EDUCAÇÃO

Surgem casos covid-19 entre professores após primeiros encontros presenciais

Relatos de docentes que apresentaram sintomas após participarem de encontros preparatórios antes mesmo das aulas iniciarem começam a surgir nas escolas privadas gaúchas
Por Flavio Ilha / Publicado em 4 de março de 2021

Covid-19 cresce em escolas após primeiros encontros de professores

Forto: Reprodução/YouTube

Forto: Reprodução/YouTube

Foi logo depois do Carnaval da pandemia, na mesma semana: uma grande escola de Porto Alegre, já  organizando o retorno às aulas, convocou seus professores para uma jornada pedagógica presencial, onde foram debatidos os conteúdos para o ano letivo e o cronograma de volta dos alunos. Mais de 20 docentes estiveram no encontro, reunidos na mesma sala durante três dias seguidos. O saldo da reunião, duas semanas depois, é macabro: 11 professores testaram positivo para a covid-19 e tiveram de se afastar de suas atividades para tratar da doença.

Uma das professoras contaminadas, que conversou com a reportagem do Extra Classe sob a condição de anonimato, descreveu que precisou ir quatro vezes ao atendimento de emergência – numa delas para realizar uma tomografia torácica – devido aos sintomas provocados pela covid-19. “Não posso ter certeza de que me contaminei na escola. Mas quando fui às reuniões, não tinha sintoma algum. Os efeitos começaram a aparecer no segundo dia da jornada”, disse a docente, que dá aulas para crianças entre seis e sete anos de idade.

Justiça

No último domingo, 28, a Justiça acolheu pedido liminar do Sindicato dos Professores do Ensino Privado (Sinpro/RS), da Associação dos Pais e Mães pela Democracia e do Cpers-Sindicato e suspendeu o retorno das aulas presenciais em todo o Estado previstas para serem retomadas na segunda, dia 1º. Mesmo com bandeira preta em vigor desde a semana anterior, os alunos da Educação Infantil e dos dois primeiros anos do Ensino Fundamental retornariam ao modo presencial. A Procuradoria-Geral do Estado (PGE) recorreu da decisão.

Na madrugada desta quarta-feira, 3, o desembargador Antônio Vinícius Amaro da Silveira manteve o despacho de primeiro grau alegando que o reconhecimento de “situação extrema de risco à vida do cidadão” é incompatível com a adoção de medidas paliativas de flexibilização, pois no momento “é necessário considerar que o ritmo crescente das internações é reflexo direto do aumento da circulação do vírus, o que está gerando a maior taxa de contágio desde o início da pandemia”. A PGE levou a decisão ao Supremo Tribunal Federal, na última quarta-feira,3.

Disseminação do vírus

A disseminação do vírus pelo sistema de ensino, público e privado, não é bravata. A maioria das escolas reuniu seu corpo docente de forma presencial logo após o Carnaval e, com isso, a ajudou a disseminar a doença. Levantamento informal do Sinpro/RS apontou que houve mais de 40 casos de contaminação de professores em escolas particulares de Porto Alegre desde o final de novembro.

Numa escola privada da Capital, as jornadas pedagógicas também foram um vetor de transmissão do vírus. “A escola é um dos locais onde a transmissão é mais forte. Eu tive sintomas de uma gripe forte e precisei do atendimento de um cardiologista para minimizar os efeitos”, disse um professor que testou positivo logo depois das jornadas pedagógicas. Ele dá aulas para o quinto ano do Ensino Fundamental.

Medo da retomada

Em Uruguaiana, a mais de 600 quilômetros de Porto Alegre, uma professora com contratos no Estado e em escola particular testou positivo um dia antes da reapresentação nos seus locais de trabalho. “Não tive contato com colegas e nem com alunos, mas entrei em pânico quando soube que as aulas seriam retomadas. Não há como controlar a disseminação do vírus. Eu tive sintomas e fiz o teste, mas sei de colegas que foram contaminados, mas são assintomáticos. Como saber se as escolas, especialmente as estaduais, não testam ninguém?”, questiona.

Ela teve 30% dos pulmões afetados, mesmo sem sintomas graves. “As sequelas são horrorosas. Meu sistema cognitivo foi bem afetado, tenho frequentes lapsos de memória e fiquei muito desatenta. O médico me disse que devo retomar a normalidade apenas em três meses”, relatou a professora, que dá aulas de Português para o sexto e o sétimo anos do Ensino Fundamental. “Tenho muito medo de retornar às aulas presenciais”, disse.

Vacina

O diretor do Sinpro/RS Cássio Bessa afirmou que não há justificativa para o retorno das aulas presenciais no pior momento da pandemia no Estado e no país. “Não esperávamos outra decisão. O Judiciário tem sido muito sensato neste momento crucial da vida dos trabalhadores na educação do Brasil. O Sindicato, inclusive, já solicitou as autoridades do poder público e ao sindicato patronal que os professores sejam imunizados”, ressaltou.

Na segunda-feira, 1º, o governador Eduardo Leite (PSDB) assinou um ofício que será enviado ao ministro da Saúde, Eduardo Pazuello, para oficializar o pedido de antecipação para imunizar os professores da rede pública de ensino. O texto argumenta que o adiamento do retorno presencial às aulas representa o aumento do abandono e da evasão escolar, o crescimento do índice de distorção idade-série e perdas pedagógicas, entre outras consequências.

“É importante que tenhamos os profissionais da educação imunizados para dar a eles a tranquilidade que permita o retorno às aulas com serenidade. Precisamos avançar para criar essa consciência perante o governo federal”, destacou Leite. Se o cronograma apresentado pelo Ministério da Saúde for cumprido, a previsão é de que os professores comecem a ser vacinados em meados de maio.

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