GERAL

Brasileiros compraram cinco armas por hora em 2019

De janeiro a novembro foram mais de 44 mil novos cadastros feitos por civis – as polícias e empresas de segurança não estão incluídas
Por Gilson Camargo / Publicado em 27 de dezembro de 2019
País trocou a campanha do desarmamento em 2014 (foto) pelo culto às armas e à violência sob Bolsonaro

Foto: Paulo Rios/Agência Alagoas/ Divulgação

País trocou a campanha do desarmamento em 2014 (foto) pelo culto às armas e à violência sob Bolsonaro

Foto: Paulo Rios/Agência Alagoas/ Divulgação

O percentual de assassinatos com o uso de armas de fogo no país atingiu, em 2017, o maior patamar já registrado nos últimos dez anos e responde por 72,4% dos homicídios no país. Divulgadas em junho, essas estatísticas não refletem nem de longe a realidade do país em 2019, ano em que o governo afrouxou as regras para aquisição de armas pela população civil. Os indicadores sobre a matança sob o governo Bolsonaro só serão conhecidos a partir de 2020, com a atualização do Atlas da Violência pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) e Fórum Brasileiro de Segurança Pública. De acordo com o mais recente levantamento a partir dos dados do Sistema de Informações de Mortalidade (SIM), do Ministério da Saúde, quase 50 mil pessoas eram mortas por ano por disparos de armas de fogo no país até 2018 – ano em que as armas de fogo responderam por 71% dos homicídios no Brasil.

Em 2019, por meio de decretos, o governo Bolsonaro revogou a lei 10.826/2003, conhecida como Estatuto do Desarmamento, e editou novas regras para facilitar o acesso da população civil às armas. Essa desregulamentação resultou em um aumento no número de registros de novas armas pela Polícia Federal. De janeiro a novembro de 2019 foram 44.181 novos cadastros, uma média de cinco novas armas em circulação a cada hora. Em todo o ano de 2018 foram 35.758 registros. Como as estatísticas de 2019 não contêm ainda os números de dezembro, a tendência é um aumento de 35% na comparação com o ano anterior. O levantamento da PF considera somente os registros de armas liberados para civis, sem considerar os pedidos feitos pelas polícias, empresas de segurança ou atiradores e colecionadores de armas.

Os estados com maior número de armas registradas são Minas Gerais, com 6.379, Rio Grande do Sul, com 5.228, e Santa Catarina, 4.749. No seu primeiro ano de governo, Bolsonaro já editou oito decretos que afrouxam as regras para acesso da população às armas, mas quatro desses foram derrubados pelo Congresso e pelo Ministério Público.

Em setembro, o governo sancionou sem vetos o projeto de lei Lei 3.715/19 aprovado em agosto pela Câmara, que amplia a posse de arma de fogo em propriedades rurais. Na fundamentação do projeto, o senador Marcos Rogério (DEM-RO) só precisou de duas páginas e poucos argumentos para vender sua proposta aos parlamentares: “não tem sentido deferir a posse ao morador da zona rural, mas não permitir que ele exerça seu legítimo direito de defesa fora da sede da fazenda”.

Os 117 fuzis na casa do amigo do vizinho do “Seu Jair”

Em março deste ano, a Divisão de Homicídios (DH) da Polícia Civil do Rio de Janeiro encontrou 117 fuzis incompletos, do tipo M-16, na casa de Alexandre Motta de Souza, amigo do miliciano Ronnie Lessa, no Méier, na Zona Norte do Rio. Maior apreensão desse tipo de arma na história do Rio, o episódio levantou ligações de milicianos com o tráfico internacional de armas. Na casa de Souza ainda foram encontradas 500 munições, três silenciadores e R$ 112 mil em dinheiro. Ele negou ser o proprietário das armas e acabou tendo a prisão preventiva revogada em junho pela juíza Alessandra Bilac, da 40ª Vara Criminal do Rio.

Vizinho do presidente Bolsonaro no residencial Vivendas da Barra, o amigo do traficante de armas, Ronnie Lessa, foi preso na operação como autor dos tiros que mataram a vereadora Marielle Franco e o motorista Anderson Gomes no dia 14 de março de 2018. Em novembro, Lessa foi citado em depoimento de um dos porteiros do condomínio Vivendas da Barra, que relatou à polícia civil a circulação de milicianos no residencial no dia dos assassinatos da vereadora e do motorista. Um dos acusados do crime, Élcio Queiroz, que dirigiu o carro usado no atentado, de acordo com o depoimento do porteiro, entrou no condomínio no dia 14 de março de 2018 dizendo que ia para a casa 58, que pertence ao presidente Jair Bolsonaro, na época deputado federal. Ao anunciar o visitante, foi autorizado a deixa-lo entrar por uma pessoa que se identificou na casa 58 como “Seu Jair”. Élcio, no entanto, dirigiu-se até a casa onde mora Ronnie Lessa. O porteiro foi submetido a novo interrogatório pela Polícia Federal por determinação do ministro da Justiça e da Segurança, Sergio Moro, e mudou o depoimento.

Em março, a polícia do Rio encontrou 117 fuzis M-16 na casa de um amigo do miliciano Ronnie Lessa, que executou Marielle Franco e Anderson Gomes

Foto: Polícia Civil/ Divulgação

Em março, a polícia do Rio encontrou 117 fuzis M-16 na casa de um amigo do miliciano Ronnie Lessa, que executou Marielle Franco e Anderson Gomes

Foto: Polícia Civil/ Divulgação

*Com agências.

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