Crise e recessão, terreno fértil para golpes financeiros
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O cenário de crise financeira e recessão, juros baixos, desemprego e redução da renda, com todos os problemas decorrentes da pandemia configuram o cenário perfeito para a proliferação de golpes financeiros que visam os pequenos investidores.
O alerta é do ex-banqueiro de investimentos e economista Eduardo Moreira. Ele chama a atenção para a grande quantidade de golpes financeiros, pirâmides, promessas de ganho que nunca serão cumpridas noticiadas todos os dias. “São promessas absolutamente enganosas, falaciosas, criminosas e muitas pessoas estão caindo nesses golpes”, afirma Moreira, que mantém canais de educação financeira na web.
Para o economista, o ano tem as características perfeitas para uma onda de golpes financeiros. “A gente está com uma taxa de juros muito baixa no mundo inteiro e o Brasil também, porque a economia está muito mal e o governo faz isso para tentar estimular os investimentos”, explica. Como a classe média não encontra rentabilidade nos bancos e corretoras, nem nos canais mais convencionais de investimentos como poupança e CDB, por exemplo, e diante do desemprego ou redução de renda, “o cenário é perfeito para várias pessoas perversas, mal-intencionadas ganharem o dinheiro em cima dessa confiança que eles (os pequenos investidores) depositam nesses esquemas criminosos”. Toda vez que alguém oferecer remuneração acima de 1% ao mês, sem risco, desconfie, avisa.
Formado em engenharia pela PUC do Rio de Janeiro, Moreira estudou Economia na Universidade da Califórnia de San Diego (UCSD), onde foi eleito o melhor aluno do curso dos últimos 15 anos (GPA 4.0). Trabalhou no Banco Pactual até 2009, no qual foi sócio responsável pela área de Tesouraria. Em 2009 junto a outros sócios fundou a empresa Brasil Plural e criou a Genial investimentos. Ganhou visibilidade ao contestar em uma exposição no Congresso o projeto de reforma da Previdência do ministro da Economia Paulo Guedes, Moreira lançou o movimento Somos 70 por cento (#Somos70porcento), que destaca que a maioria do Brasil desaprova a política de Bolsonaro, acabou tendo um protagonismo que afirma não ter: “Eu lancei um hashtag”, disse em entrevista ao Extra Classe em agosto.
O economista afirma que não foi por falta de aviso que muitas pessoas estão caindo em golpes financeiros, esquemas de pirâmides e outras armadilhas, atraídas por rendimentos irreais. Ele lembra que em 2019, antes da pandemia, o cenário já era favorável aos golpistas e oportunistas da praça.
Criptomoedas e pirâmides: como perder dinheiro fácil
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Exemplos não faltam. Teve a Binary Bit, investigada por pirâmide financeira, que ofereceu rendimentos de 3% ao dia e gerou um prejuízo de R$ 80 milhões. A Unick Forex, que virou alvo da CVM depois de prometer rendimentos também de 3% e suspender pagamentos, gerando 5,1 mil queixas no site Reclame Aqui.
Em outubro de 2019, o Ministério Público Federal e a CVM apontaram indícios de pirâmide financeira na empresa 18kRonaldinho, do ex-jogador de futebol Ronaldo de Assis, o Ronaldinho Gaúcho, preso no Paraguai por usar passaportes falsos e suspeita de lavagem de dinheiro. A empresa do jogador prometia rendimento de até 2% ao dia em Bitcoins (moedas virtuais) a clientes que investissem a partir de 30 dólares, além de bônus para indicações, pacotes que iam de 30 até 12 mil dólares.
Os rendimentos seriam supostamente fruto de operações de “trading e arbitragem” na criptomoeda Bitcoin, de acordo com o material de divulgação que a empresa apresenta a potenciais clientes. “É uma pirâmide pura, clássica”, afirmou à época Michael Viriato, professor de finanças do Insper, em São Paulo.
Em maio de 2019, uma megafraude envolvendo criptomoedas em Porto Alegre e região metropolitana foi revelada pela Operação Egypto, da Polícia Federal e da Receia Federal.
O montante perdido pelas vítimas seria de R$ 1,05 bilhão. Uma empresa que teve o nome mantido em sigilo pela operação é acusada de captar cerca de 55 mil clientes e levantar recursos dessas pessoas para supostamente investir em criptomoedas sem a autorização do Banco Central.
