EDUCAÇÃO

O lento avanço do ensino a distância

Por Jacira Cabral da Silveira / Publicado em 11 de abril de 2016

Resoluções do Conselho Nacional de Educação (CNE) são criticadas por instituições educacionais, professores e gestores dos sistemas de ensino devido à falta de mecanismos que garantam a qualificação do ensino a distância. Para credenciamento de polo, por exemplo, pelas normas de fevereiro e março do CNE, basta que a instituição de ensino informe a intenção de ampliar a oferta de EaD, sem comprovação ou especificação da existência da estrutura física adequada, recursos humanos e forma de atendimento ao aluno.

Com relação à resolução que trata das diretrizes e normas nacionais para a oferta de programa e cursos de educação superior, a Associação Brasileira de Educação a Distância (Abed) encaminhou carta ao MEC classificando o documento como ultrapassado e restritivo quanto aos aspectos referentes à expansão e à autonomia acadêmica e intelectual das Instituições de Ensino Superior (IES). No âmbito estadual, a avaliação negativa partiu do Conselho Estadual de Educação (CEEd/RS), especialmente no que diz respeito ao documento emitido pelo CNE que define as diretrizes para o credenciamento institucional e a oferta de cursos e programas de ensino médio, de educação profissional técnica de nível médio e educação de jovens e adultos (EJA).

O lento avanço do ensino a distância

Foto: Igor Sperotto

Mara Lucia Carneiro, da UniRede, critica omissões nas resoluções do CNE em relação a diversos aspectos do ensino superior a distância

Foto: Igor Sperotto

“A resolução não cria mecanismos para a qualificação do ensino a distância”, resume a presidente do CEEd/RS e diretora do Sinpro/RS, Cecília Farias, ao comentar o conteúdo da norma emitida pelo CNE. Em contrapartida, ela destaca os avanços normativos da oferta de EaD no estado, e o quanto essas normas diferem da recente resolução nacional no que tange ao ensino médio, EJA e profissional. Segundo a dirigente, uma das divergências entre as duas resoluções é quanto à oferta de curso na modalidade EaD entre as unidades federativas. Enquanto no documento nacional basta a instituição proponente informar sua intenção junto ao conselho do estado onde pretende oferecer o curso, na resolução do CEEd/RS, de janeiro deste ano, está previsto que nesses casos deve haver o credenciamento do referido polo de acordo com critérios como estrutura física, recursos humanos e forma de atendimento ao aluno.

Outro aspecto conflitante diz respeito à organização do currículo dos cursos EaD quanto ao percentual obrigatório de presencialidade. Conforme o CEEd/RS, para a oferta de EaD para educação de jovens e adultos deve haver um mínimo de presencialidade de 25% da carga total do curso EJA; 35% na educação profissional; e 50% no eixo ambiente e saúde. “Esse é um mecanismo que tenta qualificar a oferta de ensino”, reforça a presidente do CEEd/RS, ressalvando que “essa presencialidade precisa ser distribuída harmonicamente ao longo de todo o curso e não concentrada num final de semana estendido”.

INSTALAÇÃO NEGOCIADA – De acordo com Sérgio Franco, membro do CNE e um dos mplantadores da EaD na Universidade Federal do Rio Grande do Sul (Ufrgs), o que a Resolução nº 334 – de 28 de janeiro/2016 – propõe é a negociação entre os conselhos estaduais envolvidos na proposição de um novo curso na modalidade EaD. Na avaliação do conselheiro, qualquer posicionamento restritivo quanto à oferta de curso entre estados se contrapõe ao que ele chama de lógica do ensino a distância: “Um estado pode discutir se os critérios adotados pelo outro estado são suficientes, mas não pode simplesmente proibir a entrada de qualquer instituição em seu território. Qual seria o motivo de proibir isso Reserva de mercado?”, contrapõe.

Quanto aos percentuais de tempo destinados às aulas presenciais, o professor alega que não cabe à resolução definir isso. Conforme Franco, a normativa nacional defende que esse aspecto seja estabelecido a partir do projeto pedagógico de cada instituição de ensino: “Não dá para fazer uma regra geral porque não existe um único modelo de EaD”, justifica.

O lento avanço do ensino a distância

Foto: Igor Sperotto

Franco, do CNE: qualquer restrição à oferta contrapõe a lógica da EaD

Foto: Igor Sperotto

Em cima do muro
Para a representante da Região Sul no Comitê de Coordenação Política da UniRede, associação das universidades públicas que oferecem educação a distância no Brasil, Mara Lucia Fernandes Carneiro, a resolução do CNE referente ao ensino superior na modalidade EaD fica em cima do muro e pouco avança quanto a antigos problemas nesse segmento de oferta de ensino no país. Como coordenadora do Programa da Universidade Aberta do Brasil (UAB), do MEC, na Ufrgs, Mara participou ao longo de 2014 das reuniões de discussão que resultaram na resolução promulgada no dia 2 de fevereiro deste ano. Com base no que ouviu durante os encontros e na redação final do documento, ela afirma que a norma não assume um posicionamento mais rigoroso: “Se debateu muito justamente para tentar conciliar esses mundos tão diferentes”, de oferta privada e oferta pública de ensino. “Como resultado, a resolução tem definições que tentam abarcar todos, mas não restringe especificamente nada”, acrescenta.

Antonieta Beatriz Mariante, professora de ensino superior e ex-presidente do CEEd/RS, é mais cautelosa ao tecer críticas à resolução do CNE por considerá-lo um documento ainda muito recente, o que exige uma leitura mais aprofundada. Entretanto, ela já aponta alguns aspectos que considera problemáticos. Um deles refere-se à definição de funções: “Para mim, o capítulo que trata dos profissionais da educação, incluindo professores, tutores e gestores apresenta certa confusão entre os diferentes papéis, especificamente quanto aos professores e tutores na EaD”.

Mara concorda com a falta de definição, especialmente no que diz respeito à figura do tutor. Segundo ela, esse é um aspecto que diferencia muito as instituições privadas das públicas: “Na universidade pública, dentro do modelo UAB, o tutor é um aluno de pós-graduação. Mas nas particulares, como não podem contratar tutores porque essa função não existe na CLT, o tutor é um professor”, explica. Nesse aspecto, Mara reitera que a resolução não ajuda a avançar nesse item ainda tão problemático na EaD brasileira.

Numa avaliação mais otimista, Antonieta identifica como aspecto positivo da resolução do CNE o fato de reforçar, assim como o Parecer do CEEd/CES nº 564/2015, a necessidade da oferta de EaD compor a política educacional das Instituições de Ensino Superior: “Entendo como uma tentativa dos legisladores de garantir, sob certa forma, a efetiva e necessária articulação entre a ‘presencialidade e a virtualidade real’. Assim, essas legislações propõem romper com a fragmentação com que muitas vezes a EaD tem sido ofertada pelas IES, como se fosse um apêndice delas, com política à parte”, conclui.

Oferta no RS
Conforme cadastro do Conselho Estadual de Educação existem atualmente no estado 78 instituições autorizadas a oferecer cursos de ensino médio, técnico, profissional ou Educação de Jovens e Adultos (EJA) na modalidade de ensino a distância (EaD). Desse total, 43% oferecem exclusivamente ensino técnico e/ou profissionalizante e 35% concentram-se na EJA. Nesse contexto, duas escolas têm em sua estrutura maior número de polos, uma com sede em Pelotas, que mantém dez polos em todo o estado, e outra sediada em Erechim, com 16 polos, majoritariamente instalados em outras instituições de ensino, suas parceiras.

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