Fórum debate papel do segmento comunitário na reconstrução do RS
Foto: Igor Sperotto
A 15ª plenária do Fórum das Instituições Comunitárias de Educação Superior (Ices) reuniu professores, funcionários técnico-administrativos e estudantes para debater as perspectivas do segmento comunitário após as enchentes. Ao final da plenária, os presentes aprovaram uma resolução que elenca as principais reivindicações do segmento, entre as quais a rigorosa revisão da legislação ambiental por parte dos governos, fim das flexibilizações e do desmonte da estrutura de fiscalização, além da participação efetiva das comunitárias na superação da crise – Leia a íntegra do texto aprovado no final desta matéria.
Iniciativa do Sinpro/RS, Sinpro Caxias e Sinpro Noroeste, o Fórum realizou sua 15ª Plenária no sábado, 8, de forma híbrida, a partir do Espaço de Eventos da Sede Estadual do Sinpro/RS, em Porto Alegre, com transmissão pelo canal do Sindicato no Youtube.
Os trabalhos foram mediados pelo diretor do Sinpro/RS, Marcos Fuhr. Na abertura da plenária, Valdir Kin, coordenador do Sinpro Noroeste, de Ijuí destacou que diante da “tragédia político-climática que nos assola de forma tão forte e tão significativa, podermos retomar esse momento de diálogo e reflexão e pensar o futuro de médio e longo prazo para o ensino comunitário no RS é fundamental”.
Pedro Goettems, coordenador da FeteeSul, falou em nome dos técnicos-administrativos do segmento comunitário. Ele também saudou a iniciativa dos três sindicatos de professores em debater o futuro de um segmento cujas instituições se destacam por cuidarem das suas comunidades.
Em nome do movimento estudantil, o presidente da União Estadual dos Estudantes (UEE), Alejandro Guerrero, lembrou que todos os campi das universidades comuntárias em algum nível se somaram nas mobilizações de solidariedade durante a tragédia ambiental.
“Quando a gente olha para nossas instituições comunitárias, pensa exatamente qual é o papel das universidades na sociedade que a gente deseja, mas não sabemos qual será o futuro desses estudantes que foram seriamente impactados”. Ele defendeu mecanismos que assegurem a permanência dos estudantes nas instituições, como o auxílio estudantil de R$ 1 mil até o final do ano.
Perspectivas e reivindicações
Foto: Igor Sperotto
O painel de abertura do Fórum, Perspectivas e reivindicações das Instituições Comunitárias no cenário pós-inundações do RS, contou com as falas do professor Rafael Henn, presidente do Consórcio das Universidades Comunitárias Gaúchas (Comung) e reitor da Unisc; do presidente da UEE, Alejandro Guerrero; e do professor e pesquisador da consultoria Flamingo EDU, Günther Gehlen.
O dirigente do segmento das comunitárias relatou as iniciativas que estão sendo tomadas pelas instituições nas suas respectivas regiões e a articulação do segmento junto ao governo federal, estadual e prefeituras. Henn reiterou o papel das Ices nas comunidades e lembrou que professores, funcionários e estudantes das regiões dos Vales, que foram seriamente atingidas por eventos climáticos no ano passado, começaram a se mobilizar em várias frentes já no final de abril e início de maio passado, quando as chuvas passaram a se intensificar.
“Isso é cultural, está na vocação e é o verdadeiro papel das Ices, esse espírito comunitário e o cuidado com as suas comunidades ocorre de forma voluntária, independente”, exaltou Henn.
Enquanto isso, os reitores das comunitárias passaram a se articular com o governo do estado, que montou sua base operacional no campus da Unisc, em Santa Cruz do Sul, como já havia feito no ano anterior na Univates, em Lajeado.
“Há uma percepção muito clara para o governo do estado que nós podemos e temos competência intelectual e humana, além de instalações adequadas para dar suporte não só neste momento de dificuldade, mas sobretudo no desenvolvimento social e econômico do RS”.
De acordo com o dirigente, o Comung participou da articulação com outras entidades educacionais para a elaboração de um programa que atenda os estudantes atingidos, a pedido do ministro da Secretaria Extraordinária de Apoio à Reconstrução do RS, Paulo Pimenta.
Foto: Igor Sperotto
Uma minuta do Programa de Bolsas Recupera RS já foi entregue ao ministro e ao presidente Lula e deverá receber outras contribuições. Prevê o pagamento de bolsa no valor de R$ 1,5 mil a 30 mil estudantes de 24 comunitárias e outras instituições de educação superior do estado para evitar a evasão. A proposta inclui um valor que será repassado às universidades para que os alunos não tenham que pagar as mensalidades.
Junto ao governo estadual, o segmento reivindica participação no plano de reconstrução. “Ficamos preocupados quando noticiaram que Porto Alegre contratou uma consultoria de fora do estado, pois sabemos que essas consultorias externas virão pra cá fazer um diagnóstico e depois irão embora. Isso não faz sentido, pois nós temos capacidade intelectual nas universidades comunitárias para atuar no plano de reconstrução. Queremos que o governo do estado faça um contrato guarda-chuva com o Comung e que a universidade de cada região assuma o planejamento de curto médio e longo prazo”, elenca.
O dirigente do Comung destacou que os reitores das Ices estão “conversando com os prefeitos” com vistas ao planejamento de ações de recuperação local, como é o caso da Associação dos Municípios do Vale do Taquari (Amvat). “Minha preocupação enquanto reitor, é que não percebo uma articulação entre as prefeituras, estado e governo federal. Todos estão trabalhando, sem dúvida, mas em ações muito parecidas, sobretudo no projeto de reconstrução das regiões. Algumas cidades como Cruzeiro do Sul foram devastadas, as pessoas não têm para onde voltar”, alertou. De acordo com Henn não haverá demissões no segmento comunitário.
