Cursos lato sensu serão investigados pelo MEC
A SEC encaminhou ao MEC dossiê que apresenta irregularidades na oferta de cursos de pós-graduação lato sensu. O documento foi entregue pelo secretário José Fortunati ao ministro Tarso Genro, que acenou com interesse em fiscalizar o setor. O documento refere-se a instituições de outros estados que realizam cursos de finais de semana, com baixa qualidade, pouca estrutura, não-cumprimento da carga mínima de 360 horas, ausência de biblioteca e até mesmo de professores.
A ação da SEC dá expressão às denúncias que já vinham sendo feitas pela representação do Sinpro/RS no Ceed desde 2002.
O secretário da Educação do Estado José Fortunati, em visita a Brasília, no dia 28 de abril, entregou pessoalmente, nas mãos do ministro Tarso Genro, dossiê listando 17 instituições de outros estados que oferecem cursos de pós-graduação lato-sensu (em finais de semana), em várias cidades do Rio Grande do Sul. Segundo o secretário, as instituições listadas tornaram-se objeto de investigação da SEC a partir de denúncias de irregularidade (Leia Extra Classe, edições 65 e 80). O Rio Grande do Sul é o primeiro estado a demonstrar alguma preocupação com o assunto e levar um pedido de providências com base em documentação ao MEC.
Fortunati se disse impressionado com a determinação do ministro em resolver o problema. “A preocupação com a qualidade do ensino ofertado deve ser de todas as esferas: federal, estadual e municipal”, explica. A SEC vêm sofrendo pressão de vários setores, inclusive das próprias universidades privadas que consideram esses cursos uma concorrência desleal. O próprio Conselho Estadual de Educação (Ceed) já se manifestou por meio de uma indicação publicada em fevereiro, favorável a implementação de normas mais rígidas para os setor. “Muitos professores da rede pública estadual acabam cometendo um erro ao se inscreverem para cursos de pós-graduação que, na verdade, não existem de fato ou são malministrados, não preenchendo os requisitos básicos para a concessão do diploma correspondente”, alega o secretário.
A secretaria anuncia que, enquanto esses cursos permanecem sob investigação e o MEC não apresentar uma posição definitiva sobre o caso, os mil processos existentes de pedido de progressão de nível 3 para 6, de professores estaduais, continuarão suspensos.
O chefe de gabinete do Ministério, Jairo Jorge , que é a pessoa encarregada por Tarso Genro para dar andamento à questão, considera a preocupação do secretário Fortunati procedente e garante que o MEC vai utilizar todo o seu poder de polícia e fiscalização para garantir a qualidade nos cursos. O ministro pediu para que seus assessores avaliassem a possibilidade de suspensão dos cursos em andamento, até que se tenha uma definição sobre o assunto. Até o momento do fechamento desta edição (30/04), ainda não havia uma definição sobre o assunto.
Cpers contesta suspensão das promoções
A Assessoria Jurídica do Cpers iniciou o ajuizamento das ações individuais, postulando este direito à progressão de nível 3 para 6. E seriam, conforme a assessoria jurídica do Centro, mais de 3 mil processos de professores aguardando decisão sobre o assunto e muitos outros que, tendo licenciatura curta, estão cursando pós-graduação. O advogado Jorge Buchabqui, que representa os professores estaduais pelo Cpers, afirma que o Plano de Carreira do Magistério, em seus artigos 7º, 8º e 9º, prevê a possibilidade de alteração de nível, mediante a apresentação de títulos, conforme graus de habilitação obtidos em formação regular. Segundo ele, os níveis previstos são de 1 até 6, sendo que o nível 3 corresponde a licenciatura curta e o nível 6 a quem tiver habilitação específica em pós-graduação.
“Os argumentos utilizados pela Secretaria da Educação não têm sido muito claros, pois, em alguns momentos, invocam a necessidade de os professores preencherem o requisito de primeiro cursar licenciatura plena e alcançar o nível 5 para, após, alcançarem o nível 6 e, em outros, sustentam que a negativa se deve ao questionamento da qualidade dos cursos”, critica o advogado.
