Agricultura ecológica e a valorização do todo
É cada vez mais crescente o número de famílias que adotam a agroecologia, sistema pelo qual plantam-se culturas sem as sementes alteradas geneticamente (transgênicas) e sem o uso de adubo químico e agrotóxicos. A produção agroecológica ainda é incipiente no Estado e no Brasil, dada à cultura tradicional predominante que valoriza o sistema convencional. Entretanto, paralelo ao crescimento da produção, amplia-se também o trabalho de educação e conscientização.
Mesmo que acompanhe esse tipo de experiências há alguns anos, a partir de 1999 a Associação Rio-Grandense de Empreendimento de Assistência Técnica e Extensão Rural (Emater) passou a fazer um esforço no sentido de rever valores objetivos, tendo como foco a transição, com uma definição clara de público, como famílias de pequenos agricultores, assentamentos, colônias de pescadores e grupos indígenas.
Este esforço, segundo o engenheiro agrônomo e assessor técnico da Emater, Gervásio Paulus, inclui programas de formação de técnicos, mesmo os que atuam em áreas sociais, tendo como foco a educação de produtores para a produção agroecológica. “O que se quer é mudar a matriz de produção”, enfatiza Paulus.
A partir de então, a Emater passou a assistir famílias em todo o Estado visando à agroecologia. A empresa não tem computado o número de produtores que já adotaram o sistema da agroecologia. Gervásio Paulus calcula que sejam em torno de mil famílias, algumas ainda iniciando o processo, enquanto outras em níveis mais adiantados na instituição da agroindústria ou já comercializando seus produtos, por intermédio das feiras agroecológicas.
O Pró-Guaíba, programa que visa à recuperação da Bacia do Guaíba, pretende ir além das mil famílias. Com o trabalho de proteção ao ambiente, o projeto objetiva chegar, ao final de 2000, com cinco mil famílias em torno da bacia conscientizadas sobre os benefícios da agroecologia.
A experiência da agroecologia disseminou-se por vários pontos do estado. Em Sobradinho, já existem associações de hortigranjeiros, semelhantes a produções existentes nas regiões do Alto Uruguai, Noroeste e Serrana. Na Região Metropolitana, são os assentamentos de agricultores que difundem a agroecologia. Segundo Edson Cadore, que trabalha com esta área dentro do Movimento dos Sem-Terra, já há vários anos os produtores dos assentamentos têm essa preocupação com a produção agroecológica, quando se começou a trabalhar com o plantio de hortaliças sem adubo químico e livres de agrotóxicos.
Não apenas na Região Metropolitana, mas também nas dez regiões de assentados do estado, ainda existe o sistema convencional, mas há orientação de se caminhar para a agroecologia. “Isso leva tempo” afirma Cadore. “É preciso uma mudança cultural e um processo de capacitação e aprendizagem.”
Nos assentamentos da Grande Porto Alegre (Eldorado do Sul, Nova Santa Rita, Charqueadas, Guaíba e Capela de Santana, para citar alguns), a produção de hortaliças chegou a estar em 100% pelo sistema da agroecologia, depois de três anos quando começou a ser adotada, enquanto que a de arroz ainda é de 50% e leite não ultrapassa 10%. Na última colheita de arroz, no bimestre março/abril, obteve-se na Região Metropolitana a quantia de 100 mil sacas de arroz plantados dentro da agroecologia.
O crescimento do uso da agroecologia deve-se também ao aumento do número de consumidores que procuram este tipo de produto. Para Gladimir Ramos de Souza, produtor do assentamento de Nova Santa Rita, o consumidor começa a tomar consciência da preservação da própria saúde e, portanto, procura produtos mais naturais.
Segundo Paulus, estima-se que em torno de R$ 3 milhões são comercializados anualmente dentro da agroecologia. Surgiram nos últimos anos feiras no Rio Grande do Sul que dão vazão aos produtos agroecológicos. Ao todo, são 60 feiras em todo o Estado. Na Capital, o consumidor conta com pelo menos três grandes feiras agroecológicas. Uma delas fica no pátio da Secretaria da Agricultura, no bairro Menino Deus, outra na Rua José Bonifácio, bairro Bom Fim e a terceira, no bairro Floresta.
Paulus diz que o trabalho em agroecologia não tem apenas a preocupação técnico-produtiva, voltada para garantir a fatia de mercado que se abre. A preocupação é também com a qualidade de vida, com a organização do agricultor e a preservação ambiental.
Dentro dos assentamentos, conforme explica Edson Cadore, a agroecologia passa a ser desenvolvida considerando-se quatro eixos: o resgate da cultura antiga da agropecuária, evitar a agressão à natureza, tornar a agricultura viável economicamente, além de se considerar o procedimento socialmente justo, pois garante a permanência do homem no campo. “A agroecologia valoriza não só o homem, como faz a agricultura convencional, mas também a mulher e a família como um todo”, observa o técnico do MST.