Impacto do coronavírus na economia será mais grave para informais
Foto: Reprodução
O Covid-19 toma conta do noticiário mundo afora com um forte enfoque sobre o impacto no universo financeiro. Além das medidas de segurança em saúde para conter a pandemia, a oscilação das bolsas e o impacto no mercado financeiro, a mídia tem dado pouca importância aos trabalhadores autônomos e informais. Essa massa de trabalhadores na informalidade desde a crise agravada no processo de impeachment da presidente Dilma Rousseff será a mais afetada em suas rendas na avaliação de especialistas. O país tem atualmente 3,4 milhões a mais de trabalhadores “autônomos” do que em 2014.
Sob uma sequência de retiradas de direito dos trabalhadores, a enfermidade desembarcou no país no momento em que a população desprotegida pela legislação trabalhista atingiu um patamar historicamente alto. De acordo com o IBGE, mais de 40% da população economicamente ativa do país são pessoas que foram empurradas para a informalidade, ou seja, estão trabalhando sem carteira assinada, sem direitos trabalhistas e sem proteção social. Por outro lado, a crise pode ser uma semente para o debate sobre a vulnerabilidade dos cidadãos e como esta deve ser enfrentada.
“Certamente, hoje, estamos numa situação mais fragilizada do mercado de trabalho para a chegada do coronavírus do que há cinco anos”, afirma Daniel Duque, pesquisador do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getúlio Vargas (FGV). Segundo ele, houve um crescimento muito grande do número de trabalhadores por conta própria, “que estão principalmente no setor de serviços, onde a interação com pessoas é muito importante”, lembra.
O pesquisador destaca que, numa situação de grande choque na economia, os profissionais com carteira assinada não têm variação significativa da renda. “Já para os conta própria, cuja renda depende diretamente da atividade que fazem, o choque pode ser muito maior e eles também não têm acesso a mecanismos compensatórios do governo, como INSS ou FGTS”, repara.
O sociólogo Clemente Ganz Lúcio, do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese) avalia que o coronavírus deve propiciar o debate sobre mecanismos públicos de proteção para os trabalhadores que não estão sob proteção da legislação trabalhista. Ganz Lúcio entende ainda que o Brasil deveria adotar medidas emergenciais para garantir a renda da parcela mais vulnerável da população, como uma suplementação do Bolsa Família, oferta de crédito e isenção da contribuição para Microempreendedores Individuais (MEI).
Para Duque, “nas próximas semanas, podemos ver um choque de renda muito negativo nessas camadas da população que não têm um amparo social”. O pesquisador da FGV concorda com Ganz Lúcio: “Esse seria o momento perfeito para pensar nessa nova estrutura, mas isso não está na cabeça dos atuais governantes”.
Para o sociólogo do Dieese, é difícil pautar essa questão na conjuntura atual. A unanimidade no momento é que tanto trabalhadores informais e autônomos estão com medo de ficar doentes ou da própria quarentena. Não tanto pelo risco de morte, mas por verem que é possível seus rendimentos minguarem caso fiquem impossibilitados de trabalhar ou por uma possível redução de demanda, caso a circulação de pessoas seja limitada, explica Ganz Lúcio.
IBGE – De acordo com prévia de 14 de fevereiro do IBGE, o país tem 11 estados com mais de 50% da sua população economicamente ativa na informalidade após a aprovação da reforma trabalhista no governo Temer, no ano passado. De 1,8 milhão de vagas geradas naquele ano, 1 milhão são postos são informais. Segundo o levantamento, dos 93,4 milhões de pessoas ocupadas no país, 24,2 milhões são trabalhadores por conta própria e 11,6 milhões empregados sem carteira assinada no setor privado. A taxa média de informalidade é de 41,1% e foi superada em 18 estados, entre os quais Goiás, que tem 41,2%, e Pará, 62,4% de informais. Entre 2014 a 2019, o número de desempregados no país cresceu 87,7%. Das 27 unidades da federação, 12 tiveram aumento superior a 100%. De Temer a Bolsonaro, no Rio de Janeiro o desemprego cresceu 159% e, em São Paulo, 94,7%.
LEIA TAMBÉM:
Aplicativos do século 21 obrigam a trabalhar como no século 19
De Lafargue às 40 horas semanais