Unidades de Triagem de resíduos recicláveis enfrentam situação de penúria
Foto: Igor Sperotto
As Unidades de Triagem (UTs) de resíduos recicláveis de Porto Alegre, onde funcionam as cooperativas criadas para fazer a separação dos resíduos, estão sucateadas e enfrentam diversas dificuldades. A maior parte das UTs tem mais de 30 anos de atividade.
De acordo com o site da prefeitura, cada unidade recebe R$ 5.400,00 por mês para pagar despesas ordinárias, como água, luz, contabilidade etc.
Enquanto isso, o Departamento Municipal de Limpeza Urbana (DMLU) envia aproximadamente 1.574 toneladas por dia de resíduos para o aterro, em Minas do Leão, a 100km da Capital.
Desse total, cerca de 16 toneladas/dia são de rejeitos das UTs. Isso representa um gasto de R$ 2.800 milhões por mês em transporte e transbordo e R$ 4.600 milhões por mês para disposição final no aterro sanitário (valores referentes a setembro de 2023), conforme dados fornecidos pela assessoria de imprensa do órgão.
Atualmente, 17 UTs têm contrato para receber os resíduos recolhidos pela Cootravipa.
“As UTs recebem pelos contratos, que não cobrem a manutenção. É muito cara,” argumenta Simone Pinheiro, assistente social, que presta assessoria para três associações e uma cooperativa de catadores, vinculadas à prefeitura.
A situação mais dramática é da UT da Zona Norte, localizada ao lado da Avenida Severo Dulius, no Sarandi. A Cooperativa de Trabalho Socioambiental Mãos Unidas opera em um terreno que ficou abaixo do nível da avenida, construída depois da existência da UT.
O terreno fica completamente alagado não só pela chuva, mas pelo chorume que escorre do aterro, contou o responsável Josué Moreira. Diversas vezes o caminhão da coleta seletiva atolou no local. Os resíduos que ficam na rua não podem ser triados. E os catadores não conseguem chegar até o local do trabalho.
Foto: Igor Sperotto
Há problemas também em outros galpões
Na Associação de Catadores da Padre Cacique, na Restinga, uma das UTs com estrutura mais nova construída pela prefeitura, em operação desde 2015, no piso onde ficava o cesto para resíduos abriu um buraco de quatro metros quadrados.
“O piso está todo oco, o terreno alaga dias de chuva, o próprio galpão está com problemas estruturais e o telhado tem muita goteira, além da falta de rede de esgoto,” conta Daniel Mesquita, presidente da associação.
Em outras Unidades, os cestos, onde os materiais são depositados, estão rasgados, há telhas quebradas, estruturas de madeira avariadas, falta de redes de água e esgoto, entre outros problemas.
“Tem estruturas de madeira que correm o risco de cair em cima da cabeça de alguma pessoa,” alerta Simone Pinheiro.
A gestora ambiental Joice Pinho Maciel, da Apoena, que trabalha para oito organizações, destaca a importância do serviço que as UTs prestam à comunidade. Elas evitam que sejam enviados para o aterro de Minas do Leão uma média de 53 toneladas por dia de materiais reciclados, conforme dados deste ano do DMLU.
“Por que não investir mais nas UTs, em educação ambiental para se gastar menos com o transporte e a destinação final?,” indaga a doutora em engenharia civil.
Conforme dados da assessoria de comunicação do DMLU, o departamento envia uma média de 58 toneladas/dia de resíduo seletivo às Unidades. E de setembro de 2022 a agosto de 2023, foram removidos 101 contêineres de 5 metros cúbicos e 195 contêineres de 26 metros cúbicos com rejeito das UTs para destinação ao aterro sanitário.
Em número de viagens, considerando que o veículo que coleta contêineres é de 5 metros cúbicos transporta duas caixas, a média mensal é de 245 viagens só com rejeitos das unidades de reciclagem.
Desvalorização do material reciclado
Para complicar mais a situação, as cooperativas estão perdendo mão de obra.
Na Associação Padre Cacique, por exemplo, que já teve 30 pessoas trabalhando, hoje conta com apenas sete. Atualmente, um trabalhador de UT recebe R$ 600,00 por mês. Esse valor é menor que pouco tempos atrás, onde se obtinha mais que um salário mínimo.
Por questões de mercado, a indústria acaba comprando matéria-prima virgem, ao invés da reciclada.
Em Porto Alegre, a PET transparente, por exemplo, que chegou a ser vendida por R$ 4,50 o quilo, hoje pagam R$ 2,10. O papel misto, de R$ 0,40 o quilo hoje vale R$ 0,13. E o quilo do vidro, então, recebe-se só R$ 0,5 o quilo.
Foto: Igor Sperotto
Foto: Igor Sperotto
O que dizem MP e prefeitura
A promotora de Justiça do meio ambiente de Porto Alegre, Annelise Steigleder diz que negocia com o município caso a caso a situação das UTs.
“O município tem contratos com as cooperativas, que podem ser rescindidos e esses catadores ficarem na mão. Temos chamado o DMLU para que atendam às demandas pontuais das cooperativas. Também temos trabalhado na revisão dos contratos para que aumente a remuneração dos catadores. É um trabalho de formiguinha que tenho feito há bastante tempo”.
Já o DMLU respondeu que “a relação do DMLU com as Unidades de Triagem é comercial, cabe ao DMLU entregar o resíduo seletivo e recolher o rejeito. A administração, apoio social e a relação do governo com as UTs é de responsabilidade da Secretaria Municipal de Desenvolvimento Social”.
A SMDS informou à reportagem que está realizando um diagnóstico para identificação dos danos e que providenciará um auxilio emergencial para as UTs que sofreram impactos diretos em sua produção em função das chuvas.
Campanha emergencial para socorrer unidades
Foto: Igor Sperotto
Devido à urgência da situação das unidades, integrantes do grupo de resíduos do coletivo POA Inquieta, tiveram a iniciativa de atender às demandas emergenciais das UTs.
A campanha de Apoio à Reciclagem – Por melhores condições nas Unidades de Triagem conseguiu levantar cerca de R$ 2.500,00. Até o momento, os recursos foram enviados para bombear a água do entorno da UT da Zona Norte por duas vezes, para consertar o telhado da UT Frederico Mentz e ajudar no conserto de uma prensa da UT Cavalhada.
A campanha segue até o próximo dia 29 de outubro.