POLÍTICA

Orçamento de Guerra é aprovado no Senado e retorna à Câmara

A pretexto de enfrentamento da crise gerada pela pandemia, Medida Provisória levanta teto de gastos do governo para socorrer a iniciativa privada e bancos com dinheiro público
Por Gilson Camargo / Publicado em 17 de abril de 2020
Apesar de protestos pela análise de uma mudança na Constituição em sessão remota, a matéria recebeu o apoio de 65 senadores

Foto: Edilson Rodrigues/Agência Senado

Apesar de protestos pela análise de uma mudança na Constituição em sessão remota, a matéria recebeu o apoio de 65 senadores

Foto: Edilson Rodrigues/Agência Senado

O Senado aprovou no início da tarde desta sexta-feira, 17, o texto substitutivo à Proposta de Emenda à Constituição (PEC) do “Orçamento de Guerra”, em segundo turno. Foram 63 votos favoráveis e 15 contrários. Devido às alterações feitas no texto, a proposta volta à Câmara dos Deputados.

A votação em primeiro turno havia sido concluída na última quarta-feira, 15, após várias horas de debates. A sessão de segunda-feira, 13, inclusive, foi reservada apenas para a leitura do relatório de Antonio Anastasia (PSD-MG) e para discussões. Anastasia acolheu sugestões de senadores e fez várias mudanças no texto que havia sido aprovado pelos deputados. Devido às alterações, a matéria deve retornar para nova apreciação dos deputados.

De autoria do presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM) e de outros nove deputados de vários partidos, a PEC 10/2020 permite a separação do orçamento e dos gastos realizados pelo governo para enfrentamento da crise de saúde do orçamento geral da União. As regras terão vigência durante o estado de calamidade pública, ou seja, até 31 de dezembro deste ano, e convalidam os atos de gestão praticados desde 20 de março. A intenção da proposta é criar um regime extraordinário para facilitar a execução do orçamento relacionado às medidas emergenciais, afastando possíveis problemas jurídicos para os servidores que processam as decisões sobre a execução orçamentária.

Apesar de levantar o teto de gastos, instituído pela PEC da morte em 2019, na prática, a estratégia de “guerra” aprovada pelos deputados torna sem efeito a Lei de Responsabilidade Fiscal e libera o governo para, além das pedaladas fiscais, gastar o que quiser com o que bem entender – no caso, socorrer a iniciativa privada e os bancos com dinheiro público. A maior parte dos recursos serão realocadas das áreas sociais.

PAPÉIS PODRES – Uma das medidas previstas autoriza o Banco Central a comprar e vender direitos creditórios e títulos privados de crédito (promessas de pagamento de dívidas, que viram papéis negociados no mercado) em mercados secundários. O objetivo da proposta é dar condições ao BC de equilibrar o mercado.

O substitutivo de Anastasia trouxe elementos adicionais ao texto aprovado na Câmara. Ele incluiu um dispositivo que obriga o Banco Central (BC) a informar ao Congresso Nacional sobre os títulos que comprou e dar detalhamentos que permitam uma análise dos riscos envolvidos. Além disso, uma série de ativos que o BC for comprar (cédulas de crédito imobiliário e cédulas de crédito bancário) precisarão de avaliação de qualidade de crédito realizada por uma grande agência de classificação de risco. Essa classificação não poderá ser inferior a BB-.

O relator ainda excluiu da PEC original o trecho que criava um Comitê de Gestão de Crise, encabeçado pelo presidente da República e composto por ministros de Estado e secretários estaduais e municipais. Segundo ele, o comitê poderia trazer problemas constitucionais, como a invasão de competências de um Poder sobre o outro.

Horas antes da votação em primeiro turno, outras alterações foram feitas. Anastasia incluiu um dispositivo determinando que o BC priorize a compra de títulos de micro, pequenas e médias empresas. Outra alteração proíbe as instituições financeiras que venderem ativos para o Banco Central de utilizarem os recursos para distribuição de lucros e dividendos.

O relator também fez um acordo com os partidos Rede e Cidadania. Duas emendas foram retiradas e, em troca, o texto passou a prever que as empresas devem se comprometer a manter os empregos para usufruir dos benefícios pela União nos programas de combate à crise econômica gerada pela pandemia.

DÍVIDA PÚBLICA – Por meio das Notas Técnicas 3 e 4, a Auditoria Cidadã da Dívida considera que as modificações feitas no texto não alteram “a essência do rombo de trilhões, que provocará aumento exponencial da Dívida Pública ilegítima e escandalosa”. A autorização para compra, pelo Banco Central, de papéis podres dos bancos em mercado de balcão, foi transferido do artigo 7º para o 8º. “Essa renumeração decorreu da inclusão de um novo artigo 4º que, embora aparentemente positivo ao mencionar a manutenção de empregos, condiciona tal medida a benefícios genéricos concedidos em programas da União, que não estão relacionados com a compra de papéis podres pelo Banco Central, que só beneficiará bancos e grandes corporações ligadas a eles, como constou do próprio relatório de Anastasia”, alerta a ACD.

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