“A alienação pode ser vencida”
Arquivo pessoal/divulgação | Foto: Felipe Della Valle
O filósofo marxista Leandro Konder , professor da PUC do Rio de Janeiro, comentou o mais conhecido texto de Paul Lafargue para o jornalExtra Classe. Para Konder, se o título do panfleto famoso, em vez de ser O direito à preguiça fosse O direito ao lazer ou O direito ao ócio, corresponderia melhor ao conteúdo da obra. Mas como a intenção do autor era provocar e chamar a atenção para o que estava por trás da exaltação ao trabalho, “o título adotado é jornalisticamente genial”.
Conforme o professor, “é quase inevitável, ao lê-lo, sentirmos a força do apelo de sua participação no impulso revolucionário de 1871. Ele parece nos convocar para uma luta que reaparece hoje e nos chama para uma trincheira, imaginária ou real, mas sempre efetiva”. E questiona: “A alienação pode ser vencida? Em Lafargue, nos defrontamos com imagens otimistas que oscilam entre utopia e revolução”.
Konder aponta que a atual condição humana nos põe diante de contradições insolúveis. “Por um lado, o domínio das forças naturais é um pressuposto da libertação da humanidade. Por outro, na sociedade dividida, os próprios avanços da humanidade criam novas formas de opressão”. E defende que estamos a enfrentar uma contradição que nos frustra e nos oprime.
ORIGEM − A filósofa Marilena Chaui, também professora da Universidade de São Paulo (USP), é autora da famosa introdução da segunda edição do texto de Paul Lafargue pela Editora Unesp/Hucitec. Durante conferência na série O elogio à preguiça, realizada no Rio de Janeiro, em 2011, ela observou que a palavra trabalho não existia em grego ou em latim. E que a palavra latina que deu origem a trabalho é trapallium, um instrumento de tortura.
O latim labor, acrescenta, originou o inglês labor, que significa esforço penoso. “Não é significativo que muitas línguas modernas recuperem a maldição divina contra Eva usando a expressão trabalho de parto?”, indaga.
Durante sua palestra, ela não poupou inclusive seus colegas intelectuais, ao afirmar que muitos se dobraram à alienação do trabalho, e não têm mais controle sobre o que produzem. “Suas obras são mercadoria, não revelam a subjetividade de autor”. Cita os acadêmicos em especial, que se renderam à ideia de produtividade, de controle de qualidade e de ranking. “Isto é uma destruição da vida do pensamento”.
Segundo Chaui, hoje todas as ciências deixaram de ser um conhecimento que passa ao largo do capital e se tornaram uma força produtiva. “A subordinação do intelectual à lógica do capital se fará com a mesma ferocidade com que ela se fez sobre o proletariado”.