AMBIENTE

Brasil em chamas: incêndio atinge terras indígenas no Xingu

Queimadas iniciadas em agosto fogem do controle e se estendem por mais de 30 quilômetros em São José do Xingu e São Félix do Araguaia, no Mato Grosso
Por Gilson Camargo / Publicado em 13 de setembro de 2024
Brasil em chamas_incêndio atinge terras indígenas no Xingu

Foto: Takumã Kuikuro/ Divulgação

Aldeia da etnia Kuikuro, localizada no Alto Xingu, a região do parque mais pressionada pelo agronegócio: as queimadas feitas nas fazendas do entorno desde 17 de agosto fugiram do controle e chegaram no interior da reserva

Foto: Takumã Kuikuro/ Divulgação

Uma extensa coluna de fogo atingiu as Terras Indígenas Capoto e o Parque Indígena do Xingu, entre os municípios de São José do Xingu e São Félix do Araguaia, na região entre o norte do Mato Grosso e o sul do Pará, a cerca de mil quilômetros de Cuiabá.

Os focos de incêndios vêm sendo combaidos na região desde 17 de agosto mas, na noite de quinta-feira, assumiram uma proporção alarmante ao se transformarem em um incêndio de grandes proporções. O fogo devastou a área rural e se aproxima das aldeias. Maior parque indígena do mundo, o Xingu foi criado por decreto federal em 1961 e abriga em cerca de 2,7 mil hectares os povos das 16 etnias remanescentes dos indígenas do país.

Uma barreira de fogo e fumaça se aproxima das aldeias, de acordo com alerta das lideranças indígenas do Xingu.

Nas Terras Indígenas Utiariti e Paresina, na região de Campo Novo do Parecis e Tangará da Serra, os incêndios já persistem por mais de um mês, tendo devastando 200 mil hectares.

Mais de mil brigadistas da Defesa Civil e do Corpo de Bombeiros do Mato Grosso estão atuando no combate às chamas, que já consumiram residências e lavouras e avançam sobre a floresta.

De acordo com a prefeitura de São José do Xingu, o fogo se estende por uma faixa entre 20 e 30 quilômetros. De acordo com a Federação dos Povos e Organização Indígenas do Mato Grosso (Fepoimt), mais da metade das terras indígenas da região já foram atingidas pelo fogo.

O estado tem 86 terras indígenas e 46 povos assentados na Amazônia, Cerrado e Pantanal.

O Mato Grosso tem a maior concentração de queimadas do país desde janeiro, com mais de 37 mil focos de incêndio, de acordo com o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE).

Em agosto foram 1,6 milhão de hectares atingidos e devastados pelo fogo. No incío de setembro, o governo federal reconheceu situação de emergência em 58 municípios.

Segundo o INPE, os focos de queimadas na Amazônia aumentaram 48% nos últimos meses em comparação ao mesmo período do ano anterior. Só em agosto, foram mais de 8 mil focos ativos de incêndio, com destaque para os estados do Pará, Mato Grosso e Rondônia, onde grandes áreas de floresta deram lugar ao fogo. No Cerrado, outra região altamente afetada, as queimadas cresceram 60%, intensificando o impacto ambiental.

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Foto: Rogerio Florentino / Greenpeace/ Divulgação

Filhote de anta órfão, resgatado com as patas queimadas em uma área queimada, recebe atendimento no Aquário Natural, em Bonito, no Mato Grosso do Sul

Foto: Rogerio Florentino / Greenpeace/ Divulgação

Esses números revelam que o Brasil vive uma das piores temporadas de incêndios das últimas décadas, agravada por uma combinação de seca extrema e ações humanas deliberadas.

A maior parte das queimadas tem origem no desmatamento ilegal, impulsionado pela expansão desenfreada do agronegócio. Grandes latifundiários e empresários ligados ao setor utilizam o fogo como ferramenta para abrir novas áreas para plantio e pastagem, especialmente em regiões de floresta e cerrado.

A prática, embora ilegal, é recorrente e conhecida pelas autoridades. O lobby do agronegócio exerce forte influência política contra a fiscalização e a responsabilização de autores dos incêndios criminosos.

