EDUCAÇÃO

Após judicialização do seu processo eleitoral, Uergs nomeia reitor interino

Candidato da Chapa 2 questiona resultado da eleição e recorre à Justiça. O professor Fernando Guaragna Martins assumiu o cargo de forma interina
Por Stela Pastore / Publicado em 10 de novembro de 2022

Foto: Ascom/Uergs

Contagem dos votos para eleição de reitor e vice-reitora da Uergs foi contestada pela Chapa 2, do reitor Beroldt, que buscava a reeleição. Diante do impasse, a universidade nomeou reitor interino até o julgamento dos recursos

Foto: Ascom/Uergs

Até ser concluído o processo de judicialização da eleição para a Reitoria da Universidade Estadual do Rio Grande do Sul (Uergs), ocorrida em agosto, o professor Fernando Guaragna Martins assumiu o cargo de forma interina, na segunda-feira, 7, após a nomeação pelo governo do estado publicada no dia 4, no Diário Oficial (DOE).

A Chapa 1, representada por Luciano Andreatta e Danni Maisa da Silva, recebeu 50,90% dos votos válidos (1.086 do total de 1.864, sendo 921 dos alunos, 105 do corpo docente e 60 do corpo técnico e de apoio administrativo).

Foto: Ascom/Uergs

Chapa 1, de Luciano Andreatta e Danni da Silva, recebeu 50,90% dos votos e foi declarada vencedora do pleito pela Comissão Eleitoral

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A  Chapa 2, composta pelo reitor que buscava a reeleição, Leonardo Beroldt, e pela vice-reitora, professora Rochele Santaiana, totalizou 49,10% dos votos. A Chapa 2 recorreu à Justiça após ter recurso negado pela Comissão Eleitoral da Uergs (CeUergs).

A judicialização do resultado da eleição causou surpresa aos integrantes da Chapa 1, declarada vencedora do pleito pela CeUergs. “É um golpe. Isso não tem cabimento”, reage o titular da Chapa 1. “As mesmas regras do edital que elegeram o reitor em 2018, agora derrotado, só serviram em 2018 quando ele foi vencedor. Em 2022 não serviram mais”, ironizou o professor Luciano Andreatta, candidato a reitor da Chapa 1, de oposição.

Leonardo Beroldt justifica que tinha a mesma posição no pleito anterior, mas que a aplicação da regra em 2018 não alteraria o resultado que o consagrou reitor, diferente de agora.

Caso o fator de ajuste alegado fosse aplicado, o resultado seria invertido neste pleito: a Chapa 1 teria 48,64% e a Chapa 2 ficaria com 51,36% dos votos.

“Não estamos questionando as normas. Estamos questionando por que a comissão eleitoral não aplicou as regras do edital e do regimento”, justifica Beroldt, que encerrou o mandato de reitor em 4 de novembro.

“Usamos a mesma fórmula de 2018 em que o professor Leonardo Beroldt foi vencedor. E lá não houve objeção. Em nenhum momento houve contestação por nenhuma das chapas durante todo o pleito. Apenas pela parte derrotada após o anúncio da votação”, detalha o presidente da  CeUergs, Igor Noronha de Freitas, réu no mandado de segurança impetrado pela Chapa 2.

Instabilidade e desconforto reitor

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Chapa 2, de Leonardo Beroldt e Rochele Santaiana, recebeu 49,10% dos votos e recorreu à Justiça após ter negado recurso da Comissão Eleitoral

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Reitora na gestão 2014/2018 e integrante do Consun, Arisa Araújo da Luz lamenta a exposição que a judicialização gerou.

“Judicializar é legítimo e um direito. Mas vejo tudo isso com muita tristeza, porque faz um estrago imenso na Uergs e expõe a universidade por uma questão eleitoral que teve toda a lisura no processo. Isso gera instabilidade, insegurança no andamento das rotinas de trabalho e nos fragiliza como instituição”, opina.

A educadora compara o episódio ao que está ocorrendo no país, em que os resultados da urnas estão sendo questionados, com similaridade inclusive nos percentuais de voto.

“Todas as universidades estão sendo atacadas e o papel é ser resistência aos ataques à educação”, conclamou.

O dirigente da Associação dos Docentes da Uergs (Aduergs), Robson Bohrer também manifesta preocupação com a insegurança que a celeuma traz à instituição pública. Esta é a quarta eleição direta desde a criação em 2001.

“Aguardamos a resolução da Justiça e seus desdobramentos. Esperamos que a partir deste resultado a Uergs possa voltar a sua normalidade, pois neste momento estamos fragilizados e divididos. Esperamos que ao findar desse triste momento possamos nos resignar e avançar no real propósito para o qual a Uergs foi criada: desenvolver as  regiões pela educação, capacitando nossos jovens para transformar suas vidas e consequentemente nosso estado”, completou Bohrer.

