Meninos são vítimas silenciosas
Um levantamento feito entre os 295 processos do Depoimento sem Dano de vítimas de abuso e exploração sexual no Juizado da Infância e Juventude em Porto Alegre, entre maio de 2003 e dezembro de 2008, constatou que 77% eram do sexo feminino e 23% do sexo masculino. Porém, as estatísticas podem estar subdimensionadas em relação ao problema real. A revelação é difícil porque os garotos abusados temem ser chamados de “bichas ou mulherzinhas”, analisa a professora Mariza Silveira Alberton, do Comitê Nacional de Enfrentamento à Violência Sexual no estado. Especialmente quando o abuso ocorre dentro de uma mesma família, há uma tendência de o filho demorar muito mais tempo que a filha para admitir a violência.
Foto: iStock Fotos
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Mesmo assim, o número de denúncias envolvendo garotos está crescendo, constata Mariza. Uma das possibilidades é de que, com a conscientização, a violência venha mais à tona. Também há um número maior de meninos homossexuais que são rejeitados dentro da família e acabam indo para a rua, onde se submetem à exploração sexual para ganhar algum dinheiro. Sem falar na miserabilidade, nas drogas e no desejo de adquirir bens de consumo, que muitas vezes impelem à prostituição.
Isso não quer dizer que o abuso está restrito à população mais pobre. “Trabalhei na Comissão Parlamentar Mista de Inquérito do Congresso Nacional em 2003/2004, que tinha como foco os casos praticados por autoridades e exploradores de sexo em rede”, observa Marisa. “Mais de mil pessoas foram indiciadas”. Portanto, é preciso um olhar e uma escuta afinados para perceber os sinais e os pedidos de ajuda que os jovens abusados enviam em todos os lugares, inclusive na sala de aula: comportamento muito sexualizado e dificuldade de confiar nas pessoas são alguns deles.
Jornadas alertam sobre violência sexual contra crianças e adolescentes
Há sete anos, especialistas, políticos, técnicos e a comunidade em geral se reúnem em audiências públicas para definir os conceitos de violência e exploração sexual, chamar a atenção para o problema e alertar para a necessidade de denunciá-lo. Os encontros são denominados Jornadas contra a Violência e a Exploração Sexual de Crianças e Adolescentes. O projeto surgiu dentro da Assembleia Legislativa do Estado e desde 2007 tem dado ênfase ao treinamento de profissionais nas universidades, principalmente das áreas do Direito, Educação, Psicologia e Turismo. O tema deste ano foi Pedofilia na Internet, que é a segunda rede mais rentável do mundo, depois do tráfico de drogas.
Ao longo dos sete anos, houve prefeitos que negaram a ocorrência de casos em seus municípios. Em outros lugares, as autoridades se comprometeram em criar serviços e delegacias especializadas. A jornada também serviu para ouvir denúncias e acompanhar alguns processos, ajudando a identificar os entraves que fazem com que não avancem na Justiça.
Um deles, lembra a professora Mariza, foi o de três crianças abusadas pelo pai. Quinze anos após a primeira denúncia, as crianças foram para um abrigo, apesar das tentativas de que fossem acolhidas por familiares. O pai, que era o abusador, não só permaneceu solto como havia se casado novamente e teve outros filhos, o que leva a professora a acreditar que o ciclo de exploração pode ter continuado. Como membro da Pastoral do Menor e do Movimento Gaúcho pelo Fim da Violência e Exploração Sexual de Crianças e Adolescentes, Mariza luta pela mudança de leis para impedir distorções. “Temos sentenças terríveis que absolvem homens da acusação de exploradores porque as meninas já não eram mais virgens”, observa. A Jornada vai retomar suas reuniões em março de 2010.
Denúncias também podem ser feitas pela internet
Os Conselhos Tutelares e o Ministério Público estão preparados para receber denúncias de violência e exploração sexual de crianças e adolescentes. Já as páginas eletrônicas com conteúdos suspeitos de pornografia infantil, crimes de ódio e genocídio podem ser denunciadas pela própria internet, de forma anônima, por meio de um formulário on-line no site do Departamento da Polícia Federal. Outra forma de encaminhar denúncias é pela internet, através do email: denuncia.ddh@dpf.gov.br ou por telefone, no Disque 100.