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Foto: Fábio Rebelo/Divulgação
“Um mercado onde cada época pode ver sua própria insensatez”. Esta afirmação está na peça de teatro O mercado de notícias (The Staple of news), escrita em 1625, pelo dramaturgo inglês Ben Jonson. A peça foi traduzida e montada pelo cineasta Jorge Furtado e utilizada como pauta para seu novo documentário, de mesmo título, que estreou nos cinemas em todo Brasil neste mês de agosto. O filme, premiado como melhor documentário pelo júri oficial e popular do 18º Cine PE, de Pernambuco, traz entrevistas com 13 jornalistas de política nacionalmente reconhecidos, que refletem sobre critérios jornalísticos, coberturas de grandes temas, revolução digital, a importância e o futuro da profissão.
A ideia do filme surgiu há sete anos quando Furtado percebeu que a profissão estava passando por uma transformação e questionamentos. “Se agora todo mundo tem seu Face, blog, Twitter… pra quê jornalista? Mas minha percepção foi oposta, foi de que mais do que nunca precisamos de profissionais do jornalismo e não de amadores”, afirma. Outra motivação para o filme neste momento é a revolução digital nas comunicações. O filme compara o que está acontecendo agora ao que ocorreu na época do surgimento da imprensa de Gutenberg: a informação explodiu geometricamente, mas o que é verdade e o que é ficção? “Mesmo que você poste no seu Twitter que está ocorrendo um incêndio no prédio ao lado, é o jornalista que vai ao local descobrir e divulgar as informações corretas sobre o fato”, exemplifica um dos entrevistados.
A peça de Ben Jonson, que permeia as entrevistas, é cheia de humor e tiradas inteligentes sobre a sociedade da época. A estória se passa em um dia, na Londres do século 17, quando o personagem Pila Júnior é informado da morte de seu pai. Imediatamente ele começa a gastar a fortuna que recebeu e um de seus investimentos é o novíssimo mercado de notícias, escritório de organização e catalogação de notícias no qual emprega seu amigo barbeiro.
ESTREIA – O Mercado de Notícias terá sessões em Porto Alegre a partir de 7 de agosto, no Espaço Itaú (Bourbon Shopping Country – 2º piso – Av. Túlio de Rose, 80 – Passo da Areia) e no Cine Bancários (Rua General Câmara, 424 – Centro).
ENTREVISTA | Em defesa do bom jornalismo
Foto: Fábio Rebelo
Extra Classe − Por que escolher uma peça de 1625 como pauta para o filme?Jorge Furtado − Achei muito impressionante a percepção que o Ben Jonson teve na época, pois o jornalismo tinha começado três anos antes em Londres. Ele percebeu muito rapidamente quais eram as mazelas do jornalismo e as grandes questões como a relação com a fonte, o financiamento, gente que quer aparecer na imprensa e o poder da imprensa.
EC − Como acredita que o tema do filme será recebido pela imprensa?Furtado − Descobri que existe a categoria dos sem mídia (assim como existem os sem teto, sem terra) e os jornalistas também são sem mídia. Eles não têm onde refletir sobre a profissão, o mercado. É um assunto bastante tabu. A imprensa não fala na imprensa. Nesse sentido, o filme é útil, pois a gente precisa do jornalismo para tomar decisões, desde coisas práticas, como o clima, até o que está acontecendo no mundo. Mais do que nunca, nessa tempestade de informações que o mundo virou, precisamos de profissionais treinados, capacitados e pagos para isso.
EC – Qual o papel político do filme neste ano de eleições?
Furtado – O filme tem a ver com política, com a cobertura da política e uma certa ideologização extremada da imprensa atualmente. Como, por exemplo, o caso da Copa do Mundo, que nem está no filme, pois aconteceu agora. Mas durante meses a imprensa, majoritariamente, vendeu a ideia de que a Copa seria um vexame, os aeroportos, o trânsito, a violência etc… Mas aconteceu o oposto. Por quê? Como a imprensa se enganou tão fortemente? Por preconceito. Ou seja, tinha uma ideia pré-concebida e procurava coisas que confirmassem a ideia. E se formos pensar o quanto o Brasil perdeu com tudo isso? Quantas pessoas deixaram de vir para o país, quantos investidores deixaram de patrocinar? O jornalismo tem consequências reais.