Conforme Buchabqui, a SEC já teria consultado o Conselho Nacional de Educação (CNE) sobre a questão e teria recebido resposta positiva quanto à possibilidade legal de quem tenha graduação curta cursar pós-graduação. A conclusão do advogado é de que não há qualquer impedimento no Plano de Carreira do Magistério Público Estadual ou na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional a que se proceda a alteração de Nível de 3 para 6 dos professores que obtiverem a titulação exigida. Já quanto ao estabelecimento de critério para a aceitação que a secretaria quer implementar, ele garante haver duas situações distintas. Uma que se refere à correlação entre a habilitação exigida para as disciplinas correspondentes ao cargo de professor em que o Membro do Magistério estiver provido e a habilitação obtida no curso de pós-graduação. Esta matéria já se encontra regulamentada pelo Conselho Estadual de Educação, mas pode, de acordo com critérios técnicos, ser revista com ampliações ou restrições que se apresentem necessárias. A outra é aquela que a Secretaria da Educação diz pretender aplicar, que se refere a qualificação dos cursos. Mesmo que aparentemente a intenção se apresente como razoável, sua possibilidade legal não existe. Segundo o artigo 48 da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDBEN), cabe às Universidades validar os diplomas por elas conferidos, e a autorização, o reconhecimento e o credenciamento dos cursos das instituições de educação superior são competências da União, de acordo com o que dispõe o inciso IX do artigo 9º do mesmo diploma legal.
Ao que sabemos, existem na Secretaria da Educação mais de 3 mil processos de professores aguardando decisão sobre o assunto e muitos outros que, tendo licenciatura curta, estão cursando pós-graduação. “Acreditamos, por todos os fundamentos legais e até pelo pronunciamento do Conselho Nacional de Educação, que as ações judiciais têm grande possibilidade de sucesso”, completa Buchabqui.
Professores preocupados com validade dos cursos
Nos dias que seguiram à circulação da última edição do Extra Classe (nº 80, de abril de 2004), a SEC e a redação do EC receberam uma verdadeira enxurrada de telefonemas a respeito da denúncia da oferta irregular de cursos de pós-graduação lato sensu no Rio Grande do Sul, por instituições de outros estados. A reportagem trata de cursos fora de sede, ministrados aos finais de semana, cuja principal clientela são professores da rede estadual que pleiteiam progressão no plano de carreira do nível 3 para o 6. A SEC, por sua vez, elaborou um dossiê no qual estão listadas cerca de 17 instituições sob investigação a partir de denúncias. Em fevereiro, o Ceed pediu à SEC, por meio de Indicação, a adoção de critérios no acolhimento de certificados de qualificação dos quadros do magistério estadual. São cerca de 2 mil pedidos de progressão de nível por ano, a maioria de professores diplomados pelos cursos listados no dossiê.
No geral, as ligações foram feitas por professores que cursaram ou estão cursando especializações nas instituições listadas e temem pela validade dos diplomas. Não foram poucos os que confirmaram as condições precárias dos cursos e aproveitaram para apontar outras. Houve um grande número de relatos de alunos que descreveram como único recurso didático a exibição ininterrupta de fitas de vídeo, sem presença de professor e a confirmação do não-cumprimento da carga-horária mínima de 360 horas-aula. Quanto à existência de bibliotecas, a quase totalidade dos alunos admitiu ter de recorrer a universidades sediadas no RS para poderem consultar as bibliografias exigidas para elaboração dos trabalhos de conclusão.
Comung considera iniciativa necessária
O presidente do Consórcio das Univesidades Comunitárias Gaúchas (Comung), Luiz Augusto Campis, que também é reitor da Unisc, lembra que a entidade que representa tem cobrado da SEC uma posição sobre o assunto desde o início do ano passado. Segundo ele, vários desses cursos tinham as próprias Coordenadorias Regionais de Educação funcionando como centros de propaganda. Ele menciona até mesmo o envio de malas-diretas para os professores a partir das CREs. “O pior é a falta de qualidade do que é ofertado, sem estrutura e em salas inadequadas.” Referindo-se ao aluguel de escolas públicas e salas de aula. “Os alunos desses cursos recorrem às nossas bibliotecas, nos obrigando a regular o acesso a elas”, lamenta. “O que esperamos do MEC é que altere a legislação vigente para que não se permita essa prática, que está se alastrando cada vez mais”, conclui.
Diretor da Decision/FGV demonstra indignação
Edison Alaor Ferronatto, diretor da Decision – Consultoria e Negócios, que oferece cursos conveniados à Fundação Getúlio Vargas, em Porto Alegre, considerou a menção à FGV no chamado dossiê das caça-níqueis, formulado pela SEC, um verdadeiro absurdo. “Não sei o que o nosso nome está fazendo neste documento. Somos uma instituição séria e sequer oferecemos cursos destinados a professores”, justifica. Ele alega restringir-se à área de marketing, negócios e economia, e seus cursos seriam muito caros para serem feitos por professores estaduais. “Só pode ser uma conspiração da concorrência para nos tirar do mercado”, arrisca. A SEC justifica a presença do nome da FGV na lista, bem como de todas as outras instituições, como estando elas sob investigação, o que não implica qualquer acusação e julgamento prévio de irregularidade e qualidade. Em visita da nossa reportagem às dependências da Decision, foram mostradas as salas de aula climatizadas e uma biblioteca em reforma sendo atualizada para cumprir as exigências legais, já que está nos planos da escola a oferta de cursos de graduação.