Governo propõe orçamento do MEC quase inalterado para 2021, em R$ 144,5 bilhões
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Mesmo após os protestos de entidades e profissionais vinculados à Educação, o governo federal manteve, na prática, o corte em parte do orçamento do Ministério da Educação (MEC) para 2021. Na Proposta de Lei Orçamentária (Ploa) para o próximo ano, que chegou ao Congresso no último dia do prazo, em 31 de agosto, os recursos previstos para a Educação são de R$ 144,5 bilhões. O valor é ligeiramente superior ao de 2020 (R$ 142,1 bilhões na Ploa), mas ainda não alcança o montante empenhado em 2019, de R$ 144,7 bilhões. Para as despesas discricionárias – aquelas previstas, mas não obrigatórias –, nas quais o MEC havia comunicado às entidades no início de agosto a projeção de um corte de R$ 4,2 bilhões (18,2%) em 2021, estão previstos R$ 19,9 bilhões.
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A redução, apesar de não ter alcançado o índice inicialmente anunciado, foi de 8,7% em relação ao previsto na Ploa de 2020 (R$ 21,8 bilhões, que acabaram com dotação menor, de R$ 19,6 bilhões), e ao empenhado em 2019 (R$ 23,9 bilhões). Os gastos discricionários são os destinados a ações de custeio, investimentos e assistência estudantil. Incluem, por exemplo, valores colocados em ações como construção de creches, bolsas de apoio, repasses para expansão do ensino integral ou recursos destinados a ampliar a utilização de tecnologia nas escolas.
Aparentemente, em relação ao que havia sido ventilado no início de agosto, de que os valores para a Educação seriam menores do que os do Ministério da Defesa em 2021, o governo recuou, e manteve a Educação com o maior orçamento entre os ministérios. Mas, na prática, quando consideradas as despesas discricionárias, o aumento no orçamento do MEC será de R$ 276 milhões (1,4%) em relação à dotação atual, enquanto que o da Defesa alcançará R$ 928 milhões (8,5%).
A falta de ‘dinheiro novo’ para a Educação ocorre em um momento no qual, em função de todos os problemas decorrentes da pandemia do novo coronavírus, entre eles o ano letivo anômalo de 2020, há necessidade de aumento nos investimentos em tecnologia e medidas sanitárias. “De fato fica difícil compreender. Porque não há país no mundo que tenha emergido de suas crises efetuando cortes em educação, ciência e tecnologia. As universidades, por exemplo, vêm experimentando cortes ano a ano. Neste momento, aqui, temos condições de conduzir a universidade até agosto de 2021. E destaco: isto não é drama para sensibilizar, isto é a realidade”, assinala o reitor Paulo Afonso Burmann, da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM), e membro da diretoria da Associação Nacional dos Dirigentes das Instituições Federais de Ensino Superior (Andifes).
Cenário negativo com baixa entrega de políticas públicas
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Conforme o coordenador de Relações Governamentais do movimento Todos Pela Educação, Felipe Poyares, há queda tanto real como nominal das despesas com a área. “No orçamento da Educação como um todo, o Ploa prevê um reajuste de 1,7%. Mas a inflação do período é de 4%. Fica evidente que o reajuste não é suficiente. Nas despesas discricionárias, o corte ocorre em um cenário no qual, neste ano de 2020, o governo já vem executando um percentual muito abaixo do previsto”, elenca. Segundo ele, as expectativas no sentido de reverter as diminuições e garantir investimentos se voltam agora para o Congresso. ‘É um cenário muito negativo, de uma baixa entrega de política pública, e justamente quando a gente mais precisa. O Congresso precisa reverter isto”, considera Poyares.
Segundo Burmann, a Andifes já realiza um movimento junto ao Legislativo para tentar alterar o quadro. “Estamos apostando na sensibilidade e na sensatez”, resume. A coordenadora geral da Campanha Nacional pelo Direito à Educação, Andressa Pellanda, também destaca a necessidade de profissionais e entidades articularem soluções junto ao Congresso, mas projeta um cenário pouco animador. “É uma situação muito crítica para a Educação, que precisava muito mais do que R$ 144 bilhões. Não é um montante suficiente para uma resposta condizente com a que será necessária para todas as consequências da pandemia. Voltamos nossas pressões para o Congresso neste momento, mas a verdade é que não sabemos até que ponto, depois, os valores vão de fato se sustentar na execução orçamentária do próximo ano”, adianta Andressa.
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A execução orçamentária é a etapa concreta da aplicação dos recursos, e tem exigido atenção extra dos que acompanham a política educacional no país. Porque os esforços para garantir os investimentos acabaram se tornando uma constante, ora para tentar coibir cortes, ora para fiscalizar sua aplicação. O último relatório elaborado pelo Todos Pela Educação a respeito da execução orçamentária do MEC, divulgado em 29 de agosto, elenca os problemas, e mostra como já afetam o cotidiano de estudantes, a produção e o repasse de conhecimento.
O relatório do Todos mostra, por exemplo, que, até o final de junho (primeiros seis meses) deste ano, apenas 22% das despesas discricionárias do orçamento do MEC foram pagas. Mas a baixa execução não se limita às despesas não obrigatórias. Mesmo após a inclusão dos recursos condicionados ao descumprimento da Regra de Ouro à dotação do ministério, aprovada em junho, e o remanejamento de recursos extras para a pasta por meio de medidas provisórias (MPs) para enfrentar a crise, o orçamento em 2020, em valores reais, é o menor desde 2012. E, nele, menos de 1% dos recursos condicionados pertencem à Educação Básica.
A análise traz um alerta a respeito do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE), principal unidade executora de despesas relativas à educação básica. Conforme o levantamento, há na autarquia mais despesas a pagar do que limite de pagamento disponível. A soma das dotações de 2020 que ainda não foram executadas, que é de R$ 2,2 bilhões, com o saldo de Restos a Pagar (RAP), equivalente a R$ 3,3 bilhões, supera o limite de pagamentos disponível: R$ 2,8 bilhões.
Arte: Bold Comunicação
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Restos a pagar comprometem execução orçamentária
Em relação a ações para o enfrentamento da pandemia, o relatório conclui que, até junho, os esforços do MEC para apoiar as redes de ensino ficaram restritos à transferência antecipada de parcelas já previstas do Programa Dinheiro Direto na Escola (PDDE). Mas programas como o Educação Conectada, que visa ampliar o acesso à internet nas escolas, e o Ensino Médio em Tempo Integral (EMTI), não tiveram nenhuma execução até o final do primeiro semestre.
O que gera ainda mais receio entre técnicos e especialistas, contudo, é uma prática que vem se destacando desde 2019: o comprometimento de fatia significativa do orçamento com despesas de anos anteriores. Enquanto no início daquele ano 16% do saldo de restos a pagar era composto por gastos do ano anterior, em 2020 o percentual saltou para 78%. A conclusão do relatório é de que o gasto excessivo com Restos a Pagar (RAP) tem comprometido a execução orçamentária de 2020, já que consome o limite de pagamentos do exercício. Além disso, ao que tudo indica até aqui, o ‘carregamento’ de RAP do MEC de 2020 para 2021 tende a ser tão expressivo quanto o que ocorreu entre 2019 e 2020. “É grave e preocupante porque de forma alguma isto poderia acontecer, deveria ser uma exceção. Não se pode criar um problema para tapar outro”, lamenta Poyares.