EDUCAÇÃO

Ensino Fundamental terá nove anos a partir de 2007

Por Jacira Cabral / Publicado em 22 de outubro de 2006

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Foto: Tânia Meinerz

Foto: Tânia Meinerz

A partir de 2007, no Rio Grande do Sul toda criança com 6 anos de idade – completos até o início do ano letivo – deverá ser matriculada no 1º ano do Ensino Fundamental, etapa que passa de oito para nove anos de duração. Em plenária no dia 21 de setembro, o Conselho Estadual de Educação (Ceed) aprovou as Resoluções 288 e 289 que definem como deverá ser a implementação do Ensino Fundamental obrigatório de nove anos no Estado. Cabe agora às instituições públicas e privadas adequarem-se às novas exigências.

A nova determinação da obrigatoriedade do ingresso aos 6 anos no Ensino Fundamental não exclui o ingresso daquelas crianças que estarão com 7 anos no início do ano letivo de 2007 – ambas deverão ser matriculadas no 1º ano do Ensino Fundamental, etapa que terá nove anos de duração. Segundo a presidente da Comissão de Legislação e Normas do Ceed, Cecília Farias, também representante do Sinpro/RS no Conselho, as escolas passarão a conviver com os dois regimes: oito e nove anos de duração do Ensino Fundamental. “Quem entrou em 2006 na 1ª série do Ensino Fundamental de oito anos segue nesse sistema; quem inicia em 2007, é no ensino fundamental de nove anos de duração”, explica.

Conforme a secretária estadual de Educação, Nelsi Müller, o Rio Grande do Sul tem condições de implementar o novo regime de nove anos de Ensino Fundamental até 2010. Segundo ela, a partir de 2006, as escolas estaduais em parceria com as municipais procurarão atender à demanda ampliada. “Este ano foram 90 mil crianças matriculadas nas turmas de 1ª série no Estado, sendo que, em anos anteriores, este total chegou a 100 mil crianças”, por essa razão, a secretária garante que não haverá problema de vagas. Quanto ao número de professores, em caso de necessidade, serão nomeados em fevereiro de 2007 os concursados que constam no banco de reserva da secretaria. Nelsi Müller diz ainda que na primeira quinzena de novembro será divulgado o número de matrículas para o próximo ano.

A presidente da União Nacional dos Dirigentes Municipais de Educação/RS (Undime) e a secretária de Educação de Caxias do Sul, Marisa Abreu, também acreditam que não haverá problema de vagas. Conforme dados recentes, há sobra de vagas em cerca de 370 municípios gaúchos com população inferior a 20 mil habitantes. “Se ocorrer algum problema, será nos municípios médios e grandes”, comenta. De acordo com a presidente da Undime, que até o ano passado era consultora legislativa da Câmara dos Deputados na área da educação, outro fator que afasta o perigo da falta de matrícula para 2007 é o fato recorrente nos últimos anos, tanto em nível estadual como federal, da decrescente demanda de alunos para a 1ª série do Ensino Fundamental.

Diferentemente dos demais, para o presidente do Sindicato dos Estabelecimentos de Ensino Privado no Rio Grande do Sul (Sinepe/RS), Osvino Toillier, no caso das escolas privadas, não se cria uma nova 1ª série, e sim uma 9ª: “Nosso novo paradigma é 8 + 1”. Isso porque, segundo ele, a criança de 6 anos já estava na 1ª série na rede particular de ensino, “salvo algumas exceções”. Ele avalia que o que vai ocorrer é a diluição dos conteúdos do Ensino Médio que passam – em parte – a fazer parte do Ensino Fundamental. Para tanto, as escolas terão de repensar seus planos de ensino e “mexer em sua estrutura toda”. Marisa Abreu discorda da interpretação de Toillier, pois, “do ponto de vista pedagógico, a normatização do Conselho Nacional de Educação está aumentando um ano no início do Ensino Fundamental, e não no fim”.

