AMBIENTE

Ambientalistas questionam sustentabilidade da “República da Soja”

Coalizão pelo Pampa publicou carta aberta rebatendo um recente estudo do Serasa Experian que sugere expansão para o plantio da soja de até 36,6 milhões de hectares em quatro biomas brasileiros
Por César Fraga / Publicado em 24 de julho de 2024

Ambientalistas questionam sustentabilidade da República da Soja

Foto: Marcelo Camargo: Agência Brasil

Foto: Marcelo Camargo: Agência Brasil

Uma carta assinada por 19 associações e grupos de atuação socioambiental do Rio Grande do Sul, que juntas compõem a Coalizão pelo Pampa, publicaram uma carta aberta rebatendo um recente estudo do Serasa Experian, que sugere expansão para o plantio da soja de até 36,6 milhões de hectares em quatro biomas brasileiros: Amazônia, Cerrado, Mata Atlântica e Pampa. A carta foi escrita e revisada por vários cientistas e ambientalistas.

Em tese, o estudo de aptidão agrícola propõe que a monocultura da soja avance sobre pastagens aptas para o grão e em linha com as exigências crescentes dos mercados consumidores por “produtos livres de desmatamento”.

“Tentamos mostrar que o estudo da Serasa Experian computa na expansão possível de soja ‘sustentável’ os campos nativos dos biomas brasileiros que são ecossitemas naturais com proteção legal, e mais importante, geradores de serviços ambientais e ricos em biodiversidade como as florestas”, explica Rodrigo Dutra, Mestre em Ecologia, membro da Coalizão pelo Pampa pela Associação dos Servidores do Ibama (Ibama).

Segundo ele, o conceito de sustentabilidade apregoado pela Serasa Experian não é “tão sustentável assim” .

“Alegam não derrubar árvores, não desmatar, mas isso não basta. A natureza que presta serviços ambientais não é só árvores”, rebate.

Questionado pelo Extra Classe se existe uma falácia de pseudossustentabilidade amparada em lei, Dutra é enfático: “teoricamente sim, os campos realmente são menos protegidos, e ainda se tem a tentativa de considerá-los todos como área rural consolidada para tirar toda a proteção legal”.

O movimento Coalisão pelo Pampa iniciou em 2021 e, segundo os ambientalistas, a carta pretende questionar o conceito de sustentabilidade apregoado pelo que chamam de “República da Soja” e fazer um alerta para o ritmo acelerado de destruição dos biomas dos campos nativos do sul.

O carta aberta foi já foi apresentada pelos ambientalistas na Assembleia Legislativa do Estado do Rio Grande do Sul, no começo deste mês, e propõe uma série de diretrizes e ações para o uso sustentável e de conservação do Pampa para servir de referência aos poderes executivo, legislativo e judiciário.

A carta aberta destaca que proposta da Serasa Experian de expansão do cultivo de soja nas áreas classificadas como “pastagens” suscita grande preocupação ao ignorar o fato de que incluem campos nativos que constituem remanescentes de vegetação nativa cujo uso e exploração são regrados por uma série de normas legais, com destaque para a Lei federal n° 12.651/2012 – Lei de Proteção da Vegetação Nativa e da Lei federal n° 11.428/2006 da Mata Atlântica.

De acordo com os cientistas, o estudo se baseia em um entendimento desatualizado que, incorretamente, reconhece valor somente às florestas, negligenciando as formações naturais não florestais do Brasil2, tais como os campos nativos presentes em todos os biomas avaliados – Pampa, Mata Atlântica (campos de altitude), Amazônia (lavrados) e Cerrado (campos limpos e sujos). Utiliza, assim, de um pressuposto equivocado ao considerar como aptas à conversão agrícola campos nativos usados como pastagens naturais, os quais estão sujeitos às limitações legais à supressão.

“Não há como se tratar da mesma forma pastagens cultivadas e campos nativos. Os campos nativos são ecossistemas de ocorrência natural nos biomas, com flora e fauna típicas. Mesmo quando utilizados para pecuária extensiva, não perdem suas características de formações naturais. Também, o eventual uso do fogo não descaracteriza os campos nativos, podendo ser inclusive um fator de distúrbio inerente a esses ecossistemas”, diz o documento.

Leia a carta na íntegra.

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