Lideranças indígenas preparam mobilização contra aprovação do Marco Temporal
Foto: Cristina Ávila
O coordenador da Articulação dos Povos Indígenas da Região Sul (Arpin Sul) Kretã Kaingang relata que voltará com lideranças a Brasília no próximo dia 22, para o Levante pela Vida, que se espera ser o maior acampamento nacional indígena deste ano. Estão sendo esperados cerca de 2 mil guerreiros e guerreiras de todas as regiões do país, principalmente para acompanhar no dia 25 o julgamento pelo Supremo Tribunal Federal (STF) do Recurso Extraordinário (RE) 1.017.365. A expectativa dos indígenas é que o STF derrube a tese do “Marco Temporal”, defendido por ruralistas que pretendem fazer valer o argumento de que somente têm direito a terras os povos que as ocupavam ou as disputavam, física ou judicialmente, em 5 de outubro de 1988, data da promulgação da Constituição Federal.
“Não nascemos em 88”, diz Kretã Kaingang, que afirma que as lideranças indígenas atenderão ao chamamento da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib), da qual é coordenador regional pela Arpin Sul. Ele está desde a segunda-feira, 9, em um movimento de retomada de terras tradicionais na região metropolitana de Curitiba (PR) e ressalta “duas mortes bárbaras” de meninas indígenas nos últimos dias, da Kaingang Daiane Sales, 14 anos, da Terra Indígena Guarita, no Rio Grande do Sul, assassinada em 5 de agosto, e de Raissa da Silva Cabreira, de 11 anos, que na segunda-feira, 9, foi encontrada morta, jogada de uma pedreira desativada na aldeia Bororo, na Reserva Indígena Federal de Dourados (MS).
“Nossas mobilizações precisam continuar. Espero que os ministros do STF tenham noção do nosso sofrimento, em acampamentos nas lutas por retomadas de nossas terras e as violências que sofremos de invasores dentro de nossos territórios. Estamos reavaliando as nossas lutas e temos continuar na mesma pegada de junho. Agosto será novamente mês de luta”, afirma Kretã Kaingang.
Levante pela Vida
Inicialmente, o RE 1.017 foi um pedido de reintegração de posse movida pelo governo de Santa Catarina contra o povo Xokleng, referente à Terra Indígena Ibirama-La Klãnõ, mas em fevereiro de 2019, o STF reconheceu seu status de “repercussão geral”, o que significa que a decisão do dia 25 afetará todos os procedimentos demarcatórios de terras, tanto na gestão federal como em todas as instâncias. Essa é a principal expectativa das organizações indígenas em Brasília, mas também serão acompanhados os projetos de lei que tramitam no Congresso Nacional e ameaçam direitos garantidos pela Constituição Federal.
A expectativa é que o acampamento de agosto supere o de junho, em Brasília, segundo estima Eduardo Oliveira, secretário executivo do Conselho Indigenista Missionário (Cimi), um dos organizadores do que agora será denominado Levante pela Vida. O encontro em junho na capital federal foi Levante pela Terra. “Todas as regiões estão mobilizadas e os indígenas estão animados para vir a Brasília defender seus direitos, já que em 2020 não puderam sair das aldeias por causa da pandemia”.
Agora, com as duas doses das vacinas contra o covid-19, os indígenas estarão por menos tempo na Capital, “mas será uma semana intensa”. Eduardo Oliveira informa que eles terão agendas no Legislativo e no Judiciário. E ressalta as violências que se acirram nos territórios especialmente depois da posse de Jair Bolsonaro, que na segunda-feira, 9, foi denunciado pela Apib no Tribunal Penal Internacional de Haia, por crimes contra a humanidade e genocídio. Essa é a terceira denúncia apresentada contra ele no mesmo tribunal. Outras duas foram em 2020, pela Associação Brasileira de Juristas pela Democracia e, em 2019, pelo Coletivo de Advocacia em Direitos Humanos e a Comissão Arns.
Bombas e flores
Entre 8 e 28 de junho cerca de 900 índios permaneceram em Brasília, no acampamento Levante pela Terra, por onde passaram até 1.300 lideranças, guerreiros e guerreiras. No dia 16, enfrentaram bombas na sede da Funai e no dia 22 mais bombas na Câmara dos Deputados. Pelo menos cinco indígenas e policiais foram feridos. No dia seguinte em protesto contra a brutalidade como foram recebidos, as mulheres entregaram flores aos policiais