“A gente avisou que isso ia acontecer e que em 2020 seria muito pior. Em janeiro, anunciamos as ‘cascas de banana de 2020’”, diz o economista. Segundo ele, as armadilhas normalmente incluem promessas de ganhos irreais em uma conjuntura econômica de crise em baixíssima remuneração do capital.
“Operações de financiamento com opções e a promessa de que se cair o mercado o cliente fica com a ação; operações de forex (foreign exchange/ câmbio, vendidas como um investimento) com alto histórico de ganhos e lastro em moedas estrangeiras como dólar e euro, projetos imobiliários na planta, ICO (inicial coin office), operações com criptomoedas que mostram que todo mundo está ficando rico e só você não; as carteiras de ações que tiveram ganhos excepcionais nos últimos 12 meses e que pegam uma ação que deu certo e faz propaganda, escondendo tudo que deu errado, aplicativos que dão sinais de compra e venda de ações. Fuja. É golpe. Não existe investimento sério que ofereça mais de 1% ao mês sem risco”, enfatiza Moreira.
Rei das pirâmides: prejuízo de R$ 170 milhões
Foto: Redes Sociais/ Reprodução
O economista destaca dois escândalos financeiros dessa natureza revelados apenas neste mês. Na última segunda-feira, a polícia civil do Rio de Janeiro prendeu o dono da empresa JJ Invest, Jonas Jaimovick, que estava foragido desde o ano passado, suspeito de ser o responsável por um dos maiores esquemas de pirâmide financeira já realizadas no país. De acordo com a Delegacia de Defraudações, ele causou um prejuízo aproximadamente R$ 170 milhões a investidores. Ele era considerado foragido desde 2019, quando teve prisão decretada. Apenas na Delegacia de Defraudações foram ouvidas 60 vítimas, que tiveram prejuízos de R$ 30 milhões. Outras oito pessoas foram indiciadas por participação direta no esquema e por lucrar com a pirâmide financeira. Os lucros oferecidos aos investidores eram de 10% a 15%.
Considerado o maior operador de pirâmides do país, o empresário responde a mais de 30 inquéritos no Rio e há processos contra ele em São Paulo, Maranhão, Recife, Ceará, entre outros estados. Na esfera cível há uma infinidade de processos pedindo ressarcimento ao próprio jJonas e a JJ INvest e a estimativa da polícia é que em todo país existam mais de 3 mil lesados com algumas pessoas perdendo até mais de R$ 1 milhão. A JJ Invest ganhou visibilidade na mídia e conquistou credibilidade das vítimas após patrocinar times de futebol, uma imagem projetada para o mundo depois que o jogador Neymar apareceu com uma camiseta de clube exibindo a marca JJ no peito. Entre as vítimas, há artistas e jogadores de futebol como Zico, que investiram na pirâmide e perderam muito dinheiro. À polícia, Jonas explicou que ressarciu alguns clientes e perdeu o restante do dinheiro na Bolsa de Valores.
Influenciador perdeu R$ 30 milhões em pregão ao vivo
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Outro caso recente de pirâmide financeira era mantido pelo economista e influenciador digital do ramo financeiro Vinícius Loureiro Ibrahim, de Campinas, São Paulo. Ele se apresentava nas redes sociais como investidor bem sucedido, que vendia cursos de day-trade e negociava títulos ao vivo em lives transmitidas durante o pregão da Bolsa de Valores de São Paulo (B3). A promessa de retorno era de até 10% ao mês aos investidores. O trader não tem registro de gestor de recursos ou consultor de investimentos pela Comissão de Valores Mobiliários (CVM), mas vendia um “Fundo Vinicius Ibraim” e tinha mais de 164 mil seguidores no Instagram. Em uma das transmissões restritas a quem mantinha aplicações no esquema, no dia 27 de outubro, Ibrahim fez uma operação malsucedida na Bolsa de Valores e em seguida desligou a tela e desapareceu dos canais que mantinha com os investidores. O escorregão acabou lesando cerca de 200 pessoas em mais de R$ 30 milhões. Ibrahim gravou um vídeo no qual promete devolver o dinheiro aos investidores. “As pessoas vão receber, sim, mas demora para executar. É só solicitar o saque que o dinheiro vai ser liberado”, afirma na gravação. Em setembro, o influenciador financeiro já havia feito uma operação malsucedida na Bolsa. Sua conta de cerca de R$ 1 milhão na Órama foi zerada pela corretora ao atingir os limites de risco e deixou um saldo negativo de R$ 90 mil. Acabou entrando no cadastro negativo da B3.