O Ministério Público Federal em São Paulo (MPF/SP) denunciou à Justiça de São Paulo, no dia 22 de agosto, três militares pela morte do jornalista e militante político Luiz Eduardo da Rocha Merlino, morto em 1971, durante o regime militar. Foram denunciados, por homicídio doloso qualificado, o coronel reformado Carlos Alberto Brilhante Ustra, o delegado da Polícia Civil Dirceu Gravina, que ainda está na ativa, e o servidor aposentado Aparecido Laertes Calandra. Também foi denunciado pelo MPF, por falsidade ideológica, o médico-legista Abeylard de Queiroz Orsini, que assinou os laudos sobre o óbito do militante. Merlino era integrante do Partido Operário Comunista quando foi preso, no dia 15 de julho de 1971, em Santos, e levado para a sede do Destacamento de Operações de Informações do Centro de Operações de Defesa Interna (DOI-Codi). Lá, ele foi torturado por cerca de 24 horas e morto quatro dias depois. Para a família de Merlino, o coronel reformado do Exército Carlos Alberto Brilhante Ustra foi quem ordenou as sessões de tortura que o levaram à morte. Ustra, Gravina e Calandra negam responsabilidade por torturas, mortes e desaparecimento de cadáveres em outros processos referentes a crimes da ditadura.
Ustra foi comandante do DOI-Codi em São Paulo, um dos maiores centros de repressão do período da ditadura militar – de 1964 a 1975. A família de Merlino moveu uma ação por danos morais contra Ustra. Na decisão de primeira instância, o coronel foi condenado a indenizar a família em R$ 100 mil por ter participado e comandado sessões de tortura que mataram o jornalista. A defesa de Ustra recorreu da ação, alegando que Merlino teria se atirado sob um carro durante tentativa de fuga. “Para tornar a história verossímil, Ustra mandou que um caminhão a serviço das forças de repressão passasse por cima do corpo de Merlino e deixasse marcas de pneus”, sustenta o MPF. No IML, médico-legista Abeylard Orsini endossou a versão de Ustra ao assinar o laudo sobre a morte e omitiu as agressões sofridas pelo jornalista nas sessões de tortura. O laudo de Orsini atestando morte por atropelamento a um corpo dilacerado pela tortura, já fora considerado inconsistente ao ser analisado por peritos na década de 1990.
CRIMES CONTRA A HUMANIDADE – Além da condenação dos denunciados, o MPF quer também que eles percam seus cargos públicos ou suas aposentadorias e que suas penas sejam aumentadas por uma série de agravantes: motivo torpe para a morte, emprego de tortura, abuso de poder e prática de crime para ocultação e impunidade de outro. O advogado Paulo Esteves, que defende Ustra, afirmou que, caso a Justiça aceite a denúncia do MPF contra seu cliente, fará a defesa com base na Lei da Anistia. No entendimento dos procuradores, no entanto, não cabe o argumento de prescrição ou recorrer à anistia neste caso. “Os delitos foram cometidos em contexto de ataque sistemático e generalizado à população, em razão da ditadura militar, com pleno conhecimento do ataque, o que os qualifica como crimes contra a humanidade, portanto, imprescritíveis e impassíveis de anistia.” Na denúncia, o MPF ressalta uma decisão da Corte Interamericana de Direitos Humanos, que determinou que o Brasil puna os crimes cometidos no período.