EDUCAÇÃO

Pós-graduação avança e perfil dos formados muda em 25 anos

Brasil vem formando mais mestres e doutores, cursos estão melhor distribuídos entre as regiões e há mais mulheres pós-graduadas, mas houve queda na titulação e nos investimentos
Por Elstor Hanzen / Publicado em 6 de junho de 2024
Pós-graduação avança e perfil dos formados muda em 25 anos

Foto: Tânia Rêgo/Agência Brasil

Aula inaugural do programa de pós-graduação do Instituto de Psicologia da UFRJ, no campus Praia Vermelha, zona sul do Rio, em 2023, com a ministra da Igualdade Racial, Anielle Franco

Foto: Tânia Rêgo/Agência Brasil

Um retrato da pós-graduação no Brasil foi produzido pelo Centro de Gestão e Estudos Estratégicos (CGEE), organização social supervisionada pelo Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI), e divulgado neste mês em Brasília. O estudo traz informações sobre a formação, distribuição geográfica, sexo e o emprego dos mais de 1 milhão de mestres e 319 mil doutores que se titularam entre os anos de 1996 e 2021.

Entre os pontos negativos, por exemplo, estão a queda na formação de mestre e doutores a partir de 2019 e baixo índice de formados por 100 mil habitantes, redução de investimentos e desvalorização da pós-graduação.

O presidente do Conselho de Administração do CGEE e professor da Universidade Federal de Pelotas (UFPel), Odir Dellagostin, ressalta que o Brasil deve continuar investindo fortemente na formação de recursos humanos qualificados em nível de pós-graduação.

“A pesquisa científica ocorre essencialmente na pós-graduação”, pontua o especialista, que também é membro da Academia Brasileira de Ciências, presidente da Fundação de Amparo à Pesquisa do Rio Grande do Sul (Fapergs) e do Conselho Nacional das Fundações Estaduais de Amparo à Pesquisa (Confap).

Para Dellagostin, os avanços conquistados, com muito esforço, nesses últimos 25 anos, estão sendo ameaçados com a queda na procura pela pós-graduação, reflexo da desvalorização da ciência por alguns governantes, do valor das bolsas, do subfinanciamento das pesquisas e da falta de perspectiva para os mestres e doutores titulados atualmente. “Infelizmente, a Ciência ainda não voltou”, analisa.

Apesar da expansão do número de títulos de mestrado e de doutorado no período, o número de titulados no Brasil a cada ano parece ainda ser relativamente pequeno quando medido como uma proporção da população brasileira.

Em de 2013, o Brasil titulou 25,6 mestres para cada grupo de 100 mil brasileiros; em 2021, foi para 29,3. Em relação aos países com melhores desempenhos nesse indicador no ano de 2021, como Irlanda (607,6) e França (501,6), seus resultados foram respectivamente cerca de 21 e 17 vezes superiores ao brasileiro. De 2019 para 2020, o número de mestres formados caiu 10 mil no território nacional, por exemplo.

Segundo o presidente da Fapergs e do Confap, ainda há um baixo número de mestres e doutores por 100 mil habitantes no Brasil, quando comparado a países mais desenvolvidos.

“Porém, o desafio não é apenas aumentar o número, mas também oferecer oportunidades dignas para que os mestres e doutores formados possam atuar profissionalmente. Do contrário, estaremos titulando doutores que vão buscar melhores condições de trabalho em outros países, como está acontecendo atualmente”, adverte.

RS tem maior proporção de doutores

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Foto: Comunicação Social UFPel/ Divulgação

O RS é o estado com maior densidade de programas e maior relação de titulados por 100 mil habitantes: “além do número, a qualidade dos mestres e doutores também se destaca, apesar da menor média salarial”, diz Dellagostin

Foto: Comunicação Social UFPel/ Divulgação

Entre 1996 e 2021, os programas de mestrado e doutorado passaram de 608 para 4.691. O sucesso entre 2016 e 2021, contudo, foi menos intenso. Conforme o estudo do CGEE, houve desaceleração do processo de crescimento da pós-graduação brasileira nos cinco últimos anos da série analisada.

Ao mesmo tempo, a geografia da titulação ficou mais descentralizada. Em 1996, 67,4% dos títulos de mestrado e 88,9% dos títulos de doutorado foram concedidos na região Sudeste. Em 2021, tais participações tinham diminuído para, respectivamente, 43,5% e 52,5%.

O Rio Grande do Sul é o estado com a maior densidade de programas de pós-graduação e com a maior relação de doutores titulados por 100 mil habitantes.

O número de programas avaliados pela Capes como de excelência (nota 6 ou 7), também é bastante elevado, avalia o professor da UFPel. Segundo o levantamento, a região, entretanto, aparece com média salarial menor para aqueles professores com pós-graduação.

“Portanto, além do número, a qualidade dos mestres e doutores formados no RS também se destaca. O RS tem contribuído para a nucleação de pesquisadores em outros estados. A questão da menor remuneração merece uma análise mais aprofundada”, conclui Dellagostin.

E a presença feminina é majoritária na pós-graduação. A partir do ano de 1997, as mulheres passaram a ser maioria entre os titulados em cursos de mestrado no Brasil, aponta o estudo. A partir de 2003, elas também passaram a ser maioria entre os titulados em cursos de doutorado. A participação de mulheres no total de títulos de mestrado e de doutorado no ano de 2021 foram, respectivamente, 13,6 e 11,2 pontos percentuais maiores do que as participações de homens.

A contradição é que elas ainda recebem menos com a mesma qualificação. Em 2021, a remuneração média das mulheres com mestrado era de R$ 10.033,95 – 26,7% menor do que recebiam os homens com a mesma formação. No caso das doutoras, a remuneração média naquele ano era de R$ 14.782,68 – 16,4% abaixo do que ganhavam os doutores.

Setor público é maior empregador

O setor público continua sendo o que mais oferece oportunidade de emprego para mestres e doutores por muitos anos. O setor privado, tanto as empresas não educacionais quanto as instituições de ensino particulares, por sua vez, passou a ter uma tendência de aumento no emprego de mestres: 25% do total dos mestres estão em entidades privadas atualmente.

“Programas de estímulo à absorção de doutores pelo setor produtivo privado tem tido sucesso limitado. Muitos empresários se sentem intimidados pela presença de um doutor na empresa. Portanto, precisamos incentivar a criação de empresas por doutores”, afirma o presidente da Fapergs e do Confap.

Segundo Dellagostin, esse empresário, se bem-sucedido, certamente buscará contratar outras pessoas com o mesmo nível de formação para fortalecer a sua equipe. “No Rio Grande do Sul, a Fapergs criou o Programa Doutor Empreendedor, o qual já apoiou a criação de mais de 50 startups por doutores. Um programa que está tendo um grande sucesso. Iniciativas como essa precisam ser ampliadas e disseminadas”, ressalta o professor.

O estudo do CGEE, com mais de 330 tabelas, pode ser consultado com todos os detalhes no site.

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