GERAL

José Paulo Bisol morre aos 92 anos em Porto Alegre

Uma das personalidades mais relevantes da República por seu humanismo, desembargador aposentado foi senador Constituinte, secretário de Segurança no RS e concorreu à vice-presidência
Por Marcelo Menna Barreto / Publicado em 26 de junho de 2021
Ex-senador, ex-deputado estadual, desembargador e professor universitário aposentado, Bisol (foto de 2007) foi candidato a vice-presidente da República em 1994 e secretário de Segurança do RS

Foto: René Cabrales/ Arquivos Extra Classe

Ex-senador, ex-deputado estadual, desembargador e professor universitário aposentado, Bisol (foto de 2007) foi candidato a vice-presidente da República em 1994 e secretário de Segurança do RS

Foto: René Cabrales/ Arquivos Extra Classe

O desembargador aposentado e ex-senador José Paulo Bisol faleceu na manhã deste sábado, 26, por volta das 10h, no Hospital Moinhos de Ventos, em Porto Alegre, aos 92 anos de idade. Internado desde os últimos dias de maio, após um infarto do miocárdio, Bisol, que foi candidato à vice-presidência da República na chapa de Luiz Inácio Lula da Silva, em 1989, e secretário de Justiça e Segurança do Rio Grande do Sul, no governo Olívio Dutra (1999-2002), morreu, segundo nota do hospital, por falência múltipla de órgãos.

Apesar de ter enfrentado nos leitos do Moinhos de Vento uma pneumonia, com derrame de pleura que exigiram intubação, ele não teve covid-19, esclarece o boletim. De acordo com Isabel Freitas, ex-chefe de gabinete da Secretaria de Justiça e Segurança Pública gaúcha, que se tornou além de admiradora amiga íntima da família Bisol, a saúde do ex-parlamentar estava muito fragilizada. Em 2007 perdeu um rim devido a um câncer e desde então fazia hemodiálise. Nos últimos anos, vivia em Osório: “vamos precisar de um século para nos recuperar desse golpe”, previu em entrevista ao Extra Classe em 2016.

Um Lutador humanista

Segundo amigos e familiares, o ex-senador chegou a reagir, demonstrando o que sempre dizia, “ter um grande amor à vida”. Isabel relatou que Bisol saiu da Unidade de Tratamento Intensivo para o quarto, mas precisou voltar a ser intubado novamente após sofrer um novo enfarto logo após os médicos lhe retirar da primeira intubação.

A ex-chefe de gabinete fala da determinação dele. “O Bisol aprendeu alemão para poder ler Goethe no original. Ele ficou muito triste quando começou a perder a visão e ficar mais restrito, uma coisa típica de um humanista que gostava de ler e ouvir os passarinhos”, diz Isabel. Ela  destaca que ao se retirar da vida pública, Bisol tinha colocado como meta ler “todos os sociólogos e cientistas sociais do mundo”.

Líder sereno

Coordenador de Comunicação do então secretário de Justiça e Segurança do Rio Grande do Sul, o jornalista José Lima, lembra que Bisol “enfrentava com serenidade e coragem o ataque sistemático da mídia ao radical projeto que comandava de construir uma nova segurança pública como serviço e não como poder”.

Lima, acompanhou Bisol durante seus quatro anos à frente da secretaria e declara ainda que ele “sempre foi um homem muito à frente do seu tempo. O que ele pregava e implementava no histórico governo Olívio Dutra serviu de semente para todas as políticas de governo de segurança pública democráticas e antiautoritárias dali em diante”.

O jornalista faz questão de destacar emocionado: “Era um líder sereno e que apoiava sua equipe com vigor. O mundo perde, mas suas sementes germinarão. E lutaremos por elas”, enfatiza.

História

Eleito senador em 1987, foi um dos protagonistas na Constituinte

Foto: Agência Senado/ Arquivo

Eleito senador em 1987, foi um dos protagonistas na Constituinte

Foto: Agência Senado/ Arquivo

Formado em direito pela Pontifícia Universidade do Rio Grande do Sul (PUCRS) em 1954, Bisol ingressou na magistratura gaúcha em 1956.

