ECONOMIA

Racismo e mercado de trabalho: pandemia piorou desigualdades entre negros e brancos

Homens e mulheres negros sentiram, com maior frequência, os danos do isolamento e da redução do nível de atividade econômica, mostram IBGE e Dieese
Da Redação / Publicado em 13 de novembro de 2020
Indicadores do mercado de trabalho mostram exclusão da população negra dos empregos formais e sua maior inserção na informalidade

Foto: Pedro Vidal/Agência IBGE Notícias

Indicadores do mercado de trabalho mostram exclusão da população negra dos empregos formais e sua maior inserção na informalidade

Foto: Pedro Vidal/Agência IBGE Notícias

Os dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (Pnad Contínua), realizada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), mostraram que mais de 6,4 milhões de homens e mulheres negros saíram da força de trabalho – como ocupados ou desempregados, entre o 1º e o 2º trimestre de 2020, isto é, perderam ou deixaram de procurar emprego por acreditar não ser possível conseguir nova colocação.

Entre os brancos, o número de pessoas nessa mesma situação chegou a 2,4 milhões. Na comparação entre o 4º trimestre de 2019 e o 2º trimestre de 2020, entre os negros, o número subiu para 7,4 milhões. Para os não negros e não negras, o total pouco se alterou, chegando a 2,7 milhões de pessoas.

Infográfico: Dieese/ Divulgação

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8 milhões demitidos em 2020

Dos 8 milhões de pessoas que perderam o emprego entre o 1º e o 2º trimestre de 2020, 6,3 milhões eram negros e negras, o equivalente a 71% do total. Entre o 4º trimestre de 2019 e o 2º de 2020, cerca de 72% ou 8,1 milhões de negros e negras estavam em situação vulnerável no país.

“A crença de que seria impossível conseguir uma colocação com a crise gerada pela pandemia e a preocupação com a possibilidade de contaminação com um vírus do qual pouco se sabe, e que tantas vidas tem levado, impactaram a busca por ocupação”, anotam os pesquisadores no boletim especial do Dieese sobre as desigualdades.

Infográfico: Dieese/ Divulgação

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Muitos não saíram para procurar emprego e, por isso, a taxa de desocupação não cresceu na mesma proporção dos postos de trabalhos fechados pela pandemia.

“É possível perceber o aumento da taxa de desocupação entre o 4º trimestre de 2019 e o 1º trimestre de 2020, uma vez que as pessoas perderam os trabalhos temporários e começaram a buscar novas oportunidades. Para os homens negros, a taxa de desocupação passou de 11,8% para 14,0%, do primeiro para o segundo trimestre de 2020; para os não negros, de 8,5% para 9,5%; e para as mulheres negras, de 17,3% para 18,2%, no mesmo período”, aponta.

É sabido que mulheres e homens negros enfrentam dificuldades maiores para conseguir uma colocação. A taxa de desocupação entre esses trabalhadores é sempre maior, mas a pandemia conseguiu criar ainda mais adversidades para essa população. Em situação vulnerável de renda, moradia, sem possibilidade de aderir ao isolamento, necessário para evitar a propagação do coronavírus, trabalhadores e trabalhadoras negras foram obrigados a continuar a busca por trabalho diante da necessidade de sobrevivência, em longos deslocamentos dentro de transportes públicos nas grandes cidades.

Infográfico: Dieese/ Divulgação

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Demanda potencial em queda

Como consequência da saída de muitos trabalhadores da força de trabalho, a taxa de subutilização, que expressa a demanda potencial por trabalho, aumentou em 2020. Entre as negras, chegou a 18,2% no 2º trimestre deste ano, e entre os negros, a 14,0%. A taxa de subutilização da mulher não negra ficou estacionada em 11,3%, enquanto a de homens não negros foi de 9,5%.

A taxa de subutilização é composta pelos subocupados por insuficiência de horas trabalhadas, ou seja, pessoas que trabalhavam menos de 40 horas semanais e estavam disponíveis para trabalhar mais horas, se houvesse a possibilidade; pelos desocupados que buscavam trabalho e; pela força de trabalho potencial, da qual fazem parte aqueles que procuraram trabalho, mas não estavam disponíveis na semana que antecedeu a pesquisa; e pelos desalentados, pessoas que querem trabalhar, mas não procuraram trabalho.

Dos 11 milhões de ocupados que perderam os postos de trabalho entre o 4º trimestre de 2019 e o 2º trimestre de 2020, 31,4% tinham carteira de trabalho assinada; 28,7% não possuíam carteira e eram assalariados; 25,8% trabalhavam por conta própria; e 11,4% eram trabalhadoras domésticas sem carteira.

A Medida Provisória 936 conseguiu garantir a manutenção de vínculos trabalhistas formais, mas, no caso dos homens negros, cerca de 1,4 milhão possuíam carteira no 4º trimestre de 2019 e, no 2º trimestre de 2020, no meio da pandemia, já não mais.

Infográfico: Dieese/ Divulgação

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Sem empregos formais

Foram os homens negros com carteira (1,4 milhão), sem carteira (1,4 milhão) e os que trabalhavam por conta própria (1,2 milhão) que perderam as ocupações na pandemia. Para as negras, os números não ficam atrás. Perderam os postos de trabalho 887 mil trabalhadoras com carteira; 620 mil sem carteira; 886 mil trabalhadoras domésticas; e 875 mil trabalhadoras por conta própria.

“Importante lembrar que muitos consideraram as trabalhadoras domésticas como vetores de transmissão da Covid-19, pelo fato de elas utilizarem transporte público. Um grande número de contratos de trabalho foi finalizado por esse motivo, deixando à míngua mulheres de baixa renda e escolaridade”, ressalta o estudo.

Infográfico: Dieese/ Divulgação

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Em média, todos os rendimentos de homens e mulheres, negros e não negros, aumentaram entre o 4º trimestre de 2019 e o 2º trimestre de 2020. Os resultados poderiam ser comemorados se a análise fosse feita apenas pelo enfoque dos rendimentos, mas, a partir dos dados anteriormente aqui apresentados, é possível perceber que houve perda de trabalho entre aqueles com inserções mais frágeis e informais. Ou seja, os que tinham menor rendimento perderam as ocupações, enquanto aqueles que ganhavam mais permaneceram ocupados e com salário.

A desigualdade de inserção e de ocupação existe ainda, de forma acentuada, no mercado de trabalho brasileiro. Negros e negras enfrentam mais obstáculos para conseguir uma colocação, ganham menos e têm frequentemente inserção vulnerável e frágil.

Infográfico: Dieese/ Divulgação

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“A pandemia no Brasil explicitou e acentuou essa situação. Homens e mulheres negros, ocupados em situação de informalidade, no trabalho doméstico e sem vínculo legal, foram os que mais sofreram os efeitos da parada da economia brasileira por causa do coronavírus”.

Movimento sindical

A mobilização do movimento sindical conseguiu proteger parte significativa dos empregos dos assalariados com carteira, com a Medida Provisória 936, mesmo com a redução de salário, mas cerca de 8 milhões de pessoas, a maioria negra, ficaram sem trabalho e sem renda.

A importância do Auxílio Emergencial que, graças à intensa pressão do movimento sindical e social, foi definido inicialmente em R$ 600,00, garantiu certa dignidade a muitos. Outros tantos não conseguiram receber a ajuda ou tiveram o pagamento liberado com bastante atraso. Para esses brasileiros, pobres, afastados dos direitos garantidos em lei pelo emprego protegido, coube escolher entre a fome ou ir para rua buscar trabalho mesmo com a possibilidade de encontrar o vírus.

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