Foto: Igor Sperotto
“Quando se olha para esse cenário de devastação do RS, a gente se dá conta que está na hora de buscar saídas coletivas para as crises que a gente vive”, ressaltou o dirigente da União Estadual dos Estudantes (UEE), Alejandro Guerrero. A crise climática, alertou, chega num estágio muito preocupante no estado.
“Não é de hoje que as universidades, inclusive as comunitárias, vêm falando das mudanças climáticas. Em muitos momentos, os governos estadual e municipais viraram as costas para a ciência, a gente tem desde a pandemia, um grande apagão na ciência que a gente produz aqui no RS”, constata.
Guerrero lembrou que o movimento estudantil está reivindicando soluções para um problema orçamentário para dar conta do momento de reconstrução, mas na verdade, essa reivindicação já existia antes da calamidade.
“A gente já estava aqui, lutando para que o 0,5% pudesse ser aprovado”, disse, referindo-se ao dispositivo constitucional que destina 0,5% da receita líquida de impostos próprios de universidades comunitárias para vagas a estudantes carentes e à qualificação de professores.
O professor e consultor Günther Gehlen apresentou uma análise sobre os efeitos da tragédia ambiental no mundo educacional e ponderou sobre a urgência das ações imediatas de amparo a quem foi diretamente atingido. Também elencou a necessidade de apoio aos alunos, a começar pelo transporte escolar e acolhimento às escolas que foram devastadas.
Confira o texto aprovado no Fórum das Comunitárias
Avaliações, Resoluções e Proposições do Fórum das Comunitárias para as ICES, o Comung e o poder público sobre as inundações no RS e seus reflexos na educação e na sociedade gaúcha.
Os professores, os estudantes e os funcionários técnicos e administrativos das Instituições Comunitárias de Educação Superior (ICES) participantes da 15ª reunião do Fórum das Comunitárias, no dia 8 de junho de 2024, avaliaram o cenário criado pelas inundações no RS no mês de maio, consideraram e propuseram conforme segue:
– O episódio recorrente de inundações no Estado no último período é expressão das mudanças climáticas em curso, conforme reiteradamente alertado pela ampla maioria dos cientistas e das Conferências promovidas pela Organização das Nações Unidas (ONU) e suas agências nas últimas décadas.
– A gravidade e os impactos terríveis destes acontecimentos na economia e na sociedade gaúcha e brasileira são expressão também da condução do poder público através do afrouxamento da legislação ambiental, do desmonte das estruturas de fiscalização das atividades econômicas e da ocupação inadequada do solo urbano e rural.
– Ante ao cenário criado pelas inundações, decidiram os participantes do Fórum, somar esforços junto ao Estado, aos agentes públicos e entidades da sociedade civil na luta pela reversão das flexibilizações da legislação ambiental.
Para as ICES e o Comung
– Manifestam seu reconhecimento pela pronta ação assistencial das ICES no acolhimento de famílias desabrigadas, no apoio logístico às ações do poder público no provimento das necessidades básicas dos atingidos nas regiões impactadas pelas inundações.
– Reivindicam que as ICES, além de sua atuação local nas respectivas cidades e regiões de inserção, atuem de forma integrada e consorciada com vistas à elaboração de propostas e projetos voltados para a superação da crise, para a reconstrução das estruturas econômicas e reativação das atividades socioculturais.
– Propõem que as ICES criem imediatamente coletivos temáticos interinstitucionais, integrados por seus quadros acadêmicos, com vistas a elaboração de propostas e projetos que tenham foco na questão ambiental, na crise gerada pelas inundações e na reconstrução do Estado.
– Estimulam as ICES para que, de maneira objetiva, ofereçam ao poder público para a locação as suas estruturas físicas ociosas para o funcionamento de escolas e de outros serviços públicos que tenham sido inviabilizados em seu funcionamento regular em decorrência das fortes chuvas e inundações.
– Defendem que as ICES definam e ampliem os núcleos de estudo e pesquisa no âmbito de seus programas de pós-graduação, preferencialmente de forma interinstitucional, focados na temática das mudanças climáticas, legislação ambiental e projetos de prevenção aos eventos climáticos extremos.
– Reiteram a expectativa de permanente diálogo das gestões das ICES com todos os segmentos que compõem as suas comunidades acadêmicas.
Perante o Poder Público
– Reivindicam do poder público da União, do Estado e dos municípios atingidos que prestigiem as ICES, através de suas estruturas físicas instaladas e dos seus recursos humanos contratados, para a prestação de serviços, consultorias e projetos com vistas à recuperação econômica e social do RS.
– Defendem junto ao poder público estadual e federal a implementação e consolidação de políticas de financiamento estudantil com vistas à garantia da continuidade da formação dos estudantes, atingidos direta e indiretamente pelos efeitos das inundações, nas universidades comunitárias do Estado.
– Propugnam a destinação anual de 0,5% da receita de impostos do estado do RS, conforme previsto na Constituição Estadual, e a ampliação para 1% para bolsas de estudo nas ICES durante o período de suspensão do pagamento da dívida do estado à União nos próximos três anos.
– Reivindicam à União a ampliação de políticas de acesso e permanência dos estudantes de graduação das ICES priorizando os atingidos pelas inundações com a destinação de R$ 1.000,00 por estudante até o final de 2024.
– Defendem junto ao poder público a garantia de transporte e comunicação dos estudantes de modo a evitar a evasão e a frustração dos projetos de formação profissional dos acadêmicos.
Porto Alegre, junho de 2024