Sua carreira política iniciou em 1982 no antigo MDB. Foi eleito deputado estadual. Em 1987, eleito Senador, foi um dos protagonistas da Assembleia Nacional Constituinte. Bisol relatou as Comissões de Soberania e dos Direitos e Garantias do Homem e da Mulher, além de compor a Comissão de Sistematização.

Filiado ao PSB, em 1989 foi candidato a vice de Lula. Durante a Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) que culminou com o processo de impeachment do presidente Fernando Collor de Melo em 1992, Bisol também teve papel de destaque.

Com a eleição de Olívio Dutra para governador do Rio Grande do Sul em 1998, ele assumiu a Secretaria de Justiça do Rio Grande do Sul. Em junho de 2000 filiou-se ao PT. Nesse período, sofreu uma perseguição implacável da oposição ao PT no estado e dos meios de comunicação mais influentes, o que culminou com uma CPI na Assembleia Legislativa, da qual foi inocentado e venceu inúmeros processos contra veículos de comunicação.

Ao entrevistar Bisol para o Extra Classe em 2007, o jornalista José Antônio Silva revela que o ex-secretário de segurança do RS ficou com problemas de saúde após “duríssima guerra de desgaste imposta pela oposição ao Governo estadual petista (1999-2002) e turbinada pelos veículos mais influentes da mídia gaúcha, que culminou com uma polêmica CPI da Segurança Pública na Assembléia Legislativa.

Bisol, que era um comunicador, ex-cronista de rádio e TV, escritor e poeta, já havia sofrido perseguição da mídia em 1994, que veiculou uma série de acusações falsas na tentativa de implodir sua candidatura a vice de Lula da Silva na campanha presidencial de então. “Os canhões da grande imprensa conseguiram derrubar o alvo, mas seguem pagando o preço pela injustiça, tanto em dinheiro quanto na falta de credibilidade”, relembra. Bisol moveu inúmeros processos contra o Jornal do Brasil, Zero Hora, RBSTV, O Globo, O Estado de S. Paulo, Correio Brasiliense e revista IstoÉ e ganhou todos.

Bisol deixa a Esposa Vera Zanette, do segundo casamento e três filhos com a primeira esposa, Iolanda Bisol, já falecida, e nove netos e um bisneto.

Lula e Olívio se manifestam

Bisol concorreu duas vezes à vice-presidente junto com Lula, tendo que renunciar na campanha de 1994

Foto: Reprodução

Bisol concorreu duas vezes à vice-presidente junto com Lula, tendo que renunciar na campanha de 1994

Foto: Reprodução

Em nota oficial de pesar, o ex-presidente Lula registrou: “José Paulo Bisol foi um grande amigo e companheiro. Foi deputado estadual, advogado, professor, desembargador, escritor, senador na Constituinte, e secretário de segurança do Rio Grande do Sul, sempre atuando como defensor dos direitos humanos, da democracia, e um homem público ético. Um brasileiro que não poderá jamais ser esquecido”.

Lula lembrou que foram “companheiros de chapa, eu no PT, ele no PSB de Miguel Arraes, em 1989”. “A campanha de 1989 foi a primeira da Nova República e de uma geração de brasileiros que podiam finalmente escolher seu presidente, e foi certamente a mais emocionante da minha vida. E Bisol foi o melhor companheiro que eu poderia ter naquela jornada”, reconhece.

Secretário de Segurança no governo de Olívio Dutra (1999-2002) Bisol foi alvo de uma CPI, na qual foi inocentado

Foto: Arquivo Pessoal

Secretário de Segurança no governo de Olívio Dutra (1999-2002) Bisol foi alvo de uma CPI, na qual foi inocentado

Foto: Arquivo Pessoal

Para o ex-presidente, “Bisol amou nosso país, pensou e lutou por um Brasil melhor. Minha solidariedade e meus sentimentos aos familiares, filhos, netos e bisnetos, amigos e admiradores de José Paulo Bisol”.

O ex-governador Olívio Dutra destacou que o desembargador José Paulo Bisol foi “um humanista militante a vida inteira, seja como juiz, desembargador, professor, mestre, poeta, jornalista, parlamentar, Secretário de Segurança do RS no governo da Frente Popular, um cidadão inquieto, instigante na busca incessante pela Justiça e pela Verdade. Sua ausência nesta dimensão da vida terrena, no momento de obscurantismo e desconstituição da Política que enfrentamos fará enorme falta. Bisol vive!”.

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