Política de Economia Circular aguarda criação de comissão desde março na Câmara dos Deputados
Foto: Sindirecicle/MT/Reprodução
Aprovada em regime de urgência no plenário do Senado e enviado à Câmara dos Deputados em abril, o Projeto de Lei (PL) 1874/22 que Institui a Política Nacional de Economia Circular (PNEC) propõe uma alternativa ao atual modelo de produção e consumo insustentável.
Há quase cinco meses enredado na burocracia da Câmara, que tem como presidente o advogado, pecuarista e empresário Arthur Lira (PP/AL), o projeto de autoria da Comissão de Meio Ambiente do Senado, sob a presidência do Jaques Wagner (PT/BA), depende da criação de uma comissão para ir a plenário. Ocorre que essa etapa simplesmente não é cumprida
Em uma realidade impactada pela produção e o consumo irracionais que comprometem a saúde e o meio ambiente, a Economia Circular promove um modelo de desenvolvimento sustentável, que reduz o desperdício, conserva recursos naturais e minimiza a poluição.
Especialistas apontam na Economia Circular um caminho viável para desenvolvimento econômico com proteção e preservação ambiental que diminui emissões de CO2 que produzem o efeito estufa.
Somente anexado a outras proposições similares para discussão e votação conjunta, o projeto 1874/22 completou quatro meses no último dia 8, aguardando a criação da comissão temporária para discutir a temática pela mesa diretora da Câmara.
Tudo pronto, mas empacado
“Minha avaliação é de que está tudo pronto para ir à votação”, diz Luisa Santiago. Ela é responsável no Brasil pela Ellen MacArthur Foundation, ONG que trabalha com empresas, governos e instituições para redesenhar sistemas de produção e consumo com o objetivo de reutilizar recursos e minimizar o desperdício.
Luisa acompanha debates sobre Economia Circular há mais de 10 anos e destaca que o texto do PL foi construído através de muito diálogo e alcançou consenso entre diferentes setores da sociedade, incluindo a indústria e ONGs.
O PL 1874/22 foi aprovado pelo Senado no dia 19 de março de 2024. No dia 21 do mesmo mês ele foi encaminhado para a Câmara dos deputados e desde 8 de abril aguarda com outros projetos similares a criação da Comissão Temporária para dar continuidade ao seu trâmite.
A proposição, além de criar a PNEC, também institui os selos Produto Sustentável e Serviço Sustentável para a atividade econômica com desempenho ambiental superior.
“Gosto de destacar que o texto atual agregou governo e oposição tanto no senado como o que se está vendo no processo na Câmara e isso, nos dias atuais, é algo singular: uma pauta que transcende a polarização do Congresso”, relata a ativista. Na Câmara, ela lembra que parlamentares de partidos de matizes ideológicas diferentes requisitaram que a pauta fosse colocada em regime de urgência como no Senado.
Interesses em jogo?
Apesar de entender que há um momento político favorável e prioridade para o tema no Governo Lula e em espaços multilaterais, Luisa vê imprevisibilidade sobre o momento de votação da pauta.
“Penso que a Câmara tem suas complexidades políticas. Também houve competição com agendas prioritárias para o Governo, a reforma tributária, por exemplo, e pautas bomba da oposição que deram vagarosidade ao processo”, fala.
Para Francisco Milanez, diretor técnico e científico da Associação Gaúcha de Proteção ao Ambiente Natural (Agapan) a falta de urgência na votação na Câmara indica que não há real interesse em aprovar a medida.
“Muitos apoiam publicamente por ser popular, porque é demagogicamente legal se manifestar a favor de uma coisa que tá na moda, mas, se houvesse compromisso genuíno, já teria sido votada com urgência. Além disso, os deputados parecem estar querendo ver se não estão ofendendo interesses, sabe quais são, de seus apoiadores. Se não houvesse esse receio, a votação já estava votado há muito tempo”, fulmina.
O que é
Infográfico: Agência Senado
Infográfico: Agência Senado
O modelo baseia-se em três pilares fundamentais. O primeiro é a eliminação de resíduos e poluição desde o início do processo produtivo. A ideia é que produtos sejam projetados de maneira a minimizar desperdícios, utilizando materiais recicláveis ou biodegradáveis para reduzir o impacto ambiental desde a origem.
O segundo princípio é a manutenção de produtos e materiais em uso pelo maior tempo possível. A Economia Circular incentiva práticas como o reparo, a reutilização, a remanufatura e a reciclagem, prolongando a vida útil de bens e materiais ao invés de destiná-los ao descarte após um único uso.
Por fim, o modelo busca a regeneração dos sistemas naturais. Isso inclui a adoção de práticas agrícolas que restauram o solo e o uso de tecnologias que diminuem a dependência de recursos não renováveis, promovendo a regeneração dos recursos naturais de forma contínua.
A adoção da Economia Circular não apenas visa a conservação dos recursos naturais, mas também se apresenta como uma estratégia para reduzir o impacto ambiental e promover um crescimento econômico mais adaptado e inclusivo. No longo prazo, o modelo quer garantir que os sistemas produtivos e de consumo sejam sustentáveis, preservem o meio ambiente e fomentem uma economia mais justa e equilibrada.
Governo sai na frente
O governo federal lançou em 27 de junho a Estratégia Nacional de Economia Circular (ENEC) durante reunião do Conselho de Desenvolvimento Econômico Social Sustentável. No mesmo ato também foi criado o Fórum Nacional de Economia Circular que elaborará um plano nacional para implementar o modelo no Brasil.
Coordenada pelo Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços (MDIC), a ENEC promove a transição do modelo de produção linear para uma economia circular com a meta de eliminar poluição e reduzir a geração de resíduos.
O vice-presidente da República e titular do MDIC, Geraldo Alckmin (PSB), afirmou na ocasião que a iniciativa representa um avanço rumo à neoindustrialização e promove uma indústria inovadora, sustentável e responsável. A estratégia inclui diretrizes como eliminação de resíduos, manutenção do valor dos produtos e regeneração dos sistemas naturais.