Escolas precisam adaptar-se

“Ao longo do processo, vamos confirmar que, diante da situação de miséria de grande parte da população brasileira, é muito importante que o Estado passe a ter obrigação de acolher a criança um ano antes”, argumenta Cecília Farias, representante do Sinpro/RS no Ceed. Ela adverte, entretanto, que o ensino só será de qualidade se a criança for atendida dentro das suas necessidades. Essa inclusão mais cedo implica também o dever da escola de se preparar e de reorganizar os tempos pedagógicos. Lembra, ainda, que não pode haver reprovação no 1º ano: “o aluno do 1º ano será avaliado por parecer descritivo e não terá retenção (reprovação) ao final do ano letivo, passando direto para o 2º ano”. Uma questão que tem sido levantada na comunidade escolar refere-se ao ingresso obrigatório de alunos com 7 anos completos no Ensino Fundamental de nove anos de duração. Alega-se que os estudantes concluirão o Ensino Fundamental com 15 anos de idade, um ano a mais do que o restante. Para superar o problema, em casos em que o estudante demonstre condições de avanço, as escolas podem avaliar esse aluno, localizando-o no ano adequado, exceto com relação aos alunos do 1º ano (Art. 24 da LDBEN).

Marisa Abreu, da Undime, levanta uma série de outras questões administrativas e legais que devem ser providenciadas para assegurar uma implantação adequada, que permita sintonia entre as diferentes redes de ensino no Estado. Mesmo que 70% das redes municipais de ensino já tenham passado para nove anos no Ensino Fundamental, a presidente da Undime/RS afirma que há muito o que fazer nesse período de transição. “Um exemplo é como resolver as transferências de estudantes de uma para outra rede de ensino quando a família muda de cidade.”

Mas, independentemente de todo o trabalho de ajustes necessários, Marisa comemora o ingresso mais cedo da criança na escola: “O Brasil era o único país na América Latina que começava aos 7 anos, e só nós e a Bolívia tínhamos ensino obrigatório de oito anos”. Países como Argentina e Uruguai têm dez anos de ensino obrigatório, contando o ano final da pré-escola (aos 5 anos) e mais nove de educação básica. “E o Chile recentemente incluiu o ensino médio como obrigatório, além dos oito anos de fundamental.”

Osvino Toillier lembra a repercussão negativa que a Lei 5.692 de 1971 provocou ao reduzir o ensino primário de cinco para quatro anos. Também por isso ele aprova o retorno de mais um ano obrigatório no Ensino Fundamental: “Temos de volta os 12 anos de escolaridade, somando o ensino médio. Assim nos equiparamos a sistemas educacionais de países que são referência mundial”. Segundo o dirigente, no próximo dia 20 de outubro, o Sinepe/RS promoverá um novo encontro com as 644 escolas associadas, tendo como tema a implantação do Ensino Fundamental de nove anos.

Ingresso mais cedo é ganho para a criança

Para o doutor em Educação e professor na pós-graduação da Faculdade de Educação da UFRGS, Fernando Becker, é perfeitamente razoável a criança de 6 anos estar na escola, até porque essa faixa etária não é desconhecida dos estabelecimentos de ensino que oferecem educação infantil (antigo jardim de infância). “O aprendizado da criança dependerá de sua capacidade cognitiva”, argumenta.

Especialista na obra de Jean Piaget, Fernando destaca dois fatores que contribuem para o desenvolvimento da inteligência: o programa genético e a demanda sociocultural. “As duas coisas trabalham combinadas num vai-e-vem interminável.” Neste sentido, ele considera um ganho indiscutível a entrada mais cedo das crianças na escola, principalmente daquelas provenientes de famílias de baixa renda, em que, via de regra, são precárias as trocas culturais mais significativas. “Uma criança pode entrar na escola sem carências que comprometam seu desenvolvimento orgânico, mas, se não tiver demandas cultural e social, falha tudo.”

Por outro lado, ele acredita que o problema está em como a escola vai trabalhar com essa criança. Lembra Paulo Freire quando o autor afirmava que o professor precisa aprender qual a capacidade do seu aluno, do contrário ele erra: “Mira a perdiz e acerta o cachorro”. Para evitar os equívocos da escola conteudista, Becker faz algumas recomendações: criar condições para que a criança aprenda pela própria atividade; evitar atividades que privilegiem a repetição, pois a criança aprende aquilo que faz sentido; organizá-las em turmas de 18 a 20 crianças. “Fala-se tanto em inclusão, e, para mim, essa inclusão se dá com ensino competente, que não se restringe em saber qual o conteúdo a ser dado, mas em saber ler no aluno a capacidade com a qual ele chega na escola.”

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