Reunião de ministros no RS sinaliza criação de órgão para prevenir enchentes
Foto: Presidência da República/ Divulgação
Uma reunião do governo federal com o vice-governador do Rio Grande do Sul, Gabriel Souza (MDB), parlamentares e cerca de 20 especialistas, no dia 29 de maio, para discutir a calamidade provocada pelas enchentes no estado não foi só histórica pela presença de cinco ministros do governo Lula. O encontro explicitou os fatos, ações e omissões que podem explicar em boa parte a tragédia.
Para o engenheiro Vicente Rauber, ex-diretor do Departamento de Esgotos Pluviais (DEP) de Porto Alegre, compromissos foram assumidos em torno do que chama de “dois patinhos feios” das políticas públicas, saneamento e manutenção. Entre os compromissos, a criação de um órgão para prevenir o estados de outras calamidades hídricas.
Rauber, que se tornou referência para técnicos e engenheiros que denunciaram a falta de manutenção do sistema de proteção contra enchentes da capital gaúcha como determinante para a inundação que chegou a tirar de operação o Aeroporto Internacional Salgado Filho, ressalta do alto de sua experiência que o encontro foi “algo nunca imaginado”, pelo menos em nível nacional.
Não é de hoje que analistas dizem que políticos dão preferência a obras que saltam aos olhos da população. Enterrar canos e dar a devida manutenção aos sistemas de saneamento seriam, para Rauber, os “patinhos feios” exatamente por essa falta de visibilidade.
A extinção e incorporação ao Departamento Municipal de Água e Esgotos de Porto Alegre, o Dmae, do DEP, no governo do prefeito Nelson Marchezan Júnior (PSDB) seguiu essa lógica, entende Rauber.
Um novo antigo órgão
Algo que a tragédia gaúcha aponta para uma revisão. Segundo o engenheiro, apesar da relutância do governador Eduardo Leite (PSDB), a criação de um órgão estadual para assumir a gestão de um sistema integrado de prevenção a desastres e proteção contra enchentes dos rios deverá acontecer.
A ideia integra a série de propostas de técnicos em saneamento que foi encampado pelo ministro da Casa Civil do governo Lula, Rui Costa (PT).
“Uma espécie de Corsan-Drenagem Urbana e Proteção contra Inundações”, diz Rauber ao lembrar a empresa de saneamento privatizada no governo Leite.
“Eu acho até que se deveria criar um órgão federal”, opina Rauber diante da frequência cada vez mais intensa de calamidades em várias regiões do país como a que vitimou os gaúchos.
Como o saneamento pela Constituição é responsabilidade dos municípios, o engenheiro entende também que, “ao ter a caneta”, esses entes federativos também deveriam ter em sua estrutura permanente uma área para drenagem e proteção contra enchentes que agisse em sinergia de forma nacional.
O estado visto como um todo
Foto: Acervo Pessoal
Para Rauber, o encontro ainda revelou que o governo federal está trabalhando para ver o Rio Grande do Sul como um todo, importante recomendação feita pelos técnicos que há anos alertam possibilidades de catástrofes como as que tem ocorrido nos últimos meses.
“Para enfrentar parte dos problemas da região metropolitana, já tem um plano pronto da Metroplan. Ele pega as bacias do Sinos, Gravataí e uma bacia importante, que a cada chuva alaga bastante, do Arroio Feijó que divide Porto Alegre de Alvorada e não está integrado no nosso sistema de proteção (Porto Alegre)”, relata o engenheiro.
Já as bacias do Jacuí, do Caí, devem ser o que Rauber chama de fase 2. Essa fase pegará a parte sul de Porto Alegre até municípios como São Sebastião do Caí que, “agora, eu nem sabia, também faz parte da região metropolitana e alaga toda vez que chove”, explica. Assim, se fecha a proteção as demais áreas ainda não contempladas do Guaíba, completa Rauber.
Ao mesmo tempo, deve ocorrer estudos que envolvam a Lagoa dos Patos, Rio Grande e seu porto, Pelotas, São Lourenço, Tapes, Barra do Ribeiro, Guaíba e a séria situação do rio das Antas.
“Ele é afluente do Taquari e o Taquari é afluente do Jacuí. Não preciso nem lembrar o que que aconteceu por lá, na região do Alto Taquari. Foi a terceira catástrofe que eles enfrentam em oito meses”, ressalta Rauber.
Custo das enchentes
Tudo em relação às enchentes, segundo ele, está sendo visto pelo governo federal que ainda, entende, não consegue dimensionar os valores que deverão ser investidos. “Tem que se tomar conta dos projetos, dos estudos, para quantificar e, depois, anunciar”, resume.
Uma coisa, Rauber tem certeza: Bilhões poderão ser liberados e, desta vez, como resumiu, de forma histórica. “Eu não aceito a expressão novo normal. Eu só aceito se for um novo normal sustentável. Nós temos que recuperar a natureza. Então, medidas preventivas, cuidar melhor do lixo, com reciclagem e tudo mais. Não atirar lixo nos arroios. Não deixar terra nua. Terra nua é uma palavra muito feia”, conclui ao lembrar o programa Arroio não é valão, criado na época em que dirigiu o DEP e rendeu vários prêmios internacionais a prefeitura então comandada por Olívio Dutra (PT).
No último dia 29, os ministros do governo Lula, Rui Costa (Casa Civil), Paulo Pimenta (Secretaria Extraordinária para Apoio ao Rio Grande do Sul), Jader Filho (Cidades) Nísia Trindade (Saúde) e Waldez Góes (Integração Nacional) e importantes técnicos como do Tesouro Nacional estiveram no Rio Grande do Sul para reuniões e anúncios de medidas.