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Xará xarope

Por Fraga / Publicado em 21 de setembro de 2020

Rafael Sica

Rafael Sica

É uma era de constrangimentos. Ou hera, porque brotam sem parar. E surgem por todo canto: manchetes ou editoriais de jornais, em bandeiras bozonarianas na sacada em frente, em notas de repúdio, decisões ou indecisões do STF, atos desgovernamentais. Enfim, lista interminável.

Um dos piores, agora, são os xarás indesejáveis, eufemismo pra vergonhosos. Imagine alguém que não é o Jair Bolsonaro se chamar Jair Bolsonaro. Não queira estar na pele dele, na função de chefia duma empresa. Coitado dele e dos funcionários. Pelas costas ou frente a frente, a situação é constrangedora. Ainda mais em reuniões convocadas por ele, em salas lotadas.

E se você for – vá lá – um ótimo síndico? Daqueles que há tempos é reeleito pelos méritos administrativos. Que todo mês faz o condomínio economizar grana, ter saldo positivo. Legal, né? Acontece que ele se chama Paulo Guedes. Sabe lá o que é viver suspeitando de risinhos e cochichos o dia inteiro? Até quando uma criança se dirige ao Seu Guedes é torturante. Às vezes, por vingança, tem vontade de causar prejuízo nas contas do prédio e foder os inquilinos. Mas não faz. Ele não é o Paulo Guedes do Planalto. É só um constrangido a mais.

Terrível também é o caso, por acaso, de um jardineiro batizado Ricardo Salles. Não importa a belezura dos gramados aos seus cuidados, dos canteiros primaveris 365 dias por ano. As podas corretas, que dão sobrevida às árvores. Azar dele: esse Ricardo Salles já morre de vergonha da sua motosserra, da tesoura, até o aparador o constrange. Já pensou em trocar de profissão, mas sabe que a primeira coisa que vão perguntar é: o que o senhor fazia antes, seu Salles?

Outra mortalmente constrangida é a professora Damares Alves, ainda mocinha, e por isso inconfundível com aquela outra que não para de constranger o país. Até 2019, essa Damares Alves era fessora querida, agora padece ao ir pra escola. Dar aulas virou aflição: às vezes porque, por coincidência, sentam próximos uma menina de rosa e um menino de azul. Ou mesmo ambos de azul. Ou quando uma criança traz de lanche uma goiaba. Ou, horror, horror, quando a diretora sugeriu que passe a dar aulas de educação sexual.

Os constrangimentos não cessam. Perguntem aos xarás por toda parte: ao Eduardo Pazuello, agente funerário; ao vigia Augusto Heleno, ao RP Ernesto Araújo, ao estudante de direito André Mendonça, ou a algum árbitro de futebol que atenda por Gilmar Mendes. Sem falar em tantos que trocaram de nome só pra poder andar de cabeça erguida.

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