O professor, o jornalista e o escritor
Foto: Igor Sperotto
Nada é por acaso na literatura de Vitor Necchi. A palavra está ali por inteiro. Capta o banal e o trágico do cotidiano e os transforma em questões filosóficas. Para ele, “a palavra é tentativa de dar sentido ao mundo, recompor o que resta dos escombros, registrar o efêmero, perpetuar, sublimar”. Jornalista e escritor, mestre em Comunicação Social pela PUCRS, doutorando em Letras na Ufrgs e professor de Escrita Criativa na Feevale, Vitor lança no dia 20 de outubro, às 17h, na Livraria Taverna, seu primeiro livro. Não existe mais dia seguinte (Editora Taverna, 196 páginas) reúne 60 crônicas de procedências diversas, um registro significativo sobre a sociedade brasileira – algumas publicadas em veículos impressos e digitais, outras escritas para redes sociais e uma safra mais antiga do blog Cacto, que ele manteve nos primeiros anos deste século. O livro também será lançado na 64ª Feira do Livro de Porto Alegre, dia 11 de novembro, às 19h30min.
Natural de Porto Alegre, Vitor Necchi nasceu em 1970. Criado entre livros, acordeões e piano, alfabetizou-se cedo. Aos cinco anos já escrevia. Na casa onde viveu até os 24 anos, a prateleira com os dois primeiros volumes da coleção Clássicos da Literatura Universal (Editora Abril, 1970) era um deslumbramento. Com capa vermelha dura e letras douradas, Os irmãos Karamazov, de Dostoiévski, e As aventuras do Sr. Pickwick, de Dickens, foram o marco inicial da sua biblioteca.
Em 1981, foi para o Colégio Militar de Porto Alegre, onde fez parte do Primeiro Grau e o Segundo Grau. Nesse ambiente machista e homofóbico, estruturou sua subjetividade, o pensamento crítico e a consciência política. Experiência dura para um adolescente sensível. Mas nada impediu que a professora Nara Pampanelli colocasse a literatura na sua vida. A paixão pela leitura explodiu. Ele chegou a ser chamado por um amigo de O Selvagem da Biblioteca, em referência ao filme O Selvagem da Motocicleta, de Francis Ford Coppola.
Assim, Vitor atravessou um portal libertador. Novos pensamentos, comportamentos e repertórios. Aos 18 anos, chegou à universidade pública. “Com os colegas, aprendi a abraçar sem vergonha. Descobri Miles, Piazzolla, Billie e Nina. Bebíamos vinho e discutíamos filosofia, arte e as questões mais prosaicas da vida”. Vieram as aulas de criação literária de Léa Masina. E, no final dos anos 1980, com o professor Sérgio Silva, descobriu os cineastas Pasolini, irmãos Taviani, Bergman, Bertolucci, Mário Peixoto, Eduardo Coutinho, Wim Wenders, Nelson Pereira dos Santos, David Lean, Kurosawa e Glauber Rocha.
Vitor Necchi foi aluno que queria ser professor. Aos 24 anos, começou a dar aulas na Feevale. Tem quase 25 anos de magistério. Mas o desejo de ser escritor é anterior a tudo. Aos 48 anos, tem consciência de que optou pelo jornalismo pela centralidade da palavra na sua vida. Quando o jornalismo se mostrou insuficiente, a literatura se impôs. Para ele, escrever é tentar domar a palavra, “torcendo para que, no fundo, ela se insurja, e que o confronto nunca acabe”. Dessa tensão nasceu Não existe mais dia seguinte. Para além da perspectiva profissional, escreve para não submergir no vácuo da dor, para dar algum sentido à vertigem que é viver, aos abandonos, às diversas vezes em que morre.