Questionamento

Conselheira do Consun, a professora da unidade de Caxias do Sul, Fernanda Magalhães Stalliviere, registra que a questão central da polêmica em nenhum momento foi respondida: “por que o fator de ajuste – que consta no item 9.3 do edital – não foi aplicado?”.

“Aplicar fator de ajuste na apuração é o que está previsto no RGU, está expresso nas normativas da universidade e no próprio edital”, pontua a conselheira.

Quatro eleições para reitor, duas medidas diferentes

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O professor Fernando Guaragna Martins, que foi o primeiro reitor eleito da Uergs, em 2010, assumiu como reitor interino a partir de nomeação pelo governo do estado, até que seja concluído o processo de judicialização da eleição

Foto: Ascom/Uergs

Nas duas primeiras eleições diretas para a reitoria da Uergs em 2010 e 2014, foi aplicada uma média ponderada que leva em conta os votos válidos por segmento e divide-se pelos eleitores habilitados.

Na eleição de 2018, diante de entendimentos diferentes de qual regra seria mais justa, o Consun emitiu parecer consolidando o valor paritário dos votos dos três segmentos da comunidade universitária (professores, alunos e corpo técnico-administrativo) que participam da votação, independente do grau de comparecimento no pleito.

“A partir deste parecer, entendemos que estava pacificado, e o procedimento foi adotado. Com o resultado desfavorável, o professor Beroldt requentou essa discussão”, pontua o coordenador do processo eleitoral. “Estamos aguardando a posição da Justiça com tranquilidade, porque conduzimos o processo com transparência e obediência às regras”, arrematou Igor de Freitas.

Para o candidato da Chapa 2, o parecer do Consun em 2018 foi equivocado e não tem valor legal. Para ter validade regimental, há ritos de votação para se converter em resolução do Conselho Superior, pondera o ex-reitor. Ele argumenta que não é uma ata de homologação eleitoral que altera as regras. “Não se justifica um erro do passado com um erro do presente”, entende Beroldt.

Contestação interna e externa reitor

Após o anúncio dos índices pela Comissão Eleitoral da Uergs, em 9 de setembro, a Chapa 2 recorreu às instâncias internas, alegando aplicação equivocada da fórmula usada para calcular o percentual dos votos paritários das três instâncias votantes e a quantidade dos votos válidos.

Os dois recursos apresentados à CeUergs e ao Conselho Superior da Uergs (Consun) foram refutados por unanimidade. Com as negativas, a Chapa 2 recursou à primeira instância do Judiciário, obtendo negativa.

Com o pedido indeferido, apelou com agravo de instrumento e obteve liminar em segunda instância no Tribunal de Justiça do Estado (TJRS), por meio de mandado de segurança, travando as nomeações antes do prazo de pronunciamento dos resultados pelo Consun.

A Chapa 2 solicitou novo posicionamento ao Consun em 5 de outubro, e novamente teve o recurso indeferido por 12 votos a quatro. Em 28 de outubro, a Chapa que recebeu menos votos também acionou a Procuradoria-Geral do Estado (PGE) e o Ministério Público para que se manifestassem sobre o mandado de segurança. As duas instituições acolheram a legalidade do pleito em seus pareceres.

Beroldt reconhece que o edital de 2022 está correto, mas questiona a aplicação do cálculo na apuração. E explica por que judicializou o resultado. “Se deu porque a CeUergs negou nosso recurso e desqualificou a argumentação. Ingressamos na Justiça antes da manifestação do Consun ao nosso recurso, porque não teria efeito suspensivos à posse e poderia gerar prejuízos graves à universidade numa futura decisão judicial favorável a nós”, argumenta o titular da Chapa que recebeu menos votos.

Etapas sem questionamento

Formada por oito componentes, sendo quatro do corpo docente e quatro do corpo discente, mais o presidente, a CeUergs detalha os ritos adotados desde o início.

Informa que submeteu a minuta do Edital à Procuradoria Jurídica da Universidade, à Comissão de Legislação e Normas e ao plenário do Consun. Publicou o edital 1, apresentando o funcionamento e a fórmula a ser usada, item explicitado na sessão de escrutínio eleitoral, transmitida on-line para a comunidade universitária, com fiscais das chapas presentes, reconhecendo o resultado.

Enquanto o Poder Judiciário não julga o pedido, o reitor interino tem a tarefa de acalmar os ânimos e assegurar o funcionamento das 23 unidades da Uergs, dar condições para as atividades dos 261 professores e quase 5 mil alunos.

PGE se contradiz

Dois pareceres contraditórios emitidos pela PGE aquecem os embates. Até o momento, a crítica às manifestações antagônicas do órgão são a única unanimidade entre os titulares das duas chapas que disputam a reitoria. O julgamento do Judiciário também deve trazer mais clareza sobre as manifestações dos procuradores. Independente da decisão, cabe recurso.

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