EDUCAÇÃO

Aliado no combate ao bullying

Programa de Combate à Intimidação Sistemática, que caracteriza as situações de agressão física, psicológica e moral, entra em vigor no próximo ano letivo
Por Grazieli Gotardo / Publicado em 14 de dezembro de 2015
Foto: SMC/ Divulgação

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Iniciativas isoladas como o projeto de grafitagem Bullying não é brincadeira, da escola municipal Araucária, de Curitiba, ganham mais efetividade com a legislação federal

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Entra em vigor a partir do início do próximo ano letivo a Lei nº 13.185, sancionada em novembro pela presidência da República, que estabelece o Programa de Combate à Intimidação Sistemática (bullying) em todo o Brasil. O programa tem como principal objetivo prevenir e combater a prática da intimidação sistemática em toda a sociedade e caracteriza situações de agressão física, psicológica e moral que podem ser consideradas bullying. O texto prevê capacitações aos professores, envio de relatórios periódicos por parte dos governos estadual e municipal e medidas de conscientização e combate, sem estabelecer punições.

No Rio Grande do Sul, desde 2010, duas leis, uma municipal e uma estadual, contemplam políticas antibullying, prevendo ações de capacitação e orientação para professores, alunos e comunidade. A lei nacional, inclusive, é oriunda de projeto de lei do então deputado Carlos Eduardo Vieira da Cunha (PDT), atual secretário de Educação do RS.
Conforme a coordenadora de Gestão de Aprendizagem, Nelnie Lorenzoni, a Secretaria Estadual de Educação está com suas ações alinhadas à nova lei, visto que já desenvolve projetos nesse sentido. “Terminamos agora uma capacitação de professores estaduais em temas como comunicação não violenta, justiça restaurativa e mediação escolar. Assim como prevê a lei, trabalhamos na perspectiva da conscientização e responsabilização em vez da punição”, explica.

Silvio Luís da Silveira Capaverde, diretor pedagógico da Secretaria Municipal de Educação de Porto Alegre (Smed) destaca que o órgão também já desenvolve ações nas comunidades escolares por meio da Assessoria Técnica de Articulação em Rede (Atar). “Temos uma equipe multidisciplinar que orienta e assessora as escolas, sejam públicas ou privadas, e também fornecemos profissionais para palestras e eventos, de acordo com a necessidade”.

Programa consolida trabalho do Sindicato
Para Cecilia Farias, diretora do Sinpro/RS e presidente do Conselho Estadual de Educação (CEEd/RS), a nova lei contribui para o trabalho que vem sendo desenvolvido pelo Núcleo de Apoio ao Professor Contra a Violência (NAP), que desde 2007 desenvolve ações de acolhimento e orientação aos docentes que sofrem algum tipo de violência no ambiente escolar. “O NAP nasceu dos crescentes casos de professores que também sofrem com a intimidação exercida pelas direções das instituições de ensino, pelos alunos e também pelos pais de alunos. Essa nova lei enfatiza a importância do tema e nos motiva ainda mais a acolher os professores em sofrimento seja na mediação dos conflitos pelo diálogo e novas aprendizagens seja no encaminhamento jurídico necessário”, ressalta Cecília. Levar o debate sobre práticas antibullying para a mesa de negociação coletiva com o Sindicato Patronal (Sinepe/RS) também é outra possibilidade aberta pelo programa, segundo a dirigente sindical.

Responsabilidade das escolas
A nova lei fixa que é dever do estabelecimento de ensino assegurar medidas de conscientização, prevenção e combate à violência e à intimidação sistemática. Para o presidente do Sinepe/RS, Bruno Eizerik, as instituições de ensino privado estão “comprometidas com o documento”. “No ensino privado, as instituições de ensino realizam diversos projetos para conscientizar os estudantes da importância do respeito nas relações, sejam elas presenciais ou virtuais. Entendemos que o mesmo ocorre no trabalho com os professores, em que as escolas dão o suporte necessário aos docentes, no sentido de prevenção e combate ao bullying”, avalia.

A Lei caracteriza como bullying:
• ataques físicos
• insultos pessoais
• comentários sistemáticos e apelidos pejorativos
• ameaças por quaisquer meios
• grafites depreciativos
• expressões preconceituosas
• isolamento social consciente e premeditado
• pilhérias
• cyberbullying
A intimidação sistemática é classificada
conforme as ações praticadas de forma verbal,
moral, sexual, social, psicológica, física, material
ou virtual.

ENTREVISTA | Cléo Fante

“Escola tem função pedagógica, não punitiva”

Cléo Fante é doutora em Educação, especialista em bullying e cyberbullying, autora do Programa Antibullying Educar para a Paz e escritora. Para ela, a nova lei representa um avanço para o país, mas exige o comprometimento de todos: escola, professores, pais e alunos.

Foto: Acervo Pessoal

Foto: Acervo Pessoal

Cléo Fante

Foto: Acervo Pessoal

Extra Classe – Qual a sua avaliação sobre Programa de Combate à Intimidação Sistemática?
Cléo Fante – A Lei sancionada é um avanço em nosso país, uma luta da qual participamos desde o início da sua propositura, em 2009. Avalio positivamente a proposta, porém, o texto poderá gerar equívocos quanto à definição do termo bullying. Ao contrário do texto de algumas outras leis, como a paraguaia e a colombiana, nas quais está claro que o bullying ocorre entre alunos e alunas ou grupo de alunos e alunas, a lei brasileira usa o termo indivíduo, o que alarga amplamente o público-alvo, dificultando o entendimento.

EC – Qual sua opinião sobre a não existência de punições na lei?
Cléo – O foco da lei sancionada nunca foi a punição. Nesse sentido, existe projeto de lei em discussão para transformar o bullying em crime, o que sou veementemente contra. O Estatuto da Criança e do Adolescente, ainda não bem compreendido por muitos ou motivada a sua incompreensão pelo senso comum, prevê punições ou responsabilizações
quando há violações de direitos, quer seja praticado por pessoas adultas ou entre os próprios adolescentes. Inclusive, algumas alterações foram realizadas no ECA, prevendo os crimes cibernéticos (cyberbullying) e as respectivas responsabilizações. Portanto, existem amparos legais que tratam a questão da intimidação, ameaça, constrangimento, calúnia, difamação, injúria, perseguição, lesão, dentre tantas outras formas de abusos que integram o bullying.

EC – Qual o papel da escola nesse contexto?
Cléo – Sua função é pedagógica, não punitiva. Por isso, deverá focar na restauração do comportamento do praticante de bullying. Para isso, deverá criar como guia um Programa de Combate ao Bullying, em cumprimento à Lei 13.185 e rever seu Regimento Interno Escolar, devendo prever o bullying e possibilidades de responsabilizações, respeitando,
obviamente, o ECA. Ainda temos que pontuar a necessidade do apoio e a participação de
toda a comunidade escolar, sem os quais nenhum programa antibullying resultará efeitos positivos.

EC – A lei pode ser benéfica aos professores?
Cléo – A lei será benéfica aos professores desde que sejam capacitados no entendimento correto do problema e, principalmente, no conjunto de ações e procedimentos que devem ser adotados. A lei é clara quando diz que os estabelecimentos de ensino devem promover medidas de conscientização, prevenção e combate a todos os tipos de violência, com ênfase nas práticas recorrentes de intimidação sistemática (bullying), ou constrangimento físico e psicológico, cometidas por alunos, professores e outros profissionais integrantes de escola e de comunidade escolar.

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