EDUCAÇÃO

Sucessor de Olívio traçará futuro da Uergs

Ricardo Pont / Publicado em 4 de abril de 2001

A implantação da Universidade Estadual do Rio Grande do Sul, bandeira política histórica carregada pela esquerda gaúcha desde a metade da década de 80 e encampada, desde junho do ano passado, pelo governo do Estado, não dependerá só do poder de barganha dos interlocutores do Palácio Piratini ou da boa vontade das bancadas de oposição. Da maneira como foi projetada, a Uergs só aplicará o que teoriza se conseguir transpor o maior obstáculo que terá pela frente: a população, que elege em outubro do ano que vem o sucessor de Olívio Dutra. O novo governador é quem traçará o futuro da instituição.

Prédio da Fundação Liberato Salzano poderá ser uma das sedes da universidade

O atual governo reconhece que, se for aprovada, a proposta será aplicada de maneira gradativa e terá que respeitar os limites de caixa impostos pelo Tesouro Estadual. Conforme o secretário-executivo do grupo de trabalho responsável pelo projeto de lei, Francisco Xarão, pelo menos a curto prazo não serão erguidos prédios novos ou aplicados recursos extra aos R$ 16 milhões previstos no Orçamento de 2001 para que o Estado custeie o ensino superior (pela Constituição, a incumbência é prioritária do governo federal). Pela mesma projeção, os primeiros alunos da nova universidade só poderão freqüentar cursos oficiais já em março de 2002 se a proposta for votada em plenário até final de junho.

O futuro do projeto recai de vez sobre o resultado das próximas eleições quando entram em cena os objetivos traçados pela nova universidade. Em síntese, a Uergs servirá para formar profissionais aptos a solucionar problemas crônicos que afetam, em escala variada, o desenvolvimento das 22 fatias sócio-econômicas do Rio Grande do Sul. O novo modelo de geração de conhecimento e tecnologia lançará mão de potencialidades e culturas locais para corrigir desigualdades, harmonizar índices regionais de desenvolvimento, estender o acesso ao ensino superior às camadas menos favorecidas do estrato social e incitar o mercado local a interagir com a globalização, sem que se deixe absorver por ela. A questão é saber se o novo governador, senão o suposto apadrinhado da esquerda de Olívio, terá interesse político em levar a iniciativa adiante.

As diretrizes da nova universidade, divulgadas há um ano do início da campanha eleitoral, já fazem com que o debate político sobre os rumos a serem seguidos pela Uergs se transforme em foice de lâmina afiada na disputa pelo Piratini. Representantes do governo temem que a oposição, que garante maioria na Assembléia, desvirtue a proposta inicial ou apresse o debate para cobrar do governo, em campanha, o cumprimento do programa estipulado em 98. Na oposição, setores acusam o Executivo de querer forçar a aprovação de um projeto vago na intenção de pedir “carta branca” aos deputados e fazer da universidade um instrumento de manipulação ideológica.

A verdade é que, se for criada, a Uergs preencherá uma lacuna antiga no cenário nacional do ensino superior. Com apenas 7% dos gaúchos de até 24 anos matriculados em universidades, o Rio Grande do Sul é o único membro expressivo da Federação que ainda não dispõe de universidade pública estadual. As 18 instituições que hoje disputam a demanda interna atendem, ao todo, 227 mil matrículas. Desse total, 61 mil foram abertas de 91 a 98, sendo que, dentre as novas, só 4,7 mil foram absorvidas pelas universidades federais.

Redigido pela Casa Civil, Fapergs e Secretarias Geral de Governo, da Educação e da Ciência e Tecnologia, o projeto de lei que cria a Uergs foi entregue à Assembléia em 15 de fevereiro e protocolado como o primeiro de 2001. Conforme o Piratini, a proposta é o marco inicial para a implantação do único dos pontos ainda não desenvolvidos pelo governo dentro do programa de campanha para o setor de Educação. É também a primeira vez, nas últimas cinco décadas, que uma iniciativa do tipo parte do Executivo, e não da oposição no Legislativo.

Diferente da proposição apresentada em 1992 pelo então deputado estadual Beto Albuquerque (PSB), a Uergs projetada pelo governo não pretende arrendar o patrimônio ou unificar os planos de carreira das universidades comunitárias gaúchas. O coordenador de projetos especiais da Secretaria de Ciência e Tecnologia Sílvio Arend explica que a iniciativa prevê a realização de convênios com instituições que não possuam fins lucrativos para utilizar prédios e garantir, inclusive, a cedência de parte dos professores. A intenção é instalar núcleos da universidade em regiões do Estado que não estejam servidas de ensino público superior. As áreas de atuação inicial, conforme o governo, poderão contemplar a formação de professores e tecnólogos, a especialização de profissionais da saúde e a capacitação de gestores públicos.

A Uergs não ofertará cursos em cidades que já sediam universidade pública. Os municípios que acusarem maior demanda terão preferência para instalação dos primeiros núcleos da instituição. Audiências do Orçamento Participativo 2001 adiantam que a Uergs foi considerada prioridade máxima na Fronteira Oeste, Vale dos Sinos e Alto Jacuí. Em outras oito regiões, ocupa a segunda colocação. Também devem servir de critério para a instalação das unidades iniciais da universidade a estrutura física já instalada e as comparações entre o PIB per capita e o nível de aproveitamento de formandos, em cada região, com as médias apuradas em nível estadual.

Uma frente pluripartidária surgida em Novo Hamburgo já pleiteia junto ao Piratini a instalação da sede administrativa da Uergs na Fundação Estadual Liberato Salzano, que se prepara para oferecer dois cursos de formação de tecnológos. A campanha recebe apoio de prefeitos, vereadores, educadores e empresários do Vale dos Sinos. Outra das primeiras localidades candidatas a sediar um núcleo é o Centro Técnico do Couro, instalado em Estância Velha.

Os recursos reservados pelo governo para fazer frente aos primeiros investimentos com a Uergs ficam bem aquém dos R$ 813 milhões previstos para o ensino fundamental e dos R$ 202 milhões orçados para o ensino médio, em 2001. A verba sai, na íntegra, do Tesouro do Estado, e corresponde a uma quota adicional aos 35% sobre o orçamento global, investidos em Educação pelo atual governo. Os primeiros R$ 16 milhões servirão para recuperar e adaptar prédios, instalar e informatizar a sede central, e adquirir laboratórios e acervo bibliográfico.

Apoiadores do projeto Uergs estimam que financiamentos externos e recursos oriundos da prestação de serviços serão suficientes para que o empreendimento se mantenha funcionando. As secretarias estaduais já analisam possíveis convênios com universidades espanholas, francesas e alemãs, unidades da Unesco e o Ministério cubano da Saúde. Outras projeções do governo sobre captação de recursos indicam uma provável reavaliação da política estadual de custeio do crédito educativo e a injeção de verbas do Fundef, recebidas do governo federal pelas Prefeituras, na capacitação de professores municipais que não possuam diploma de graduação.

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