EDUCAÇÃO

Educação para a mídia a passos lentos

Antes mesmo da internet, a educomunicação passou a integrar os currículos escolares no Canadá, mas na maioria dos países, inclusive no Brasil, ainda são iniciativas isoladas
Por Clarinha Glock / Publicado em 18 de dezembro de 2018

Foto: Acervo pessoal

Alunos da escola municipal de ensino fundamental Timbaúva, em Porto Alegre: aulas de educomunicação no contraturno.

Foto: Acervo pessoal

Uma mobilização de professores de Ontário, no Canadá, criou em 1978 a Associação para a Educação Midiática. Hoje, a educomunicação é obrigatória e faz parte dos currículos escolares daquele país. “Na época não havia internet, mas o grupo conseguiu se reunir e falar sobre suas paixões, se organizou e chamou a atenção dos administradores e do Ministério da Educação”, conta a professora Carolyn Wilson, da Faculdade de Educação da Western University, que esteve em São Paulo para o II Congresso Internacional de Comunicação e Educação, na ECA/USP, em novembro deste ano.

“Alguns fatos podem ter ajudado, como a preocupação com a violência na televisão e o avanço da cultura norte-americana no mercado canadense”, reflete. “O envolvimento de professores, pais e mães, o apoio das autoridades, o treinamento de profissionais nas faculdades de Educação e Comunicação, o desenvolvimento de estudos e pesquisas, a consultoria para escolas e a disponibilização de materiais relevantes para uso em sala de aula são fundamentais”.

Foto: Clara Glock

A italiana Gianna e a canadense Carolyn participaram do II Congresso Internacional de Comunicação e Educação, na ECA/USP, em novembro deste ano.

Foto: Clara Glock

EUROPA – Na Itália, onde as atividades de educação para mídia não são obrigatórias, as iniciativas existem graças ao esforço de professores. “A Comunidade Europeia recomenda a Alfabetização Midiática como um fator que leva à cidadania”, lembra Gianna Maria Cappello, e integrante da Associação Italiana para a Educação para a Mídia e a Comunicação, que há 27 anos realiza cursos de verão para treinar professores e profissionais. Existe tecnologia nas escolas, mas a habilidade de uso está ainda muito voltada para o mercado de trabalho.

O interesse pela utilização dos meios se tornou maior recentemente com o evento das fake news. “A educação para mídia desenvolve o pensamento crítico”, destaca. Gianna argumenta que a alfabetização midiática é apenas parte da solução do problema: “Precisamos fazer uma reforma dos meios. Se queremos a internet como espaço livre, temos que ter regulação e transparência, quebrar monopólios comerciais, controlar o uso de dados pessoais”. Sugere que as empresas digitais paguem taxas a serem reinvestidas em programas de educação para os meios. “Empresas como Google e Apple não são neutras, precisam se alinhar à regulação da mídia”, observa. Preocupa a Gianna a inserção destas empresas nas escolas da Itália, oferecendo treinamento a professores, expandindo suas marcas.

Já existe atualmente um movimento de formação de redes de defesa das audiências em vários países para avaliar o conteúdo dos meios veiculados, inclusive na América Latina, informou, durante o Congresso, Guillermo Orozco Gómez, membro da Associação Latino-Americana de Investigadores da Comunicação. “Este é o momento para trabalharmos unidos mais do que nunca, de fazermos um movimento latino-americano de alfabetização midiática entendendo suas contradições”, convoca.

Do conhecimento empírico à formação de professores

Nas aulas de vídeo do professor de História Jesualdo Freitas de Freitas, da escola municipal de ensino fundamental Timbaúva, em Porto Alegre, Rio Grande do Sul, os tripés para estabilizar a filmagem feita por ele e os estudantes são montados com canos de PVC e as rodas adaptadas de uma cadeira giratória servem para o movimento de câmera. “Todo mundo curte. Equipamento para nós é celular, não temos muitas possibilidades”, afirma. Ele é um dos professores que já exercia a educomunicação sem saber que tinha esse nome. Quando descobriu a Associação Brasileira de Pesquisadores e Profissionais em Educomunicação (APBEducom) em 2012, passou a ampliar as possibilidades de trabalhar as mídias em sala de aula.

A professora Rosane Rosa foi uma das pioneiras nessa área. Em 2008 deu início ao Programa de Ensino, Pesquisa e Extensão Educomunicação e Cidadani, na Universidade Federal de Santa Maria (UFSM). O encontro Educom Sul nasceu sob a iniciativa de seu grupo de pesquisa Comunicação, Educação e Cidadania, ligado ao Programa de Pós-graduação de Comunicação Midiática e ao Programa de Tecnologias Educacionais em Rede da universidade, com a proposta de ser itinerante para expandir a educomunicação no Rio Grande do Sul. A primeira edição foi na UFSM, a segunda na Unijuí, a terceira na PUC. O próximo Educom Sul será na UFRGS, em data a ser definida, reunindo profissionais e pesquisadores de Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul.

Foto: Arquivo pessoal

Alunos da Mostratec Júnior com a educomunicadora Evelin (a primeira da esquerda para a direita sentada)

Foto: Arquivo pessoal

“Estamos diante de uma sociedade que tem muitas informações e tecnologias, mas não sabe lidar com tantos recursos”, destaca Evelin Haslinger, mestre em Ciências da Comunicação e integrante do Núcleo da ABPEducom RS. Evelin é educomunicadora voluntária na Mostratec Júnior, projeto da Fundação Liberato, de Novo Hamburgo.

Leia a primeira matéria do II Congresso Internacional de Comunicação e Educação:
Os desafios do uso das mídias em sala de aula 

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