o jornalExtra Classe descobriu que Adames havia pressionado os rapazes a devolverem o dinheiro da indenização após libertados. O fato foi denunciado ao MPT de Caxias do Sul, o que levou o procurador Rodrigo Maffei a ajuizar uma ação civil pública. Além das verbas rescisórias originárias dos contratos de trabalho pagas agora, a ação prevê um valor referente ao dano moral a cada um dos jovens, e outro por dano moral coletivo. O processo terá continuidade.
Os nomes dos adolescentes e a cidade onde vivem, na região dos Campos de Cima da Serra, não são divulgados, para preservar suas identidades, conforme determina o Estatuto da Criança e do Adolescente. Procurado em maio pela reportagem para falar sobre o caso, por e-mail e por telefone, Adames não respondeu aos pedidos de entrevista. Na primeira audiência, em 12 de abril, o proprietário da fazenda de pinus admitiu ter pedido aos jovens que devolvessem parte do dinheiro, alegando ter um pequeno negócio e poucas condições financeiras, mas negou que os tivesse pressionado.
A preocupação das mães desses jovens, quando foram libertados pelos fiscais da condição de trabalho escravo na fazenda de pinus, era sobre o futuro de seus filhos. Uma delas disse que preferia que o garoto estivesse trabalhando, mesmo que em condições péssimas, porque isso evitaria o seu envolvimento com drogas. Este é um problema frequente na região, em função da falta de oportunidades e alternativas na cidade em que vivem − os poucos programas existentes são direcionados às crianças. “Não há cursos profissionalizantes para adolescentes”, admitiu a assistente social Thalita Jappe.
De acordo com o levantamento da conselheira tutelar Fernanda Denise Morais, que acompanha o caso, dois não haviam concluído seus estudos.
Uma opção para esses jovens poderá ser o projeto POD Legal (Programa de Oportunidades e Direitos) que funciona em Vacaria. Numa parceria da Secretaria de Justiça e Direitos Humanos, Centro de Integração Empresa Escola (CIEE) e governo federal, o POD prevê que, durante dois anos, jovens entre 14 e 24 anos em situação de vulnerabilidade social estudem e trabalhem em empresas da região, recebendo meio salário mínimo regional e vale-transporte.
“Começamos com 20 vagas e estamos ampliando para mais 50”, informou Vinicius de Andrade, 18 anos, vice-coordenador da Juventude de Vacaria. Andrade, que é estudante de Administração e coordenador do Diretório Central de Estudantes da Universidade de Caxias do Sul, diz que os adolescentes que vivem em cidades próximas, como os libertados de trabalho escravo, também podem ser atendidos por esse projeto.