EDUCAÇÃO

Alunos do Israelita gravam vídeos com ofensas e são afastados

Em live gravada logo após a eleição, estudante do Colégio Israelita de Porto Alegre destila ódio e preconceito contra eleitores de Lula: “meu pai vai te demitir”. Caso foi parar no MPRS
Por Marcelo Menna Barreto / Publicado em 4 de novembro de 2022

Foto: Reprodução

Direção do Israelita informou que afastou alunos após tomar conhecimento das ofensas: “muito mais do que punir, nosso papel é educar”

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“Pobre, vagabunda. (…) não vem reclamar depois que o meu pai te demitir”, afirma uma aluna do Colégio Israelita Brasileiro de Porto Alegre em uma live que viralizou após a eleição de domingo, 30. Ao ficar sabendo que seria denunciada, reagiu reproduzindo no video um comentário feito por outro aluno: “o juiz que vai pegar o caso provavelmente é da minha família”, zombou.

A gravação viralizou durante a semana, provocando o afastamento temporário de dois estudantes envolvidos. A direção da escola informou que só tomou conhecimento da live com as ofensas nesta sexta-feira, 4, quando o Israelita passou a ser marcado nos vídeos e a receber cobranças por um posicionamento.

A live foi gravada após a eleição de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) que derrotou Jair Bolsonaro (PL) no segundo turno, no domingo, 30. Essas e outras declarações preconceituosas contra eleitores e simpatizantes de Lula foram feitas pela autora da gravação, fora da instituição, na companhia de outros estudantes.

Colegas dela que participaram do vídeo também destilaram ofensas, inconformados com o resultado da eleição presidencial.

Dois alunos identificados pela direção da escola, conforme apurado pelo Extra Classe, foram temporariamente afastados nessa quinta-feira, 4.

Apesar da live ter sido feita fora das suas dependências, o Colégio emitiu nota pública repudiando o ocorrido e informou que na próxima segunda-feira, 7, a Comissão Administrativo-Pedagógica do Israelita deverá deliberar sobre o futuro dos estudantes.

Essa comissão é formada por docentes e integrantes da mantenedora, a Sociedade de Educação e Cultura Porto-Alegrense.

“O discurso de ódio não será tolerado. Dentro da legislação e dos nossos regulamentos, serão aplicadas as penalidades cabíveis. No entanto, muito mais do que punir, sabemos que nosso papel é educar e formar seres humanos capazes de colaborar para a evolução da sociedade”, enfatiza a instituição.

A nota do Israelita

No documento que foi divulgado após os vídeos que acabaram viralizando terem chegado ao conhecimento do colégio, a direção afirma que se solidariza com “todas as pessoas que foram e se sentiram ofendidas” com o “teor discriminatório e preconceituoso praticadas por alunos desta instituição”.

O Israelita afirma que “as ações” dos alunos que foram viralizadas não refletem seus princípios filosóficos e prática pedagógica.

“Nenhuma escola é uma ilha. Estamos inseridos em uma sociedade que se encontra em parte contaminada por dinâmicas disfuncionais. Mas vamos agir. O discurso de ódio não será tolerado. Dentro da legislação e dos nossos regulamentos, serão aplicadas as penalidades cabíveis”, registra o colégio.

A escola ressalta que mesmo sabendo que o vídeo não foi gravado em suas dependências e que os envolvidos não estavam usando o uniforme da instituição resolveu agir rapidamente diante do discurso que considerou grave.

Na nota, o colégio diz se comprometer em “usar da melhor maneira as ferramentas que possui para por em prática um programa ativo de resgate das boas relações e da ética. Estas ferramentas são nossos valores, nossa capacidade educadora, nossa crença na tolerância e na convivência entre diferentes”.

Diferentes intolerantes

Na live protagonizada por estudantes do Israelita, em discussão com pessoas que repudiaram a posição dos alunos, essa diferença foi mais do que evidenciada.

“Eu estou pagando o teu salário”, disse um aluno. “Nosso sonho, literalmente, é ter o Sul fora do mapa do Brasil e virar um país”, disse a aluna que iniciou toda a polêmica.

Em outro momento, chegou a ter zombaria com um sobrenome mais comum de outra pessoa que interagiu na live.

Informada que a live seria denunciada, a aluna leu um dos comentários publicados: “O juiz que vai pegar o caso provavelmente é da minha família”, desdenhou.

Com desprezo aos mais pobres, a aluna ainda disse, entre risos dos demais colegas, “se você está achando que as coisas são caras no mercadinho de esquina que tu vai (Sic.) na tua favela, tu não tem noção de como é nos supermercados que a gente vai, tá amore”.

A jovem vai adiante na zombaria, enumerando hábitos de consumo para expressar a sua suposta superioridade de classe. Ela cita que costuma comprar um sorvete cujo nome não soube pronunciar corretamente, mais “papel higiênico de folha dupla”, ela finaliza, “aí já deu os 600 pilas”.

“Seiscentos pilas pra gente não é nada. A gente gasta isso numa festa”, completa outro adolescente.

Ministério Público

O Ministério Público do Rio Grande do Sul (MPRS), por meio da Promotoria de Justiça Regional da Educação de Porto Alegre (Preduc-POA), recebeu a denúncia sobre os vídeos de alunos do Israelita e  também as mensagens de alunos do Colégio Farroupilha direcionadas a alunos bolsitas, também com conteúdo preconceituoso e discriminatório.

A promotora Regional da Educação de Porto Alegre, Ana Cristina Ferrareze, expediu ofício solicitando que as instituições de ensino informem, em 48 horas, se têm conhecimento dos fatos, bem como acerca das eventuais providências adotadas, de acordo com o regimento vigente e regras de convivência e conduta escolar, bem como a identificação dos adolescentes em tese envolvidos.

Além disso, a promotora encaminhou os casos ao Núcleo do Ato Infracional do MPRS (Ciaca), para ciência e adoção das providências consideradas cabíveis na esfera das infrações, em tese, perpetradas pelos adolescentes.

Encaminhou também à Promotoria de Justiça da Infância e Juventude – Núcleo Articulação/Proteção, para ciência e adoção das providências consideradas cabíveis na esfera cível, especialmente em relação à exposição da imagem dos alunos envolvidos e diante da responsabilização dos pais ou responsáveis, conforme o Estatuto da Criança e do Adolescente.

As informações serão remetidas, ainda, à 1ª Coordenadoria Regional da Educação, para ciência e adoção de providências e medidas cabíveis.

“Na área da Educação, pedimos aos colégios que nos informem oficialmente a identificação dos adolescentes em tese envolvidos nestes casos e quais medidas foram ou serão aplicadas. Depois da manifestação formal dos colégios, serão realizadas audiências extrajudiciais. Mas temos certeza de que atitudes como essas, que são graves, que nos chocam, devem ser punidas. As condutas dos adolescentes precisam ser responsabilizadas também pela área do ato infracional, bem como investigadas as condutas dos pais ou responsáveis”, ressalta a promotora de Justiça Ana Cristina Ferrareze.

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