A expansão das áreas de cultivo, sobretudo de soja e milho, e o avanço da pecuária em áreas protegidas têm sido apontados como os principais motores do desmatamento, com o uso do fogo como método barato e eficiente de limpeza de terra.

“A estrutura de fiscalização no Brasil tem sido incapaz de conter esse avanço. Órgãos como o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) e o Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) enfrentam cortes orçamentários e limitações na sua capacidade de atuação”, denunciou o Mídia Ninja.

“A lentidão dos processos judiciais e a falta de prioridade na punição aos crimes ambientais fazem com que a impunidade prevaleça. Latifundiários que financiam a destruição ambiental frequentemente recorrem ao poder econômico e a conexões políticas para proteger seus interesses”, conclui.

São Paulo

Pelo menos 13 municípios de São Paulo têm áreas de mata em chamas, segundo a Defesa Civil do estado. Tanto o órgão quanto o Corpo de Bombeiros atuam nesses locais para conter o fogo, e em regiões mais críticas estão em operação 11 aeronaves para apoiar o combate aos incêndios.

Os municípios que contam com esse suporte são: Mairiporã (Parque Cantareira); Bananal; São Luiz do Paraitinga; Bom Jesus dos Perdões (Parque Itapetinga); Campinas (Pico das Cabras); Campo Limpo Paulista/Jundiaí (Serra da Mursa); São Carlos; e Pedregulho. “O combate aos incêndios segue de forma coordenada, com as aeronaves desempenhando um papel fundamental no controle das áreas mais afetadas”, destacou a Defesa Civil.

Segundo a Secretaria Estadual de Meio Ambiente, Infraestrutura e Logística (Semil), as 81 unidades de conservação do estado que estão fechadas desde o dia 1º para proteger a população e manter foco total na prevenção a incêndios nessas áreas de preservação continuarão sem funcionar. Apenas os parques estaduais Campos do Jordão e Cantareira estarão parcialmente abertos, nas áreas concessionadas, desde que não haja risco aos visitantes.

“Durante esse período, todas as equipes que trabalham nas Unidades de Conservação continuarão a se dedicar exclusivamente ao monitoramento territorial, combate a incêndios, sensibilização das comunidades dos entornos e apoios administrativos e logísticos”, informou a secretaria.

“Diante da persistência das condições climáticas, que favorecem a ocorrência de incêndios, tomamos a decisão de prorrogar o fechamento dos parques estaduais. Essa medida, embora temporária, é fundamental para proteger a biodiversidade e garantir a segurança de todos. Nossos profissionais continuam atuando incansavelmente no combate a possíveis focos incêndios e na proteção das áreas fechadas”, destacou o diretor executivo da Fundação Florestal, Rodrigo Levkovicz.

Investigação

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Foto: Marizilda Cruppe/ Greenpeace/ Divulgação

Em sobrevoo na Amazônia, o Greenpeace flagrou queimadas “financiadas com crédito rural”

Foto: Marizilda Cruppe/ Greenpeace/ Divulgação

O Ministério Público Federal (MPF) informou a abertura de mais de 190 procedimentos de investigação envolvendo incêndios florestais e queimadas entre 2023 e 2024. Os dados foram apresentados durante encontro da Comissão de Meio Ambiente do Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP), que reuniu promotores para avaliar o trabalho da instituição no enfretamento às mudanças climáticas no país.

De acordo com o levantamento, foram abertos 164 procedimentos extrajudiciais e 34 inquéritos policiais para investigar casos de queimadas irregulares.

Entre as ações propostas, está a liminar na qual o MPF em Rondônia cobra do governo federal a contratação de 450 brigadistas, a compra de equipamentos de proteção individual (EPIs) e de viaturas para combater o fogo.

Na terça-feira, 10, o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Flávio Dino determinou medidas para o enfrentamento às queimadas na Amazônia e no Pantanal.

Pela decisão, o governo federal deverá convocar mais bombeiros militares para compor o efetivo da Força Nacional que combate os incêndios nas regiões. Os novos integrantes deverão ser oriundos dos estados que não foram atingidos pelos incêndios.

A Polícia Rodoviária Federal (PRF) também deverá ampliar o efetivo de fiscalização nas rodovias da região.

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